sábado, 3 de agosto de 2024

Eu sou o pão da vida - Pe. Manuel João, MC

 Eu sou o pão da vida

Ano B – Tempo Comum – 18º domingo
João 6,24-35: "Eu sou o Pão da Vida"

Após o relato da multiplicação dos pães, hoje, e nos próximos três domingos, continuaremos a leitura do capítulo 6 do evangelho de São João, uma longa catequese sobre o significado do "sinal" (milagre) operado por Jesus. Retornando dos arredores de Tiberíades, estamos agora em Cafarnaum, na sinagoga (v. 59). Lembremos o contexto. Após o milagre, "Jesus, sabendo que viriam buscá-lo para o fazerem rei, retirou-se novamente, sozinho, para o monte", enquanto seus discípulos, ao entardecer, subiram no barco e se dirigiram para Cafarnaum. A liturgia saltou esta segunda unidade do capítulo (6,16-21), que conta o episódio de Jesus que, caminhando sobre as águas, alcança seus discípulos no barco.

Um discurso em diálogo

A reflexão sobre o "sinal" é apresentada em forma de diálogo entre a multidão e Jesus. Encontramos três perguntas e um pedido da multidão, aos quais Jesus responde com outras tantas intervenções.

1. "Mestre, quando chegaste aqui?". A MULTIDÃO ficara surpresa porque não encontrara Jesus onde ele tinha ficado no dia anterior, ou seja, nos arredores de Tiberíades.
- JESUS, em vez de responder à questão deles, vai direto à intenção da busca deles: "Em verdade, em verdade vos digo: vós PROCURAIS-ME, não porque vistes milagres, mas porque comestes dos pães e ficastes saciados"; e conclui com uma exortação: "Trabalhai, não tanto pela comida que se perde, mas pelo alimento que dura até à vida eterna".

2. "Que devemos nós fazer para praticar as obras de Deus?". A MULTIDÃO pede uma explicação sobre o "fazer" e "praticar", ou seja, quais obras realizar.
- JESUS responde-lhes que uma única obra é necessária: "A OBRA de Deus consiste em acreditar naquele que ele enviou".

3. "Que milagres fazes tu, para que nós vejamos e acreditemos em ti? Que obra realizas?". Dado que Jesus reclama uma confiança total na sua pessoa, a MULTIDÃO pede um sinal adicional, uma obra maior do que a que Jesus havia feito. Jesus havia alimentado uma multidão de cinco mil e uma única vez, enquanto, segundo eles, Moisés com o maná havia nutrido todo um povo durante quarenta anos!
Ao que JESUS responde: "Não foi Moisés que vos deu o PÃO do Céu; meu Pai é que vos dá o verdadeiro pão do Céu". Ou seja, não foi Moisés, mas o Pai que deu o maná no passado e agora oferece a eles o pão verdadeiro, realmente descido do céu"!

Esta primeira parte do diálogo se conclui com a "oração" da multidão: "Senhor, dá-nos sempre desse pão". Mas qual pão?! Jesus responde com uma revelação: "Eu sou o pão da vida!" EU SOU ("Egō eimí", em grego) é uma alusão ao nome de Deus!

Até aqui, poder-se-ia dizer que a multidão manifesta certa receptividade. Afinal, eles procuraram Jesus, pediram explicações e formularam uma espécie de "oração". Contudo, notamos uma persistente ambiguidade de fundo. Enquanto Jesus tenta levá-los a uma leitura espiritual, profunda, do "sinal" miraculoso, a multidão permanece fixada no pão material. Veremos o que acontecerá nos próximos domingos. Não podemos, contudo, julgá-los e muito menos condená-los, pois eles não são senão o espelho de nossa realidade!

 

Aprofundar o sinal

Procuremos aprofundar o "sinal", pedindo ao Pai que nos atraia para Jesus. Ele nos dirá no próximo domingo: "Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou não o atrair" (v. 44). Façamos esse trabalho de aprofundamento através de três palavras ou conceitos que sintetizam o diálogo entre Jesus e a multidão: a procura, a obra e o pão.

1. A PROCURA. O relato começa com a procura. A multidão procura Jesus e o encontra em Cafarnaum. A procura é uma atitude natural de quem experimenta a sua própria indigência, nas suas várias formas. É também a atitude daquele que acredita e tem sede de Deus: "Desde a aurora eu te procuro, ó Deus" (Salmo 63). O tema da procura é caro a São João. As primeiras palavras de Jesus são: "Que procurais?", dirigidas aos dois discípulos que o seguiam (João 1,38). Denunciando a não autenticidade da busca da multidão, Jesus interpela também a cada um de nós. O que procuro eu no meu relacionamento com Cristo? Simplesmente uma ajuda, um benefício, uma graça ou uma consolação? Ou busco realmente estabelecer com ele um vínculo autêntico de amor e confiança? Nossa resposta pode parecer quase óbvia. Apenas um exame contínuo e sincero de nossas motivações mais profundas levará a um longo, árduo e, por vezes, até doloroso trabalho de purificação!

2. A OBRA. A única obra daquele que acredita é buscar, conhecer e amar cada vez mais o seu Senhor. Todos os dias nos esforçamos para ganhar o pão material. Um compromisso semelhante deve ser assumido na busca de conhecer o Senhor, através da Palavra de Deus, da oração e da reflexão sobre os acontecimentos da vida. O dia em que não cresci no conhecimento do Senhor foi um dia desperdiçado!

3. O PÃO. O pão é o tema central das leituras: encontramo-lo mencionado inúmeras vezes na primeira leitura, no salmo e no evangelho. De que pão se trata? Sim, também se trata do pão material, pois quando falta o pão, facilmente se perde a liberdade. Isso é bem retratado na primeira leitura (Êxodo 16), onde Israel recorda com saudade o tempo da escravidão em que podia comer carne e pão à vontade. Para comer, os trabalhadores deixam-se explorar pelo patrão. Para comer, tantas jovens mulheres são obrigadas a prostituir-se nas ruas de nossas cidades. Para comer, vendemos a nossa dignidade, como Esaú por um prato de lentilhas!...

Mas "não só de pão vive o homem"! A Palavra de Deus convida-nos a tomar consciência dos diferentes tipos de fome que há em nosso coração e de como e com o que os estamos saciando. Jesus se propõe como o "Pão da Vida" que sacia a fome e a sede de vida que carregamos dentro de nós. Jesus ainda não está a falar da eucaristia, mas de si mesmo como a Palavra descida do céu. "A Palavra se fez carne" (João 1,14). Podemos então orar verdadeiramente como a multidão do evangelho: "Senhor, dá-nos sempre desse pão", o Pão que és tu, Palavra do Pai, descida do Céu!

P. Manuel João Pereira Correia,
Verona, 2 de agosto de 2024

P. Manuel João Pereira Correia mccj
p.mjoao@gmail.com

 

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