sábado, 8 de setembro de 2018

Uganda, a missão dos Missionários Combonianos no maior campo de refugiados do mundo


Uganda, a missão dos Missionários Combonianos no maior campo de refugiados do mundo



Bidi Bidi acolhe internamente um milhão de refugiados. A experiência do Padre Pasolini cinquenta anos que, há cinquenta anos, atua no país africano









PUBLICADO em 02/09/2018

LUCA ATTANASIO

ARUA



Com cerca de 1,5 milhão de refugiados acolhidos dentro do país, a Uganda conquistou em 2017 o segundo lugar – empatada com o Paquistão – no ranking dos países com maior número de refugiados. Na frente deles, apenas a Turquia (3,5 milhões). De 01 de janeiro de 2018 até à data, nos mesmos meses em que na Itália se temiam invasões fantasmas (8.100 chegadas, 81% menos que no mesmo período de 2017) e que se faziam preparativos para defender a União toda Europeia de improváveis devastações (ao todo, incluindo a Itália, 62 mil migrantes atingiram o território continental, dos quais 16 mil na Grécia e 28 mil na Espanha), centenas de milhares de pessoas desesperadas, em grande parte fugindo do Sudão do Sul, do Congo e do Burundi, atravessaram as fronteiras da Uganda. Superado um período de guerra longo e violentíssimo, este país da África centro-ocidental, com cerca de 45 milhões de habitantes, vive uma fase de relativa estabilidade e destaca-se entre os Estados mais dispostos a acolher. No extremo noroeste do país, no distrito de Yumbe, está localizado o campo de refugiados de Bidi Bidi, o maior assentamento deste tipo no mundo: 282.000 pessoas deslocadas estão acomodadas em abrigos improvisados ​​numa área de 230 quilômetros quadrados.



Como podem tantas pessoas viver assim? Quais são as necessidades e as esperanças? Foi o que perguntámos ao padre Tonino Pasolini, missionário comboniano da diocese de Arua (região onde fica o campo), diretor da emissora Radio Pacis, que desde há muitos anos visita e conhece  Bidi Bidi.

"A minha diocese é a que mais acolheu refugiados no mundo: em dois anos e meio, chegaram mais de um milhão; e a população, que até 2014 era de 1,4 milhão de habitantes, quase duplicou. Dentro do nosso território fica Bidi Bidi, que parece uma cidade. No início, o Unhcr*, que não esperava êxodos tão maciços, destinava cinquenta metros quadrados a cada família. Mais tarde, quando foram atingidos picos de entradas de 6/7 mil pessoas por mês, os espaços familiares foram reduzidos e o campo expandiu-se de forma exponencial".



Padre, o senhor visita regularmente este campo, quais são as condições da vida?

"Felizmente, o Unhcr está fazendo um bom trabalho e a situação no campo é bem gerida. Claro que as necessidades são imensas. A mais imperiosa é a água porque estamos numa zona seca e por isso é preciso transportá-la em caminhões-tanque depois de retirá-la do Nilo. Mas a distribuição, para cerca de 300 mil pessoas, não é certamente simples. Cerca de 82%  da população dos acampamentos é constituída por mulheres e crianças e, naturalmente, a escolarização é um dos maiores problemas a enfrentar. O campo existe desde há dois anos e meio; no começo não havia qualquer possibilidade de atender as crianças. Nos últimos tempos surgiram as primeiras escolas dentro do campo, então esperamos que de agora em diante as coisas melhorem. De qualquer forma, todos querem voltar para casa. Estão exaustos devido aos anos de guerra e  de fome que os forçaram a se mudar de um lugar para outro, mesmo tendo uma casa".



Como reagiu a população autóctone a esta chegada impressionante de refugiados?

"Os ugandeses estão mostrando uma grande capacidade de acolhimento. A Uganda pode realmente andar de cabeça erguida, e eu, que estou há mais de cinquenta anos neste país e me sinto ugandês, estou orgulhoso dos meus concidadãos. Provavelmente todos aqui se lembram dos terríveis anos de guerra durante os quais eram os ugandeses que fugiam e pediam asilo no Sudão ou no Congo; e por isso sabem o que significa sentir-se ou não sentir-se acolhidos. De qualquer modo, deixe-me dizer uma coisa: vejo tanta agitação na Itália e na Europa por causa de alguns milhares de pessoas que pedem asilo e acho que se deveria tomar como exemplo a Uganda, um país que, com todos os seus problemas, consegue ser aberto e hospitaleiro".



Como vocês respondem às necessidades sociais e pastorais dos refugiados?

"A esmagadora maioria dos refugiados Bidi Bidi é sul-sudanesa, portanto cristãos. Mas para nós religiosos, sacerdotes, é muito difícil chegar ao campo, que fica numa área remota e bastante isolada. O Bispo de Arua, Sabino Ocan Odoki, é muito sensível aos problemas dos refugiados e todos nós, incluindo um punhado de missionários que estavam no Sudão do Sul e agora se instalaram na diocese, tentamos fazer o possível para visitar o campo. Consegue-se celebrar a Missa menos de uma vez por mês. O mais positivo é que os fiéis estão se organizando e nomearam uma série de catequistas que atuam como coordenadores pastorais nos campos. Mas nós fazemos outro tipo de trabalho pastoral que é igualmente eficaz...".



Qual?

"Eu dirijo três estações de rádio, chamadas Radio Pacis, que atingem 10 milhões de pessoas no norte da Uganda e chegam até ao Congo e ao Sudão do Sul (onde são falados dialetos comuns ou similares), e que são muito escutadas dentro dos campos. Fazemos transmissões em que participam representantes dos refugiados, da agência, ligada ao gabinete do primeiro ministro, encarregada da situação nos campos, do Unhcr e da Caritas ou World Vision**. Falamos de problemas reais como água, saúde, sementes para cultivo e damos voz às necessidades primárias procurando promover um clima de harmonia e diálogo construtivo. Transmitimos, a cada três horas, programas que falam exclusivamente dos campos de refugiados e das pessoas que lá vivem. Desta forma ajudamos, por um lado os refugiados que podem falar dos seus problemas, por outro os cidadãos ugandeses para que compreendam o sofrimento dos refugiados e sintam empatia. Agora estou procurando patrocinadores para lançar uma quarta estação, localizada a 5 km do Sudão do Sul, que se ocupe especialmente com a questão dos refugiados e que, graças a uma penetração de cerca de 400 km dentro do Sudão do Sul, funcione como um meio de comunicação entre os sul-sudaneses de ambos os lados da fronteira. Não é necessário muito dinheiro, mas o resultado seria muito importante porque pode favorecer a reconciliação, pode fazer ouvir ao mundo a voz dos refugiados. Para nós, a rádio é um verdadeiro instrumento de paz".



* United Nations High Commissioner for Refugees. Em português, ACNUR - Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados.

**A World Vision (Visão Mundial) é uma organização não governamental internacional de ajuda humanitária, baseada em princípios do cristianismo e fundada em 1950, na Califórnia.







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