Em tudo o que existe, está impresso o nome da Trindade!
Ano B - Solenidade da Santíssima Trindade
Mateus 28,16-20: “Eu estou sempre convosco até ao fim dos tempos”.
Hoje celebramos a solenidade da Santíssima Trindade.
Experimentámos a acção salvadora do Pai, do Filho e do Espírito Santo
durante os períodos da Quaresma e da Páscoa. Neste domingo, depois do
Pentecostes, a Igreja convida-nos a contemplar esta ação amorosa das
três pessoas individuais em Deus na sua unidade e sinergia. “Esta festa é como um oásis de contemplação, depois da plenitude do Pentecostes.” (P. Angelo Casati).
A Santíssima Trindade é uma festa relativamente recente. Foi
introduzida no calendário litúrgico no século XIV e atribuída ao
domingo seguinte ao Pentecostes, considerado o domingo mais adequado,
tendo em conta que a Trindade se revelou plenamente com a descida do
Espírito Santo. Não estamos a celebrar uma verdade do catecismo,
encerrada numa formulação dogmática, nem um mistério enigmático. É uma realidade viva, bela, surpreendente, que está no centro da boa nova do Evangelho e que São João resume na afirmação: “Deus é amor” (1Jo 4,8).
A Trindade não é uma festa particular a ser celebrada uma vez por ano,
mas é o coração e a raiz da vida cristã. Celebramo-la na Eucaristia,
que tem tudo a ver com a Trindade. Além disso, é a expressão máxima da
vocação do cristão, do seu modo e estilo de vida. Teilhard de Chardin
fala de “amouriser le monde”, “amorisar” o mundo!
O caminho para a fé na Trindade
Todos os cristãos professam a fé na Trindade: “Deus é um só em três pessoas”. Não encontramos esta definição de Deus na Bíblia e as primeiras gerações de cristãos não usavam a palavra Trindade. O primeiro a empregá-la ("Trinitas") foi Tertuliano,
um Padre da Igreja (+240). Não se trata, evidentemente, de uma
invenção, mas do fruto da sua meditação sobre a Sagrada Escritura. Não
faltam alusões a esta verdade de fé no Novo ou Segundo Testamento. Na conclusão do Evangelho de Mateus, que a liturgia nos propõe para hoje, encontramos a fórmula trinitária mais explícita de toda a Sagrada Escritura: “Ide e ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo.” (Mt 28,16-20). Outra encontra-se na saudação final da segunda carta de São Paulo aos Coríntios: “A graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo estejam com todos vós.” (2 Coríntios 13,14).
O Antigo ou Primeiro Testamento foi um
percurso lento e progressivo de experiência e conhecimento de Deus que
conduziu o povo de Israel à profissão de fé num Deus único.
Encontramos esta fé maravilhosamente formulada na primeira leitura de
hoje: “Considera hoje e medita em teu coração que o Senhor é o único
Deus, no alto dos céus e cá em baixo na terra, e não há outro.”
(Deuteronómio 4). Podemos imaginar como poderia ser escandaloso, neste
contexto, que Jesus se proclamasse Filho de Deus e falasse da pessoa do
Espírito Santo. Os primeiros cristãos foram de facto audazes ao dar início à fé na Trindade,
que só seria claramente formulada no século IV. Só uma convicção
profunda, recebida através do ensinamento e do testemunho de Jesus, os
poderia ter levado a tal ousadia.
Do exterior à intimidade de Deus
A
inteligência humana pode chegar à unicidade de Deus (monoteísmo)
através da reflexão e da filosofia. É possível a todos chegarem a Deus
através da sua epifania na criação. Em contrapartida, só a fé em Jesus nos conduziu à trindade das pessoas no Deus único,
pois “a Deus, ninguém jamais viu: o Filho único, que é Deus e está no
seio do Pai, foi ele que o revelou”. (João 1,18). Não se trata, porém,
de um conhecimento teórico ou dogmático, de pouca ou nenhuma utilidade,
mas de uma introdução na intimidade de Deus, de uma imersão no
imenso e surpreendente mistério de Deus. Dietrich Bonhoeffer escreve:
"Não nos interessa um divino que não faça florescer o humano!
