sexta-feira, 28 de abril de 2017

Combonianos 70 anos em Portugal: Os primeiros passos

Estava em Viseu um só comboniano italiano, o Pe. João Cotta, desde 22 de Abril de 1947. Com a chegada, a 3 de Novembro daquele ano, de mais três sacerdotes, os combonianos formaram a primeira comunidade em Viseu. Eram todos padres: João Cotta, Ézio Imoli, Ângelo La Salandra e Rino Carlesi.

Dias depois, o bispo senhor Dom José da Cruz Moreira Pinto nomeou-os para trabalhar nas paróquias de Mangualde (P.e Ezio Imoli), Bodiosa (P.e Rino Carlesi) e Canas de Sabugosa (P.e Ângelo La Salandra).

O P. Rino Carlesi, que viria a ser bispo de Balsas, no Brasil, descreveu as primeiras ações apostólicas na diocese de Viseu: «Conheci e fiz amizade com todos os padres de Viseu e redondezas, por causa dos funerais, da pregação, das festas religiosas. Foi o começo da minha vida de cigano, de animação missionária nas paróquias. Depois o senhor bispo levou-me, como seu missionário, para pregar ao povo nas visitas pastorais. Fui pescador de vocações e pregador de missões.»

Em Janeiro de 1948 o grupo alugou uma casa em Viseu e começa a arranjar-se a casa do caseiro.

O segundo grupo de combonianos italianos (um sacerdote e dois Irmãos construtores) veio em Março de 1948.

Passaram pelo Seminário Menor de Fornos de Algodres. No diário da viagem deixaram a seguinte impressão: «Ajoelhámo-nos aos pés da imagem de S. José, no claustro interno do Seminário sentindo tantos motivos para agradecer; pensámos nos nossos futuros seminaristas e agradecemos a S. José por nos ter trazido a esta terra tão rica de vocações.»

A 14 de março, na igreja matriz da paróquia de Ranhados (à qual pertencia a quinta onde se instalaram os combonianos), a chegada deste grupo foi celebrada festivamente com uma eucaristia. Os Combonianos cedo se inseriam na sua comunidade paroquial.

A 1 de junho de 1948 foi lançada a primeira pedra da casa (hoje «casa velha»), com técnicas muito avançadas. O edifício está pronto a habitar em 28 de Junho de 1949. Menos de dois meses depois, a 14 de Agosto, é inaugurada a primeira capela.

Nessa altura, a 27 de Fevereiro de 1949, o P.e João Cotta, que fizera «milagres», com o grande apoio do Bispo de Viseu, D. José da Cruz Moreira Pinto, nos 22 meses em que nesta diocese permaneceu, de 23 de abril de 1947 a 27 de fevereiro de 1949, já havia partido para a Inglaterra.

Em Maio daquele ano, durante a Semana Nacional das Missões, são distribuídos pela diocese 250 cartazes que dão a conhecer o futuro Seminário das Missões e o Instituto Comboniano. Estavam decorridos dois anos cinco meses e dezassete dias depois da chegada do P. João Cotta a Viseu…

A 10 de Outubro daquele ano de 1949, e após uma semana de estágio em Setembro, iniciava-se o 1º ano letivo no Seminário das Missões com 16 alunos no primeiro ano e um no 5º ano, vindo do Seminário Diocesano.

Se no final de 1952 o Seminário atual já estava construído, só em 11 de Dezembro de 1955, ao terminar da nova Capela, foi considerado completo, oito anos sete meses e dezanove dias depois da chegada do primeiro comboniano a Viseu.

Os primeiros combonianos portugueses

Os primeiros sacerdotes combonianos portugueses, tinham passado pelo Seminário Diocesano.

O P. Rogério Artur de Sousa, natural de Sargaçais, Soito, Aguiar da Beira, que, depois de ter feito o seu noviciado e a teologia em Itália, foi ordenado pelo Senhor D. José da Cruz Moreira Pinto , na Igreja do Seminário das Missões em Viseu a 27 de Julho de 1958.

