1. As
mulheres sabem que são mais de metade da Igreja católica. Dir-se-á que apenas
uma minoria feminista protesta contra o silenciamento que lhes é imposto. Na
Igreja, as mulheres que se calem! Não
foi nenhuma mulher que o disse e quem o afirmou ainda não tinha passado
inteiramente para o Novo Testamento (NT).
Foi apresentado, na UCP, o livro Mulheres diáconos. Passado – Presente –
Futuro[1].
Como refere a Introdução, o livro apresenta três tópicos
interligados: as mulheres diáconos tal como elas são conhecidas através de
documentos históricos; o diaconado, tal como se tornou uma vocação permanente
na Igreja contemporânea e aquilo que o futuro das mulheres diáconos poderia vir
a ser, se a Igreja restabelecesse a sua tradição de ordenar mulheres para o
diaconado. Trata-se de um esforço conjunto que pretende ajudar a Igreja a
recuperar a sua tradição passada como meio de construir o seu futuro.
É sabido que o Papa João
Paulo II († 2005) nada fez para restaurar o diaconado ordenado das mulheres e o
ex-Papa Bento XVI seguiu-lhe o exemplo.
Só em 2016 é que o Papa
Francisco começou a agir, convocando uma Comissão de especialistas, seis homens
e seis mulheres, para enfrentar esta questão. No final, entregaram um relatório ao
Papa Francisco. O principal objectivo da Comissão era estudar as mulheres
diáconos na Igreja primitiva. Não está em dúvida a existência de mulheres
diáconos. A questão gira em torno das suas funções.
No voo de regresso da
viagem apostólica à Bulgária e à Macedónia do Norte (07. 05. 2019), o Papa
revelou, com algum humor, que a comissão trabalhou durante quase dois anos. Eram todos diferentes,
todos «rãs de lagos diferentes», todos pensavam de forma diferente, mas
trabalharam juntos e chegaram a acordo até um certo ponto. Mas, cada um deles
tem a sua própria visão, que não concorda com a dos outros, e pararam aí como
comissão. Cada um está a estudar como prosseguir. Isso é bom! Varietas
delectat.
A
variedade deleita, mas não deve servir para passatempo de diletantes. As mulheres
católicas, na Alemanha, já não suportavam mais conversa vazia e resolveram entrar
em greve. Foi convocada para esta semana, entre sábado passado, dia 11,
e o próximo, dia 18 de Maio. Deixaram lenços brancos nos bancos das Igrejas e, no
exterior, nas praças e nos adros, houve celebrações, partilha, canto, mulheres
vestidas de branco.
Com todas as cautelas eclesiásticas, o porta-voz da
Conferência Episcopal Alemã, Mathias Kopp, em declarações a uma cadeia de TV, em
Roma, já acusou o toque. Veremos o que irão fazer…
Os bispos alemães anunciaram que vão abrir um sínodo de diálogo com
alargada participação de todos e todas, sem temas-tabu. Veremos, como diz o
cego[2].
2. Na história da Igreja, desde o NT, há sempre que investigar,
mas não é preciso esperar o fim do mundo para decidir. S. Paulo esperava-o para
muito breve. As comunidades cristãs, na sua variedade, sentiram que este mundo
é o lugar de testemunhar e seguir o caminho aberto por Jesus de Nazaré. Daí
surgiram as narrativas de S. Marcos, S. Mateus, S. Lucas e S. João. São
razoavelmente diferentes, reflectindo situações diversas, mas todas com o mesmo
objectivo: o seguimento criativo de Jesus
em todas as situações da vida.
Quando,
na Eucaristia, se diz Fazei isto em
memória de Mim, não é porque Jesus tivesse receio de ser esquecido.
Significa, pelo contrário, continuai o
Evangelho. O Pentecostes indica, precisamente, não fiqueis a olhar para o ar, ide por todo o mundo e inventai o futuro
na linha inaugurada pelo Nazareno, porque o espírito dele e o dos discípulos é
o mesmo, igualmente criativo.
