Como disse no texto já publicado, a 2ª viagem da UASP à Guiné decorreu de 18 a 25 de Março de 2016.
No dia 23 regressámos de Orango. Procurámos em Quinhamel o “restaurante do Português”. Lá nos apareceu no meio do arvoredo, mas comida é que não tinha pois nos disse que não tinha sido avisado. O monte de cascas das saudosas ostras no logradouro acrescentou mais sofrimento à fome.
Rumámos 30 kms para Bissau, onde fomos recebidos com alegria no Papa Loca da Casa do Benfica. Às 15 h serviram-nos pratos bem recheados, embora eu estivesse limitado pelas aftas.
Fomos visitar o hospital da Cumura, muito falado no tempo da minha “guerra” de 1971-73 como hospital dos leprosos. Tem vários pavilhões bem cuidados, muito terreno e jardins. É administrado há dezenas de anos por dedicados e sorridentes Padres Italianos. Tem poucos leprosos, mas acolhe agora cerca de 40 doentes com Sida. É um oásis nas terras da Guiné.
Outro oásis é a Casa Bambaran, onde duas freiras acolhem cerca de 45 órfãos, de alguns meses até cerca dos 14 anos, que aqui têm comida, cama, chuveiros, lavatórios e onde aprendem muita coisa. Também aqui foi entregue uma pesada mala com materiais e alguns deixaram discretamente notas de francos.
Jantámos no edifício que acolhera alunos da Universidade Católica, onde íamos dormir em quartos bem simples e a ventoinha funcionava.
Alguns saímos até às 23 h pela Avenida do Aeroporto parando num bar à conversa com Portugueses que ali conviviam com um Ministro da Guiné.
No dia 25 não fui a Canchungo nem a Cacheu, pois “desenfiei-me” para passear sozinho por Bissau e ir à Base Aérea. Um Sr. Padre da Cúria foi muito simpático e levou-me à Base Aérea, de onde me recambiaram para o Quartel-General a fim de obter licença para entrar na Base. Nestes poucos quilómetros por duas vezes a polícia nos mandou parar: da 1ª vez logo disseram ao Sr Padre que podia seguir; na 2ª vez a menina foi “compensada” apesar de nos desejar “Boa Páscoa”.
Como o QG nos remeteu para o Ministro da Defesa, eu agradeci ao Padre a sua disponibilidade e comecei o reconhecimento sozinho a pé por Bissau. Que tristeza de vistas ! Quase não reconhecia a zona deserta do café Bento e arredores. Muita falta de tinta nas casas “europeias”, que pareciam meio-abandonadas. O dono de um café disse-me que, por ali, parte do alcatrão resistente ainda era do tempo dos Portugueses!
Uma dor de alma subir a Avenida principal e os seus passeios pois faltava algum alcatrão, havia pó e tudo pouco cuidado.
A catedral e o tribunal lá estavam na mesma e em bom estado. Os correios vão ter um bom edifício novo. Lá estava a casa Gouveia. A UDIB mantém-se mas precisa de avivar as cores. A Associação Comercial está bonita e é a sede do PAIG, com salas para as pessoas frequentarem.
A Praça do Império continua grande e chama-se agora dos Heróis, bem ajardinada.
O Palácio do Governo, que é agora da Presidência da República, mantém a mesma fachada imponente, está bonito depois de ter sido muito bombardeado em 1998 e de ter sido recuperado pelos Chineses. Só é pena que as ruas à sua volta estejam cortadas ao trânsito de peões e veículos e nelas estejam carros blindados com militares do centro da África a guardar um Presidente, que deixou o PAIG e que não é amado pelas pessoas com quem falei. E que quer impor no governo pessoas que o maioritário PAIG não aprova ou vice-versa.
O café Império lá continua com a sua esplanada e com muita gente, pois será a casa melhor arranjada de Bissau.
A caminho da messe de Oficiais da Força Aérea entrei pelos jardins da sede da Ordem dos Advogados de Bissau, tendo o Bastonário mostrado as várias salas, quase despidas, lamentando a falta de livros nomeadamente sobre o Código Civil e o Código de Processo Civil, que me disse seguirem ainda os de Portugal da década de sessenta.
Por outra rua persegui a visita à messe. Acabava de filmar vários urubus quando dois soldados me disseram que não podia filmar ali nem prosseguir porque a messe era agora ocupada pelos tais soldados estrangeiros.
Continuei pelas ruas largas de Bissau que estão agora a receber alcatrão. Nos passeios tive de ir baixando os olhos para os buracos fundos que vão receber postes e caixas.
Onde almoçar? Foi mais certo voltar à casa do Benfica, que tem ar condicionado e os pratos são servidos à portuguesa e bem compostos. Ah: o salão da casa do Benfica, das saudosas danças, terá pouco uso.
A Embaixada de Portugal tem vários edifícios e muito movimento de pessoas, mas disseram-me que o meu pouco tempo já não dava para conseguir uma entrada na Base.
Então atirei-me para o Q G do meu tempo subindo a estrada de St Luzia. Quis ir a pé para reconhecer aquele percurso, o que se tornou numa pesada penitência de Quinta-feira Santa numa tarde de muito calor e de algum pó. A final o QG ficava muito longe. Quando cheguei ao Ministério da Defesa eram 16,30 h e o Ministro já tinha saído.
Deambulei à procura do QG do meu tempo com os seus jardins a subir, mas no sítio aonde cheguei, que era mais alto do que a paisagem, só encontrei uns aquartelamentos dispersos, que pouco me trouxeram à memória.
Regressei ao centro e quis ir reconhecer o ” Pilão”. Vi muitas ruas, algum alcatrão, muito trânsito, valas para saneamento a céu aberto. Também li placas com o nome ” Cupelom” . Mas, também aqui, entrei ao contrário, de poente para nascente e não reconheci o tão falado “Pilão”, agora com muitas mais casas. Pus-me à conversa com três simpáticas meninas. Como já lhes tinha dado uma nota, saboreei umas panquecas feitas ali na rua e na hora e um gelado artesanal que era divinal.
Conversei no quartel dos bombeiros de Bissau, que já ali existia no meu tempo.
Desci até ao cais do “Pidgiguiti”, que estava pobre, com lodo e barcos velhos. ” Não filme aquele barco”. Por quê ? ” É militar”.
Foi uma dor d`alma ver o abandono daquelas antigas casas e o estado daquelas ruas. Lembrei a minha amiga Isilda Araújo, cujo casal recebia muitos Portugueses, especialmente os de Valongo.
Subi até à catedral onde se ensaiava para a Missa de Quinta-feira Santa espalhando-se os cânticos pelos altifalantes. Não tivemos o Bispo de Bissau, mas tivemos o nosso companheiro Pe. Artur a presidir às cerimónias numa catedral cheia. E que bem cantava e se mexia o alegre grupo coral!
Timóteo Moreira