O P. Ramiro Loureira da Cruz, natural de Barbeita, Rio de Loba, Viseu, fez também o noviciado e teologia em Itália e foi ordenado sacerdote na Catedral de Milão pelo Cardeal Montini (futuro Beato Paulo VI) a 14 de Março de 1959.

O primeiro Irmão Missionário Comboniano Português foi o Irmão António Martins, natural de Cepões, Viseu, que fez a sua Profissão perpétua em VN de Famalicão a 9 de Setembro de 1960.

Ao longo destes 70 anos a diocese deu muitas vocações aos missionários combonianos.

Prof. Valente

domingo, 23 de abril de 2017

UMA HISTÓRIA SINGULAR - Apresentação

No próximo dia 4 de Maio vai ser apresentado em Lisboa,pelas 18.30, na sede da ALÉM-MAR, o livro da autoria do Pe. Manuel Augusto Lopes Ferreira sobre a história dos 70 anos da presença comboniana em Portugal com o sugestivo título " UMA HISTÓRIA SINGULAR".
Como bem se recordam, nós tivemos a dita de no encontro do ano passado ouvirmos um pouco do que nessa altura o Pe. Manuel Augusto já tinha escrito.
Nós fazemos parte dessa narrativa. Daí que seja um livro a termos connosco para ler e reler. O Pe. Manuel Augusto convida todos os que residem em Lisboa a estarem presentes no seu lançamento.
Não se esqueçam: dia 4 de Maio.
Trancrevo a carta onde o Pe. Manuel Augusto manifesta esse convite:

Estimado amigo Isidro,
Um abraço, com votos de feliz Páscoa e felicidades para si, sua esposa e família.
Venho pedir-lhe um favor.
No dia 4 de Maio, pelas 18.30, na sede da Além-Mar, vai ter lugar em Lisboa a apresentação do livro sobre a História dos Combonianos em Portugal (Combonianos em Portugal: Uma Historia Singular).
Eu gostaria de mandar um convite aos antigos alunos que vivem em Lisboa. Não poderia mandar-nos a lista dos AA residentes em Lisboa de que tenha os endereços email? Se for possível seria bom, senão paciência.
Desde já, o meu obrigado.
De novo, felicidades e até breve.
Pe Manuel Augusto

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Livro: A história dos 70 anos da presença comboniana em Portugal

"...Assim, revisitar a história da província portuguesa dos Missionários Combonianos do Coração de Jesus não é tão-pouco embandeirar em arco, pavonear-se no passeio das vaidades.

É celebrar o passado por inteiro, com as suas luzes e sombras, com a sua graça e pecado, com as conquistas e as derrotas para nos inspirarmos e ousarmos caminhos novos de animação missionária, pastoral vocacional de rosto comboniano e governo com a mesma audácia inovadora, generosa, alegre, inserida e próxima dos que nos precederam.

O meu muito bem-haja reconhecido ao P. Manuel Augusto Lopes Ferreira por ter aceitado o convite do Conselho Provincial para aprofundar e escrever a história dos 70 anos da presença comboniana em Portugal..."

terça-feira, 18 de abril de 2017

Assembleia Provincial das Irmãs Combonianas 18 de Abril de 2017

Viseu está na moda!!!!!
"A Assembleia Provincial das Irmãs Missionárias Combonianas Europa acontecerá de 20 a 23 de abril no Seminário das Missões, em Viseu.

Esperam-se cerca de 45 irmãs de várias nações europeias. Durante o encontro serãodiscutidas as Atas Capitulares do XX Capítulo Geral, realizado em Verona de 5 a 30 de setembro de 2016.

Pedimos aos amigos as vossas orações para que nos acompanhe neste evento."

domingo, 16 de abril de 2017

METAMORFOSES PASCAIS DO DESEJO (1) Frei Bento Domingues, O.P.


1. Os textos do Novo Testamento (NT) não foram encomendados ou ditados, relidos ou corrigidos por Jesus Cristo. Surgiram em comunidades cristãs, depois da sua morte, para mostrar que o processo que O vitimou não podia ser arquivado. A coligação das autoridades romanas e judaicas, ao contrário das aparências, sob a capa de um julgamento, de facto, tinham decretado o assassinato de um inocente em nome de Deus e do Império[1].

