sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Ecos da Guiné: Por mares e ares dantes “navoados” IIº

Crónica de saudade da Guiné
Como disse no texto já publicado, a 2ª viagem da UASP à Guiné decorreu de 18 a 25 de Março de 2016.
No dia 23 regressámos de Orango. Procurámos em Quinhamel o “restaurante do Português”. Lá nos apareceu no meio do arvoredo, mas comida é que não tinha pois nos disse que não tinha sido avisado. O monte de cascas das saudosas ostras no logradouro acrescentou mais sofrimento à fome.
Rumámos 30 kms para Bissau, onde fomos recebidos com alegria no Papa Loca da Casa do Benfica. Às 15 h serviram-nos pratos bem recheados, embora eu estivesse limitado pelas aftas.
Fomos visitar o hospital da Cumura, muito falado no tempo da minha “guerra” de 1971-73 como hospital dos leprosos. Tem vários pavilhões bem cuidados, muito terreno e jardins. É administrado há dezenas de anos por dedicados e sorridentes Padres Italianos. Tem poucos leprosos, mas acolhe agora cerca de 40 doentes com Sida. É um oásis nas terras da Guiné.
Outro oásis é a Casa Bambaran, onde duas freiras acolhem cerca de 45 órfãos, de alguns meses até cerca dos 14 anos, que aqui têm comida, cama, chuveiros, lavatórios e onde aprendem muita coisa. Também aqui foi entregue uma pesada mala com materiais e alguns deixaram discretamente notas de francos.
Jantámos no edifício que acolhera alunos da Universidade Católica, onde íamos dormir em quartos bem simples e a ventoinha funcionava.
Alguns saímos até às 23 h pela Avenida do Aeroporto parando num bar à conversa com Portugueses que ali conviviam com um Ministro da Guiné.
No dia 25 não fui a Canchungo nem a Cacheu, pois “desenfiei-me” para passear sozinho por Bissau e ir à Base Aérea. Um Sr. Padre da Cúria foi muito simpático e levou-me à Base Aérea, de onde me recambiaram para o Quartel-General a fim de obter licença para entrar na Base. Nestes poucos quilómetros por duas vezes a polícia nos mandou parar: da 1ª vez logo disseram ao Sr Padre que podia seguir; na 2ª vez a menina foi “compensada” apesar de nos desejar “Boa Páscoa”.
Como o QG nos remeteu para o Ministro da Defesa, eu agradeci ao Padre a sua disponibilidade e comecei o reconhecimento sozinho a pé por Bissau. Que tristeza de vistas ! Quase não reconhecia a zona deserta do café Bento e arredores. Muita falta de tinta nas casas “europeias”, que pareciam meio-abandonadas. O dono de um café disse-me que, por ali, parte do alcatrão resistente ainda era do tempo dos Portugueses!
Uma dor de alma subir a Avenida principal e os seus passeios pois faltava algum alcatrão, havia pó e tudo pouco cuidado.
A catedral e o tribunal lá estavam na mesma e em bom estado. Os correios vão ter um bom edifício novo. Lá estava a casa Gouveia. A UDIB mantém-se mas precisa de avivar as cores. A Associação Comercial está bonita e é a sede do PAIG, com salas para as pessoas frequentarem.
A Praça do Império continua grande e chama-se agora dos Heróis, bem ajardinada.
O Palácio do Governo, que é agora da Presidência da República, mantém a mesma fachada imponente, está bonito depois de ter sido muito bombardeado em 1998 e de ter sido recuperado pelos Chineses. Só é pena que as ruas à sua volta estejam cortadas ao trânsito de peões e veículos e nelas estejam carros blindados com militares do centro da África a guardar um Presidente, que deixou o PAIG e que não é amado pelas pessoas com quem falei. E que quer impor no governo pessoas que o maioritário PAIG não aprova ou vice-versa.
O café Império lá continua com a sua esplanada e com muita gente, pois será a casa melhor arranjada de Bissau.
A caminho da messe de Oficiais da Força Aérea entrei pelos jardins da sede da Ordem dos Advogados de Bissau, tendo o Bastonário mostrado as várias salas, quase despidas, lamentando a falta de livros nomeadamente sobre o Código Civil e o Código de Processo Civil, que me disse seguirem ainda os de Portugal da década de sessenta.
Por outra rua persegui a visita à messe. Acabava de filmar vários urubus quando dois soldados me disseram que não podia filmar ali nem prosseguir porque a messe era agora ocupada pelos tais soldados estrangeiros.
Continuei pelas ruas largas de Bissau que estão agora a receber alcatrão. Nos passeios tive de ir baixando os olhos para os buracos fundos que vão receber postes e caixas.
Onde almoçar? Foi mais certo voltar à casa do Benfica, que tem ar condicionado e os pratos são servidos à portuguesa e bem compostos. Ah: o salão da casa do Benfica, das saudosas danças, terá pouco uso.
A Embaixada de Portugal tem vários edifícios e muito movimento de pessoas, mas disseram-me que o meu pouco tempo já não dava para conseguir uma entrada na Base.
Então atirei-me para o Q G do meu tempo subindo a estrada de St Luzia. Quis ir a pé para reconhecer aquele percurso, o que se tornou numa pesada penitência de Quinta-feira Santa numa tarde de muito calor e de algum pó. A final o QG ficava muito longe. Quando cheguei ao Ministério da Defesa eram 16,30 h e o Ministro já tinha saído.
Deambulei à procura do QG do meu tempo com os seus jardins a subir, mas no sítio aonde cheguei, que era mais alto do que a paisagem, só encontrei uns aquartelamentos dispersos, que pouco me trouxeram à memória.
Regressei ao centro e quis ir reconhecer o ” Pilão”. Vi muitas ruas, algum alcatrão, muito trânsito, valas para saneamento a céu aberto. Também li placas com o nome ” Cupelom” . Mas, também aqui, entrei ao contrário, de poente para nascente e não reconheci o tão falado “Pilão”, agora com muitas mais casas. Pus-me à conversa com três simpáticas meninas. Como já lhes tinha dado uma nota, saboreei umas panquecas feitas ali na rua e na hora e um gelado artesanal que era divinal.
Conversei no quartel dos bombeiros de Bissau, que já ali existia no meu tempo.
Desci até ao cais do “Pidgiguiti”, que estava pobre, com lodo e barcos velhos. ” Não filme aquele barco”. Por quê ? ” É militar”.
Foi uma dor d`alma ver o abandono daquelas antigas casas e o estado daquelas ruas. Lembrei a minha amiga Isilda Araújo, cujo casal recebia muitos Portugueses, especialmente os de Valongo.
Subi até à catedral onde se ensaiava para a Missa de Quinta-feira Santa espalhando-se os cânticos pelos altifalantes. Não tivemos o Bispo de Bissau, mas tivemos o nosso companheiro Pe. Artur a presidir às cerimónias numa catedral cheia. E que bem cantava e se mexia o alegre grupo coral!
Timóteo Moreira