Hoje
vivemos projectados para o mundo e para o universo, desejosos - com
razão - de conhecer os mistérios do cosmos e da vida. Mas poucos estão interessados em mergulhar no Mistério por excelência! A
humanidade sempre procurou conhecer o "cosmos" que traz dentro de si:
“Conhece-te a ti mesmo!”. E, apesar dos progressos espantosos das
ciências, continuamos a ser um enigma para nós próprios. Só a abertura a Deus e ao seu Mistério pode revelar o homem a si mesmo!
Este Mistério é a chave para compreender toda a realidade. Bento
XVI disse: “Em tudo o que existe está num certo sentido gravado o
"nome" da Santíssima Trindade, porque todo o ser, até às últimas
partículas, é um ser em relação, e assim transparece o Deus-relação,
transparece por fim o Amor criador. Tudo deriva do amor, tende para o
amor e se move impelido pelo amor, naturalmente com diferentes graus de
consciência e de liberdade.” (Angelus 7/6/2009).
A Trindade, uma exigência de amor
Se, por um lado, o mistério da Trindade é difícil de compreender, porque entra em conflito com a nossa lógica, por outro lado poderíamos dizer que é fácil de compreender, porque é uma exigência do próprio amor. Um
Deus unipessoal seria solipsista, como poderia ser amor? Um amor de
dois poderia tornar-se um amor de reciprocidade, um amor especular, em
que os dois amantes se espelham um no outro. Continua a ser um amor
imperfeito. É necessário um terceiro que encarne a diversidade e que obrigue o amor a dois a sair da lógica da reciprocidade para integrar o diferente.
Deus criou o homem "à sua imagem e semelhança" (Génesis 1,26-27), todavia o ícone da Trindade não é o casal, mas a família, isto é, o casal fecundo que acolhe "o outro", que sai da lógica especular. Deus é Família. Neste
sentido, é preocupante a atual tendência crescente que se verifica de
excluir a possibilidade de ter um filho, seja por constrangimento
sociológico, económico ou laboral, seja por opção do próprio casal. A procriação diz algo sobre Deus. A natureza traz em si uma marca trinitária.
“A forma perfeita de comunhão, que é o símbolo de toda a comunhão, é o "três". […]
O cristão deve ter o número três como número sagrado: "A minha fé é
três, a minha vida é três"... Porque a fé não é uma coisa e a nossa vida
é outra. A nossa vida é "três". Para nós, o número "três" é o objetivo,
é aquilo por que temos de lutar. A nossa vida torna-se uma vida pobre e
inacabada se não experimentarmos o amor do 'três'”. (Cardeal José
Tolentino de Mendonça).
Exercício diário de oração para a semana
1.
Fazer o sinal da cruz no início do dia, com uma consciência especial de
o viver em nome da Trindade. E no fim do dia, antes de nos abandonarmos
ao sono, repeti-lo como uma imersão no infinito Mar de Amor.
2. Repetir frequentemente ao longo do dia, como o respiro do coração, a doxologia:
Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo.
3. Rezemos com Santa Catarina de Sena:
“Trindade
eterna, sois como um mar profundo, no qual quanto mais procuro, mais
encontro; e quanto mais encontro, mais cresce a sede de vos procurar.
Vós sois insaciável; e a alma, saciando-se no vosso abismo, não se
sacia, pois permanece com fome de Vós, sempre mais desejosa de Vós, ó
Trindade eterna, desejando ver-Vos com a luz da vossa luz.
P. Manuel João Pereira Correia mccj
Verona, 23 de maio de 2024
Para a reflexão completa, ver:https://comboni2000.org/2024/05/24/riflessione-domenicale-in-tutto-cio-che-esiste-e-impresso-il-nome-della-trinita/
P. Manuel João Pereira Correia mccj
p.mjoao@gmail.com
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