Os autores do NT, ao reabrirem o processo, não pretendiam rever uma questão jurídica do passado, mas testemunhar que estavam completamente enganados os que julgavam que o Nazareno e as suas propostas tinham uma pedra em cima, para sempre. Estava em curso, até ao fim dos tempos, a passagem agitada para uma nova era.

Era difícil o caminho da realização da esperança. Mesmo depois da ressurreição, até os discípulos mais chegados, continuavam a alimentar concepções messiânicas que Jesus tinha expressamente rejeitado durante a sua vida terrestre. O autor dos Actos dos Apóstolos começa a sua obra narrando esse distorcido desejo pré-pascal: Estando reunidos, perguntaram-lhe: «Senhor, é agora que vais restaurar a realeza em Israel?»[2]. 

Jesus não lhes reconheceu competência sobre essa questão. Precisavam de outra lucidez e de outra energia para enfrentar os novos tempos: recebereis uma força quando o Espírito Santo tiver chegado sobre vós e sereis minhas testemunhas em Jerusalém e em toda a Judeia e Samaria, até ao fim da terra[3]. Os Actos dos Apóstolos desenharam um cenário  espantoso desse acontecimento: de repente, veio do céu um ruído semelhante a um vendaval, ficaram cheios do Espírito Santo, soltou-se-lhes a palavra e cada um os ouvia na sua língua materna.

 Ao espanto de uns respondia a chacota de outros: estão com os copos. Coube a Pedro explicar o que estava a acontecer e rematou o seu entusiasmado discurso com esta solene proclamação: Que toda a casa de Israel tenha a certeza de que esse Jesus que vós crucificastes, Deus o fez Senhor e Cristo[4].

Ao ouvirem isto, diz o texto, trespassou-se-lhes o coração e disseram a Pedro e aos demais Apóstolos: que devemos fazer? Precisavam de uma viragem completa mediante a conversão, banho de Espírito Santo em nome de Jesus Cristo e partida para a missão universal.

O profeta Joel já tinha escrito o poema para celebrar o que estava a acontecer: derramarei o meu Espírito sobre toda a carne. Os vossos filhos e as vossas filhas hão-de profetizar, os vossos jovens terão visões e os vossos velhos, com sonhos, sonharão[5].

2. A pergunta subjacente a tudo o que foi dito é esta: quem tinha razão? Jesus ou aqueles que o mataram?

Procurar, hoje, uma resposta a essa pergunta não é para resolver um problema de há dois mil anos. Com o rodar do tempo e usando as mesmas palavras podemos estar a falar de realidades opostas ou que perderam o impacto que já tiveram.

 Se Jesus foi morto em nome de Deus, da religião e dos interesses do Império, é óbvio que importa redescobrir qual era a concepção que Ele tinha de Deus, da religião e dos interesses do império. Não é uma operação fácil.

Os escritos do NT estão configurados por formulações teológicas, antropológicas e cristológicas muito diferentes. Nasceram de percursos de comunidades cristãs em contextos diversos. Temos de resistir à tentação de sistematizar ou enquadrar, numa visão unificadora, essas concepções. No entanto, na sua diversidade, nasceram da urgência de confrontar a vida pessoal e comunitária com as narrativas de experiências com Jesus Cristo, na convicção de que Ele está vivo e o seu Espírito, se for acolhido com fidelidade, suscitará atitudes criativas perante novas situações.    

Passada a primeira febre apocalíptica paulina – a de organizar e preparar os cristãos para o fim do mundo[6] – os textos destinam-se a preparar os discípulos, para enfrentar, com fidelidade, os novos desafios: acreditar e andar sem ver. Por isso, nunca poderão evitar a pergunta: Qual foi o percurso do Mestre?