domingo, 7 de agosto de 2016

Ecos da Guiné: Nossa Senhora de Fátima! Promessa cumprida .

“A campainha tocou. Era uma sineta, digna dos Jerónimos de Braga, dependurada dum ramo, pequena, é certo, mas suficiente para congregar os cristãos da aldeia, sobretudo jovens… Orago da capela? Nem imagem existia! Nenhuma! Foi decretado (sem decreto oficial, evidentemente): “Nossa Senhora de Fátima! Eu mesmo mando (ou trago) a imagem”! Promessa feita, espera-se que se cumpra em breve”. (… da crónica anterior).
E assim foi! Diligências em curso, oferta e embalagem apropriada, é de salientar a generosidade do sr. Manuel Dias Conceição, da Arte Sacris, Paramentaria de Fátima, que, à primeira abordagem, falou: “Eu ofereço a imagem”! Bem acondicionada, em “embalagem a tiracolo”, acompanhou-nos como bagagem de mão; nem o peso nem o volume foram óbice… a tripulação foi avisada do conteúdo. Na viatura, no barco, de braçado, às costas, rumou finalmente a Orango, a 4 horas de viagem de Bissau.
Ambuduco era o destino. Aquelas paragens inóspitas, mas belas, porque selvagens, entrecortadas de carreiros poeirentos e de canais infectos e perigosos, só de barco são atingíveis, mesmo assim com alguma dificuldade, sobretudo na maré baixa. Só de barco e mais algumas marchas cansativas por trilhos ziguezagueantes, mata fora. Não dava. Da primeira vez (a da promessa) eram dois barcos, um de menor dimensão que nos levou lá. Só que da segunda vez, menos passageiros, só foi o maior. Impossível ir a Ambuduco, com muita pena nossa. Só por outro trajecto, alguns minutos de barco e hora ou horas a pé por trilhos com um calor insuportável, já a rondar os 40 graus.
Encomendámos ao Catequista Adelino a entrega da imagem à comunidade, bem como os medicamentos, casualmente embalados na mala que há 42 anos me acompanhou na ida para a Guiné! Lá ficou. Coincidências!
Na bela estância de Orango, fizemos uma celebração mariana de bênção e entrega da imagem, devidamente registada em fotografias várias. Foi solene e comovente! Entrega feita!
“Adelino, com que sentimento e alegria recebemos a tua comunicação bem documentada fotograficamente, da bênção e entronização da imagem, feita pelo pároco, debaixo das árvores nossas conhecidas de Ambuduco.  Temos muito que te agradecer a fidelidade e o empenho que pões nesta missão tão bela de Catequista. Muito obrigado. Ao pároco e outros cristãos da comunidade o nosso sentimento de amizade e parceria. Que Nossa Senhora de Fátima vos proteja”!
AO (Alferes capelão) – IIº Grupo, Março 2016

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Ecos da Guiné: PAZ!… (no Céu, porque na terra… jazem) .

Descemos ao coração de Bissau: Império, antes, “Heróis nacionais” agora; com a colorida e bem engalanada sede do PAIGC em destaque, o Palácio do Presidente, em sua majestade, reconstruída depois da guerra civil, mas muito movimentada, ainda  com algum alcatrão… Penetrámos em plena baixa. Casas senhoriais ou de serviços, de traça colonial dos tempos idos, umas reconstruídas e algo cuidadas para os serviços oficiais de hoje. Outras em degradação crescente, a significar abandono e pouco uso, demolidor e desleixado, as ruas esbeltas outrora e bem traçadas, ainda a mostrar envergonhadamente antigas belezas, o alcatrão a dar lugar ao pó característico de cor ferrosa, chegámos ao Cais.