Quando,
hoje, se discute o lugar das mulheres, na Igreja católica, o que é preciso ter
em conta, em primeiro lugar, é a criatividade de Jesus. Para isso é necessário
pensar na situação social e religiosa da mulher, quando Ele entra em acção. A
expressão usada pelas narrativas evangélicas, nos momentos solenes, dizia tudo
em poucas palavras: não contando mulheres
e crianças. Estavam lá, mas não contavam. O facto de não falarem delas, na
chamada Última Ceia, não significa,
necessariamente, que não tivessem participado. Naquela cultura, elas não
contavam. Diz-se, por outro lado, que nunca são chamadas discípulas, no
entanto, o vocabulário da realidade do discipulado é-lhes aplicado, muito mais
do que aos homens. No Evangelho de Marcos é dito que junto da cruz “também ali
estavam algumas mulheres a contemplar de longe, entre elas, Maria de Magdala,
Maria, mãe de Tiago Menor e de José, e Salomé, que o seguiam e serviam quando ele estava na Galileia; e muitas outras
que tinha subido com Ele a Jerusalém”[3].
3. Seguir e servir
é o vocabulário dos discípulos, dos Doze: “Nós seguimos-te”[4].
Implicava deslocar-se com o mestre nas tarefas da evangelização, algo
impensável na sociedade em que Jesus cresceu. Quando Marcos diz que as
mulheres, que estavam ao pé da cruz, seguiam
Jesus, é porque faziam parte do grupo itinerante dos seus discípulos.
Seguiram-no desde a Galileia até Jerusalém. Não para executar as tarefas
tradicionalmente atribuídas às mulheres, mas para entrarem na sua escola,
acolhendo os seus ensinamentos. Elas não podiam estudar a Palavra de Deus. Alguns
rabinos diziam que era preferível queimar o livro da Lei a entregá-lo à guarda
de uma mulher; quem ensina a Lei à sua filha, ensina-lhe obscenidades; todos os
males que existem no mundo entram pelo tempo que os homens perdem a falar com
as mulheres[5].
No Evangelho de Lucas,
afirma-se que “Jesus ia de cidade em cidade, de aldeia em aldeia, proclamando e
anunciando a Boa-Nova do reino de Deus, acompanhavam-no os Doze e algumas mulheres que tinham sido curadas de espíritos
malignos e enfermidade: Maria, chamada Madalena, da qual tinham saído sete
demónios; Joana, mulher de Cuza, administrador de Herodes; Susana, e muitas
outras, que os serviam com os seus bens”[6].
Note-se como o evangelista coloca os Doze e as mulheres num mesmo nível, uma
vez que une os dois grupos com a conjunção “e”, que serve para os igualar.
Isto sem falar que, quem
evangelizou os Doze, depois da sua traição e da Ressurreição de Cristo, foram
as mulheres, a começar por Maria Madalena, segundo os quatro evangelistas[7].
Quando, hoje, se estuda a
história para saber o lugar das mulheres na Igreja, esquece-se o essencial: a
revolução de Jesus, a memória da sua intervenção que, ainda hoje, entendemos
mal.
19. Maio. 2019
[1] Gary Macy, William T.
Ditewig, Phyllis Zagano, Mulheres diáconos. Passado – Presente
– Futuro, Paulinas
Editora, 2019.
[2]
Cf. 7Margens, 14.05.2019
[3]
Mc 15, 40-41
[4]
Mc 10, 28
[5]
Cf. Ariel Álvarez Valdés, Jesus teve
discípulas mulheres, in Bíblica
382 (Maio-Junho 2019), 387-392.
[6]
Lc 8, 1-3
[7]
Cf. A. Cunha de Oliveira, Jesus de Nazaré
e as mulheres, Instituto Açoriano de Cultura, Angra do Heroísmo, 2011; José
António Pagola, Jesus. Uma abordagem histórica,
Gráfica de Coimbra, 2008, cap. 8 Amigo
da Mulher
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