3. Jesus levou muito tempo a encontrar o seu próprio caminho: teve de romper com o amigo mais admirado, João Baptista; com as concepções e expectativas messiânicas dominantes, expressas nas tentações que o assaltaram e nunca o largaram até ao último momento.

Não se dá o devido relevo à luta que teve de travar para romper com o caminho de João Baptista e sobretudo com as tentações messiânicas dominantes. Os quatro Evangelhos não são textos escolares, didácticos, professorais. São textos polémicos, precisamente, acerca da incompatibilidade entre as concepções e atitudes de Jesus, as dos discípulos e as dos adversários. Foram estas incompatibilidades que O levaram à cruz. Naquela sociedade sacral, a grande incompatibilidade nascia no seio da religião porque era ela que comandava tudo. Jesus não era um ateu, um agnóstico ou um sem religião. Aquilo que o enervava não era só a hipocrisia, que continuamente denunciou, mas verificar que o recurso às observâncias religiosas, ao nome de Deus e à sua vontade servia para classificar uns como santos e salvos e outros como pecadores e perdidos. Era uma luta teológica por causa de uma questão antropológica. Um Deus que é o consolo dos piedosos, dos ricos, dos poderosos e uma fonte de humilhação dos classificados como pecadores, por aqueles que estabeleciam as leis da santidade e as do castigo, era uma vergonha.

O caso permanente era a sua polémica com o Sábado, uma instituição civilizacional fantástica – o ser humano não é só para trabalhar –, mas que foi transformada no dia da opressão, em nome de Deus. A insistência de Jesus em violar o sábado parecia uma actuação provocatória: escolhia, precisamente esse dia, para fazer o que estava proibido. Tinha uma razão altamente teológica, coincidente com uma razão profundamente humana: o dia consagrado a Deus tinha de coincidir com o dia da libertação das vítimas da doença interpretada como possessão diabólica, fruto do pecado. Um Deus que não é a alegria da vida, não é Deus. É um ídolo criado para justificar a dominação económica, política e religiosa, como veremos.

Páscoa para os nossos desejos distorcidos.

16.04.2017





[1] Act 4, 27-28.
[2] Act 1, 6
[3] Act 1, 8
[4] Act 2, 36
[5] Act 2, 17-19
[6] 1Tes.4, 9-18

sábado, 15 de abril de 2017

Páscoa Feliz! - UASP

Se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto (Jo 12,24)


A UASP deseja à suas Associadas, antigos alunos dos Seminários, seus familiares e amigos, uma Páscoa Feliz!


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quarta-feira, 12 de abril de 2017

UASP: IV Forum - Conclusões

(...) Fomentar a corresponsabilidade eclesial e a participação em projetos que procurem a dignidade humana e os valores evangélicos, é uma das obrigações da UASP (União das Associações dos Antigos Alunos dos Seminários Portugueses) que tão bem soube levar a cabo no passado dia 1, no Hotel São Nuno, um ótimo local para reflexão, que é também a atual casa-mãe dos Carmelitas da Antiga Observância em Portugal (continua).



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terça-feira, 11 de abril de 2017

MAIO DE 2017-Encontro Geral em Viseu

1º Encontro em Coimbra em 1976
Caros Colegas e Amigos

É com muito gosto que vos envio o " Programa" para o nosso encontro geral a realizar em Viseu no 1º sábado de maio, dia 6. Trata-se de um ano muito especial. Como sabem, no dia 30 de abril, faz 70 anos que os primeiros  cabouqueiros combonianos chegaram a Viseu. Ou seja, uma semana antes do nosso encontro. Encontraremos, por isso, a comunidade comboniana de Viseu ainda na ressaca dessa celebração que será grande e muito participada por muitos dignitários. Nós , à nossa maneira, celebraremos o facto uma semana depois. Não teremos grandes dignitários connosco. Estaremos nós, rapazes simples do povo que, de alguma forma, fomos alguma vez e durante algum tempo, tocados pelo espírito daqueles cabouqueiros inflamados pelo espírito de Comboni.