O Cais do Pijiguiti, com a estátua de Amílcar Cabral ao centro, o punho socialista muito estilizado, o edifício da Marinha, a Rádio Nacional, uns jardins mal cuidados, calcorreámos a marginal. Cercado por correntes, o monumento ao 3 de Agosto de 1959, a revolta do Pigiguiti, a ferro e fogo… que incendiou a febre de independência cuja guerra se orquestrou durante meia dúzia de anos… e veio a durar mais dez. Quanto sofrimento, quantas mortes de parte a parte, quantos ais, quantos suspiros, as saudades, tanto ódio,  tanta bomba, tanto carro de combate, tanto armamento… ali tudo desembarcava, soldados aos milhares, materiais de manutenção, armamento, ali embarcavam urnas às dezenas, às centenas, milhares sem dúvida, ali se chegava à incerteza duma comissão de dois anos, ali se pisava solo africano duma  quentura inaudita e humidade e paludismo e lica e febres… Mais tarde eram os aviões em Bissalanca… Para quê? Como está tudo hoje? Quem (se) aproveitou? Quem forçou? Quem (não) negociou? Em nome de quê uma tragédia assim? As reflexões vêm ao espírito em catadupa. Ao tempo era o medo, era o ambiente, era a incerteza, era o desconhecido, era o aparato militar, as mortes, era a guerra!  Hoje é a pena, a nostalgia, os sofrimentos de outra ordem, a inutilidade de vidas jovens forçadas a comissões perigosas, as saudades, a barbaridade, o som dos rebentamentos, as crateras das bombas e dos mísseis, as urnas, os choros e as lágrimas… um recordar mórbido e doentio de tanto desencanto!
Avançámos pelas bermas degradadas, um casco de navio a apodrecer, junto à amurada, um cais ocupado com casebres infectos, entulho, pneus, lixo, muito lixo, aos montes e espalhado, mau cheiro e abandono. As bermas estão imundas, abandonadas, uma via marítima esburacada, candeeiros tortos, linhas dependuradas e fios a monte, enrolados, nas bermas do cais, lama entulho, papéis, pneus, toda a espécie de imundície e escória. Topámos com dois ou três anúncios, muito elucidativos: I.M.P. C.M.B – É PROIBIDO URINAR E VAZAR LIXO. Sintomático e esclarecedor!
Uma tábua, de duvidosa durabilidade e imprevisível resistência, serve de passagem-ponte a um corte longo e profundo do passeio, onde a cloaca escorre imundícies para o cais. E, preso a um poste, candeeiro, pachorrento e acorrentado, um bode branco, de serviço público, à espera de clientes! E o dono por perto para a cobrança.
Há algum movimento de camions, e alguns contentores mostram alguma azáfama de carga e descarga. Poeiral imenso, que o alcatrão derreteu. Subimos à esquerda. É a Amura, forte dos primórdios da ocupação portuguesa, hoje local oficial, sede do mausoléu de Amílcar Cabral. Oficialmente inacessível. Que o diga o Júlio que ali viveu dois anos e que queria ir matar saudades! Nenhuma tentativa resultou, mesmo com a chegada do Maior das Forças Armadas.
Mais acima, logo à direita, o cemitério (enterramento). Logo à entrada, dum lado e doutro, muito bem cuidadas, as campas de militares portugueses e alguns guineenses. Inscrições ainda visíveis, poucas nas campas brancas, anotam os nomes de soldados portugueses tombados na guerra nos anos de 64 e 65… Porque não repatriados? Hoje, cuidadas por um africano contratado pela Embaixada portuguesa, não foram repatriados porque, na altura, o estado português não se encarregava dos gastos da transferência, e os familiares, pobres na generalidade, estávamos em 64-66, não tinham posses… Ali restam esquecidos, embora cuidados, bem como um talhão ao centro que acolhe as ossadas dos mortos no início do séc. XX. Tudo bem cuidado.
Descansem em paz!
AO (Alferes capelão)

