quarta-feira, 24 de setembro de 2025

Administradores resolutos e astutos - Manuel João Pereira Correia, mccj

 Administradores resolutos e astutos

Ano C – Tempo Comum – 25.º Domingo
Lucas 16,1-13: “Fazei amigos com a riqueza injusta”

As leituras deste domingo podem parecer de difícil compreensão. Na primeira leitura, Amós, o profeta pastor e camponês do século VIII, toma a defesa do indigente e ameaça com a vingança de Deus contra aqueles que “espezinham o pobre” (Am 8,4-7). Um aviso mais do que atual. Mas, no Evangelho, Jesus conta uma parábola em que parece louvar um administrador desonesto. Trata-se de uma das parábolas mais discutidas do Evangelho. Na realidade, o que se quer pôr em relevo é a prontidão e a astúcia deste administrador. São estas qualidades que Jesus propõe aos “filhos da luz”. Por isso a parábola é também chamada do “administrador sagaz”.

Administradores, não proprietários!

Deixaremos de lado os aspetos exegéticos mais problemáticos para nos concentrarmos na mensagem principal. A palavra-chave é administrador. Os termos administrador / administração / administrar (em grego oikonomos, oikonomia, oikonomeō) aparecem 7 vezes no nosso texto. Não se trata de uma terminologia comum no NT. Contudo, embora apareça poucas vezes, o conceito de “ser administrador” (oikonomos) daquilo que Deus nos confiou é um tema recorrente e fundamental na teologia neotestamentária.

São Paulo diz-nos: “Que cada um nos considere como servos de Cristo e administradores dos mistérios de Deus” (1 Cor 4,1); e São Pedro: “Cada um, segundo o dom que recebeu, ponha-o ao serviço dos outros, como bons administradores da multiforme graça de Deus” (1 Pe 4,10). Não pensemos apenas nos dons espirituais, mas também nos dons naturais e nos bens materiais.

Aqui chegamos ao primeiro ponto da nossa reflexão: nós somos simples administradores, não proprietários. Isto é, devemos ocupar-nos das coisas, dos bens, do dinheiro, como gestores. Também os bens são talentos que nos foram confiados. Não são nossos e não podemos retê-los. É preciso fazê-los circular e frutificar com resolução e sagacidade! Não para proveito próprio, mas ao serviço dos outros e do Reino.

Hoje já não existe nenhum valor tão universal como o dinheiro. A maior parte do nosso tempo é gasta a ganhar a vida. Mas mesmo o dinheiro que ganhámos com o suor do nosso rosto não é nosso, para usar a nosso bel-prazer. Aliás, sabemos que o sistema monetário atual é injusto e iníquo. Não nos podemos autoabsolver dizendo que nada podemos fazer. É preciso administrá-lo com sabedoria e tendo em conta o que diz Paulo VI na Populorum Progressio: “A propriedade privada não constitui para ninguém um direito incondicional e absoluto. Ninguém está autorizado a reservar para seu uso exclusivo aquilo que excede a sua necessidade, quando outros carecem do necessário” (n.º 23).

Os pobres, porteiros do Paraíso!

A Palavra deste domingo fala-nos também da amizade. Das relações humanas corrompidas pela avidez e pela injustiça, denunciadas pelo profeta Amós. Das relações de fraternidade com todos os homens, que garantam a paz e a justiça, como diz São Paulo na segunda leitura: “para que possamos levar uma vida calma e tranquila, digna e dedicada a Deus” (1 Tm 2,1-8). Mas é sobretudo Jesus, no Evangelho de hoje, que faz uma proposta inesperada: “Fazei amigos com a riqueza injusta, para que, quando ela faltar, eles vos recebam nas moradas eternas”.

Mas então, serão os pobres os porteiros do Paraíso? Ao que parece, sim. Segundo Mt 25,11-12, Jesus será o Juiz que decidirá quem poderá entrar no Reino dos Céus: “Senhor, Senhor, abre-nos!”. Mas Ele respondeu: “Em verdade vos digo: não vos conheço”. E de modo semelhante em Mt 7,22-23: “Nesse dia muitos me dirão: ‘Senhor, Senhor, não profetizámos nós em teu nome? E em teu nome não expulsámos demónios? E em teu nome não realizámos muitos prodígios?’”. Mas então eu lhes declararei: “Nunca vos conheci. Afastai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade!”.

Aqui, em Lc 16,9, porém, soa de forma um pouco diferente. Eis como um catequista de Moçambique explicava aos seus catecúmenos, segundo o relato de um colega missionário:

Quando chegarmos às portas do Paraíso e batermos para poder entrar – sim, porque o Paraíso tem portas, não entra lá qualquer um! – aparece São Pedro, a quem Jesus delegou as chaves do Reino dos Céus, e perguntará: – “Quem és tu?” – “Sou fulano de tal”. Mas como fará Pedro para conhecer toda a gente?! Muito simples: Pedro gritará lá para dentro e perguntará: – “Eh, amigos, há aí alguém que conheça este fulano de tal que pede para entrar?”. Então alguém dirá (assim se espera!): – “Sim, eu conheço-o, deu-me muitas vezes de comer”. E outro: – “Eu também o conheço, visitou-me tantas vezes quando estava doente”. E ainda outro: – “Deu-me roupa para me vestir”. Então Pedro abrirá a porta: – “Entra, amigo, és dos nossos!”.

Mas se lá de dentro abanam a cabeça, dizendo que não o conhecem, então sim é que serão sarilhos sérios!

Parece, portanto, que os pobres são o júri de São Pedro. Eis porque Jesus recomenda: “Fazei amigos com a riqueza injusta, para que, quando ela faltar, eles vos recebam nas moradas eternas”. Por isso não hesita em dar-nos o “administrador desonesto” como exemplo de astúcia!

Dir-se-ia quase que, para entrar no Paraíso, são precisas recomendações! Mas não a São Pedro, e sim aos pobres, e aqui na terra, antes que seja demasiado tarde!

Manuel João Pereira Correia, mccj


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