O nosso encontro anual visa recordar esses tempos em que, menino(s) e moço(s), como dizia o poeta, saímos das nossas pobres e serranas aldeias com vontade de converter muitos pretinhos e, pelo meio, matar todos os leões ou tigres que se nos interpuzessem no caminho. De tudo isto ficou uma marca, o Espírito Comboniano, em que nos reconhecemos e desejamos manter viva no reencontro com os que sonharam connosco e com aqueles que alimentaram esses sonhos.

Este ano alguns colegas celebram, também, o 50º e o 60º aniversário da sua entrada no seminário. Espero que apareçam todos para uma foto e ,em grupo, recantarmos " o comboio do vale do vouga".

Uma Santa Páscoa para todos

Pela direcção

António Pinheiro




ASSOCIAÇÃO DOS ANTIGOS ALUNOS

COMBONIANOS DE PORTUGAL

Caros Amigos

Realiza-se já no 1º sábado do próximo mês de Maio, dia 6, o nosso encontro anual em Viseu – Seminário das Missões. O 1º encontro foi realizado em Coimbra em 1976.

ORDEM DE TRABALHOS


09.00/10.00  -  Recepção e Acolhimento

     11.00       -  Reunião Geral :

                        -  Abertura com o Hino da Associação

                        -  Informações gerais

                        -  Video : Pes. Neres e Claudino no Congo

                        -  Ir. José Manuel: As minhas vivências em Terras de Missão                          

                        -  Pe. José Vieira ( Provincial) – Informações sobre a Congregação 
  
      12.30      -  Celebração da Eucaristia presidida pelo Provincial Pe José Vieira 
                                      
      13.30      -  Almoço . Convívio com vídeos editados pelo José Faria

A reunião, como assembleia geral que também é, pode ser ocasião para renovar os órgãos sociais da Associação. Surja uma lista!!!!!!

APARECE. Traz a família ou outros colegas que tu conheças. VEM CEDO  para fazer render o dia.

Este ano a turma de 1967 e a de 1957 fazem  50  e 60 anos, respectivamente. Seria interessante o reencontro e uma foto de conjunto…50 e 60 anos depois…

Por razões logísticas ( e para minimizar custos), agradece-se que até ao dia 4 de Maio confirmes a tua presença por email ou por telefone para um dos seguintes números:
Isidro Almeida – 234198433 – 926493057 – isidro.almeida@gmail.com
Ir. Valentim – 967838001- valentimrodrigues@hotmail.com
António Pinheiro – 252413057 – 918612894 – aspinheiro@clix.pt
Associação – antigos.alunos.combonianos@gmail.com

Um grande abraço
 Pela Direcção
António Pinheiro
                                                          Vila Nova de Famalicão, 10 de Abril de 2017

segunda-feira, 10 de abril de 2017

A BÍBLIA EM PRAÇA PÚBLICA Frei Bento Domingues O.P.


1. Como escreveu, em 2016, o Prof. José Augusto Ramos, o universo cultural, editorial, científico e académico português foi recentemente presenteado com o aparecimento do primeiro volume de uma tradução da Bíblia grega, conceito que nos tem  sido estranho, desde há muitos séculos[1]. Este ano, nos finais de Março, Frederico Lourenço inundou todas as livrarias com o segundo volume da tradução da Bíblia grega, o Novo Testamento completo, escrito há quase 2000, cujo original é irrecuperável. Esta tradução está baseada no texto fixado por Nestle-Aland[2].

Para F. Lourenço, a leitura comparativa dos evangelhos canónicos e dos restos que nos chegaram dos apócrifos não deixa qualquer dúvida quanto à imprescindibilidade de Marcos, Mateus, Lucas e João, talvez os livros mais extraordinários da História da Humanidade.

 Um padre, espantado com este fenómeno, perguntou-me: mas esse tradutor é padre? Quando lhe respondi que não era padre nem ex-padre, não era católico nem protestante e que neste trabalho prescinde, metodologicamente, de pressupostos religiosos, mostrou-se desconfiado. Aí há gato!