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Jornadas culturais UASP 2016: um testemunho!

Mais um ano em que a UASP se reuniu.  Este ano nas TERRAS DO DEMO, com programa e coordenação do Avantino Beleza.
Programa cheio de paisagem, cultura e amizade.
Desde monumentos, Senhora da Lapa, São 00040João de Tarouca, Salsedas, Igreja Matriz de Vila Nova de Paiva e ponte do Ucanha, não esquecendo o castelo do “Adriano” e teriamos que fazer uma pausa para referir a Fundação Aquilino Ribeiro.
Respira-se amizade por aquelas terras: Câmara Municipal de Cernacelhe, Câmara Municipal Moimenta, Colégio Senhora da Lapa e Cooperativa Terras do Demo.
O Avantino sente-se que é o autêntico maestro desta sinfonia que durou dois dias.
Aperitivos (pasteis de nata com maçã, na Fundação Aquilino Ribeiro, lanche na Biblioteca da Câmara Municipal de Cernacelhe, almoço no Colégio da Senhora da Lapa e restaurante da Ponte de Ucanha e jantar no Malhadinhas de Vila Nova de Paiva, com animação por um grupo de concertinas local, não deixando o “Nunes” de nos delieitar com música de Cabo Verde (onde saliento a canção dedicada aos netos “TUTU…..BÉBÉ?”.
O álbum de fotografias, segundo o meu pensar, permite que não esquecemos tanto, tão cedo.
Amigos vamos continuar, vamos inscrevermo-nos mais, ainda somos muitos.
Da minha parte agradeço de coração aberto o que esta associação me tem proporcionado
Até para o ano 2017!
António Vale
(AAASVR- Vila Real)
ÁLBUM FOTOGRÁFICO_JORNADAS CULTURAIS 2016