O que há, de facto, é talento, competência e muito trabalho. Convidei esse clérigo apreensivo a ler o currículo do tradutor que vem nas capas de ambos os volumes e acrescentei o meu pressentimento: com esta aparição, Frederico Lourenço e os responsáveis da Quetzal Editores vão alterar o clima cultural da Bíblia, no nosso país. Não esperam canonizações, mas merecem avaliações críticas competentes[3].

Pensar que o estudo da Bíblia e as suas traduções só merecem confiança, se forem obra de clérigos e de editoras católicas submetidos ao Imprimatur episcopal, é supor que a Bíblia é propriedade privada de empresas confessionais. Que os responsáveis das comunidades católicas zelem pela formação bíblica dos seus membros e pelas expressões da fé cristã é o mínimo que se lhes pode pedir. Infelizmente, nem sempre cumprem esta missão.

Ninguém tem o monopólio da Bíblia e só há vantagens em que seja reconhecida e trabalhada como o Livro dos livros, a expressão das raízes judeo-cristãs da civilização ocidental. Há muito a fazer para se tornar parte activa da cultura portuguesa, nas suas diversas expressões. Criticam-se, e com razão, as correntes sociais, políticas e culturais que desejam fechar as religiões nas respectivas sacristias. Mas seria lamentável que as sacristias amuassem ao ver essa literatura religiosa estudada e debatida com toda a liberdade, no espaço público.

Herculano Alves reuniu, numa obra muito útil, os Documentos da Igreja sobre a Bíblia, desde o ano 160 a 2010[4]. No começo deste ano, foi lançado pela Biblioteca Dominicana o testemunho incontornável de Marie-Joseph Lagrange, O.P., sobre os tormentos que sofreu do Vaticano e das invejas eclesiásticas organizadas para impedir as inovadoras investigações e publicações científicas da Escola Bíblica de Jerusalém, nos finais do século XIX e nos primeiros 30 anos do século XX[5]. Quem comparar a miséria cultural dessa situação com o documento da Comissão Pontifícia Bíblica, de 15 de Abril de 1993[6], pode ter a impressão de que não pertencem à mesma Igreja.

Não reconhecer a importância de colocar a Bíblia no espaço público, segundo as exigências culturais do nosso tempo, só pode alimentar a suspeita de que a razão crítica é inimiga da religião, das suas linguagens e das suas práticas.

2. O projecto de Frederico Lourenço, assumido pela Quetzal, não se limita a uma nova tradução do Novo Testamento, do qual já existem várias, de diversos estilos, mas à tradução de toda a Bíblia Grega, judaica e cristã. A Bíblia judaica e a Bíblia hebraica não se identificam, como se a grega não fosse, também, judaica. A Grega, designada como Septuaginta (LXX), é a primeira tradução da Bíblia[7] e o seu nome designa a tradução da Torah hebraica para o grego, realizada em Alexandria durante o reinado de Ptolomeu II (285-246 a.C).

Segundo a lenda, setenta sábios de Jerusalém, conhecedores do hebraico e do grego, partiram para Alexandria, cidade com grande população judaica, mas onde se falava sobretudo o grego. Cada um tinha o seu quarto particular e a obrigação de traduzir as Escrituras. Começaram todos ao mesmo tempo e terminaram todos ao fim de setenta dias. Ao conferi-las, verificaram que todos tinham traduzido da mesma maneira. Para lenda e milagre não está mal.

A dita versão constituiu um acontecimento cultural sem precedentes e a iniciativa literária mais importante para os anais da civilização. Pela primeira vez, a sabedoria de Israel passava de uma língua semita para outra indo-europeia e, por aí, ao mundo ocidental.

3. Quando, séculos mais tarde, a LXX foi adoptada pelas primeiras comunidades cristãs, como a Bíblia oficial, acompanhou a expansão do cristianismo, tanto no Oriente como no Ocidente.

A partir do séc. V d. C., a LXX foi destronada, no Ocidente, pela tradução de S. Jerónimo para latim, denominada a Vulgata. Esta versão dominou a cultura ocidental durante a Idade Média. Foi declarada como autêntica, isto é, fiável em matéria de fé e costumes, pelo Concílio de Trento (1546). Na Igreja Ortodoxa, a Bíblia grega manteve-se como Bíblia oficial ou canónica até aos nossos dias.

Outro foi o rumo das traduções da Bíblia na Reforma. Espero que, entre nós, o nome de Lutero tenha deixado de ser considerado um insulto.

09.04.2017



[1] Cadmo 25 (2016) 101-113. Cf. também de José Augusto Ramos, Traduções Portuguesas da Bíblia Transversalidades Linguístico-Culturais em Tarefas de Hoje, GAUDIUM SCIENDI, Nº 3, JANEIRO 2012, pp 124-146
[2] Entre 1898 e 2012 atingiu 28 edições.
[3]  Cf. José Augusto Ramos (Cadmo 25 (2016) 101-113); Isaías Hipólito (Brotéria 184 (2017) 205-225.
[4] Documentos da Igreja sobre a Bíblia (160-2010), Difusora Bíblica, 2011.
[5] Marie-Joseph Lagrange, O.P., Recordações Pessoais. O Padre Lagrange ao serviço da Bíblia, Biblioteca Dominicana, Coimbra, Tenacitas, 2017.
[6] A Interpretação da Bíblia na Igreja, S. G. E., Rei dos Livros, 1994.
[7] Cf. Natalio Fernández Marcos, Septuaginta. La Biblia griega de judíos y cristianos,Sígueme, Salamanca 2008.

domingo, 2 de abril de 2017

INOVAR OU REPETIR? Frei Bento Domingues, O.P.


1. Segundo a teologia católica mais corrente, os sacramentos cristãos não são de anjos nem para anjos. A Irmã Lúcia, nas suas Memórias, abalou essa opinião. Contou que, entre Abril e Outubro de 1916, já tinha aparecido um anjo aos três pastorinhos, por três vezes, convidando-os à oração e à penitência. Identificou-se como o “Anjo da Paz, o Anjo de Portugal”. Apresentou-se como ministro da comunhão eucarística sob as duas espécies. Não disse onde as teria ido arranjar.
À distância de um século, é uma poderosa narrativa surrealista, indiferente à disciplina romana, de então, sobre a Eucaristia. Ver aí uma precoce antecipação portuguesa do Concílio Vaticano II que, em 1916, ainda ninguém podia prever, condiz bem com a nossa imaginação delirante, compensatória da frustração de não termos contado para nada no maior acontecimento da Igreja Católica do séc. XX.
Com anjos ou sem anjos, os sacramentos movem-se sempre no mundo simbólico que só fala à inteligência a partir dos sentidos mergulhados nas realidades terrestres mais elementares. Ao se tornarem manifestações rituais e litúrgicas exprimem, em gestos e palavras, a identidade partilhada da fé e a sua transmissão. É a fé subjectiva e manifestada que constitui a alma e o motor de todas as formas da ritualidade cristã. Por tudo isso, petrificar os ritos, considerá-los estáticos e imutáveis é trair a condição incarnacionista do cristianismo. Ritualidade e criatividade não se excluem, exigem-se mutuamente. As celebrações litúrgicas que se limitam, ano após ano, a reproduzir um ritual fixo, tornam-se ritos de sepulcros vazios. Como escreveu S. Tomás de Aquino, a graça não substitui a natureza, não evapora o tempo, a mudança. 
Por enquanto, – aproxima-se a era do pós-humano! - os rituais têm a sua raiz na condição corporal do ser humano e, portanto, na sua composição biogenética, ecológica – natural e cultural – e bio psíquica.[1]


Existem em qualquer sociedade, não são um exclusivo das religiões nem a sua eficácia simbólica está reduzida aos sacramentos cristãos. Não esgotam a liberdade de Deus nem a presença de Cristo na vida humana. Somos nós que precisamos de celebrar a fé, na transformação da nossa história, para nos darmos conta de que o Espírito de Deus actua onde quer, quando quer e como quer, sem nos consultar, mas com gosto de nos associar à sua criatividade. Os gestos e as palavras da liturgia não caíram do céu. No seguimento de Cristo, são responsabilidade de toda a Igreja para estabelecer um vai-e-vem contínuo entre a complexidade da vida pessoal, familiar, profissional, cultural, política e o tempo dedicado à festa da sua reconversão permanente, metamorfose pascal.

Neste sentido, as expressões litúrgicas da Quaresma, têm de evitar dois extremos: não cair no contínuo improviso – algo desumano – nem se reduzirem à eterna repetição do mesmo. As simples exortações moralistas à oração, ao jejum e à esmola não bastam para criar uma nova consciência das nossas alienações nem provocam movimentos de transformação significativa na sociedade e na Igreja.

2. Já me perguntaram, várias vezes, se o pedido de Jesus Cristo, na chamada Última Ceia, repetido em todas as missas – Fazei isto em memória de Mim –, não seria a manifestação de uma grande solidão, de pouca confiança nos discípulos ou até de um certo narcisismo, como o dos grandes líderes ou pessoas ilustres que desejam uma estátua, o nome numa rua ou numa praça?

Se a expressão Fazei isto em memória de Mim manifestasse Jesus preocupado com ele próprio, com o seu futuro na memória do mundo, estaria a renegar-se e em contradição aberta com o que foi o testemunho da sua vida. O que nesse testemunho é indelével é, precisamente, a despreocupação com ele mesmo. A sua causa era o reino de Deus, como alegria do ser humano. Segundo os Actos dos Apóstolos, passou a vida fazendo o bem. Nunca andou a tratar de interesses pessoais, mas da vida que tinha sido negada aos doentes, aos excluídos da sociedade e da religião.

Na noite em que foi traído, deixou aos discípulos o encargo que deve ser o de toda a Igreja e para sempre: não atraiçoeis o que procurámos viver juntos em função do mundo inteiro, a partir dos mais ofendidos.

3. Um belo poema de Eugénio de Andrade termina assim: Eu sei: tu querias durar. / (…) Paciência, querido, também Mozart morreu./ Só a morte é imortal.

O tema deste Domingo é a ressurreição de Lázaro[ii]. A longa narrativa do quarto Evangelho mostra, pelo contrário, que também a morte é mortal. Diante do túmulo, Jesus gritou em voz alta: Lázaro sai cá para fora! O morto saiu, com os pés e as mãos enfaixados e o rosto recoberto por um sudário. Jesus disse-lhes: Desatai-o e deixai-o andar.

Surge, aqui, um novo paradoxo: a partir desse dia, o Sinédrio resolveu matar Jesus, que teve de passar à clandestinidade. Os sumos sacerdotes e os fariseus tinham, por isso, ordenado que quem soubesse onde Jesus estava, o indicasse, para que o prendessem.

O Sumo Sacerdote daquele ano tinha encerrado toda a discussão com a sentença radical: acaba-se com esse homem e fica salva a nação. Sem querer, comenta o narrador, Caifaz “ profetizou que Jesus iria morrer pela nação – e não só pela nação, mas também para congregar, na unidade, todos os filhos de Deus dispersos.”

Temos, aqui, uma extraordinária descrição do sentido universal da missão de Jesus Cristo: fazer da vida um dom ao mundo, sem restrições.

Resta a questão que junta os paradoxos da vida e da morte, aos quais nem Jesus escapou e que talvez possa ser formulada assim: qual deve ser hoje o papel inovador dos discípulos de Cristo, de toda a Igreja, de cada um de nós na reunião dos filhos de Deus que se ignoram ou guerreiam por causa da dominação política, económica, étnica, cultural e religiosa?

Conformar-se com o estado actual do mundo é a grande traição que diariamente nos tenta. A resignação é o nosso pecado.

A Quaresma ainda não acabou.



Lisboa, 02.04.2017



[1] Cf. Eddward Schillebeeckx OP, L’économie sacramentelle du salut, Academic Press Fribourg, 2004, pp. 545-573.
[ii] Jo 11, 1-54