Muitos baptismos!
Marcos 1,7-11: "Tu és o meu Filho, o Amado".
A
Festa do Batismo do Senhor é como que uma ponte entre as festividades
do Natal e o Tempo Comum do ano litúrgico. Por um lado, conclui o tempo
do Natal e as suas "epifanias", isto é, as manifestações aos pastores
(os pobres), ao velho Simeão e à profetisa Ana (representando o povo de
Israel fiel que esperava o Messias) e aos Magos (representando os povos
pagãos); por outro lado, entramos no Tempo Comum, do qual esta festa é o
primeiro domingo. De facto, a festa do Batismo celebra uma das três
manifestações do Senhor que, nos primeiros séculos, estavam incluídas na
festa da Epifania: a vinda dos Magos, o batismo de Jesus e as bodas de
Caná. Passamos de um Jesus bebé de menos de dois anos para um Jesus
adulto de trinta anos.
1. O significado profundo do batismo do Senhor
Hoje,
habituados a ouvi-lo, não nos damos conta do escândalo que foi para os
primeiros cristãos o facto de Jesus, aquele que não tinha pecado, ter
começado a sua missão como discípulo de João Batista, sendo batizado por
ele nas águas do Jordão.
Porque
é que Jesus se deixou batizar? Três razões podem ser apontadas. A
primeira: Jesus está "lá" onde percebe que Deus está a agir. É por isso
que, ouvindo os ecos da voz do Batista, deixa Nazaré e vai para
"Betânia, além do Jordão, onde João baptizava" (João 1,28).
Porque
é que Jesus foi batizado? Três razões podem ser apontadas. A primeira:
Jesus está "lá" onde percebe que Deus está a agir. É por isso que,
ouvindo os ecos da voz do Batista, deixa Nazaré e vai para "Betânia,
além do Jordão, onde João baptizava" (João 1,28). Segundo: Jesus chega
não como um privilegiado, mas em solidariedade com os seus irmãos.
Terceiro: Jesus, desde o início da sua missão, manifesta a sua opção de
estar entre os pecadores, até ao ponto de ser considerado um deles e
morrer entre dois malfeitores.
O
episódio do batismo de Jesus é de uma importância singular, um ponto de
viragem na vida do Senhor, tanto que no evangelho de Marcos, o primeiro
dos evangelhos, constitui o início da sua missão: "Início do evangelho
de Jesus Cristo, Filho de Deus" (1,1). (É como se) o que aconteceu antes
não tenha importância. É "hoje" que o Messias se apresenta na cena
mundial. "Hoje" ele é ungido como o "Cristo" ("o ungido") do Senhor.
"Hoje" Jesus toma consciência - humanamente falando - da sua missão.
"Hoje", poderíamos dizer, "nasceu para nós o Salvador, que é Cristo
Senhor" (cf. Lc 2,11), segundo o que diz o salmista: "Tu és meu filho,
eu hoje te gerei" (Sal 2,7).
O
relato de Marcos, na sua essencialidade e aparente simplicidade, é de
grande significado, porque nos apresenta Jesus numa "epifania"
trinitária. Hoje, de certa forma, é a epifania da Santíssima Trindade.
Os céus estão a abrir-se, depois de séculos sem profetas, durante os
quais os céus pareciam estar fechados, e Deus responde finalmente à
súplica do seu povo: "Ah, se rasgasses os céus e descesses! (Isaías
63,16-17).
Hoje,
festa do Batismo do Senhor, festa do seu "nascimento" pela investidura
messiânica, é também a festa do nosso batismo. Hoje, os céus rasgam-se
para nós, o Espírito vem habitar os nossos corações, e o Pai faz ouvir a
sua voz, dizendo a cada um de nós: "Tu és o meu Filho, o Amado!"; "Tu
és a minha Filha, a Amada!
2. Três testemunhas, três baptismos
"Três
são os que dão testemunho: o Espírito, a água e o sangue, e estes três
concordam" (segunda leitura, 1 João 5,1-9). Três testemunhas
concordantes que dão testemunho do amor de Deus por nós! Três
testemunhos que provêm de três "baptismos": o da água ("Eu baptizei-vos
com água..."), o do Espírito ("Ele batizar-vos-á no Espírito Santo") e o
do sangue ("Tenho um batismo no qual serei batizado, e como estou angustiado até que ele se realize!",
Lucas 12,50). Mas é o Espírito Santo que une e torna uno e verdadeiro
este "tríplice batismo": "E é o Espírito que dá testemunho, porque o
Espírito é a verdade. Sem o Espírito, o batismo na água não passa de um
batismo de João, uma mera expressão do nosso desejo de renascimento. Sem
o Espírito, o "batismo de sangue", o do martírio, do testemunho, não é
possível. Sem o Espírito, não nasceríamos de novo e estaríamos ainda sob
o domínio da Lei.
3. Os muitos "baptismos
Há
algumas décadas falava-se de "cristãos anónimos", expressão criada pelo
grande teólogo Karl Rahner (+1984) para designar aqueles que são salvos
pela graça de Cristo, mesmo estando fora da comunidade cristã (cf. LG
16 e GS 22). Hoje, infelizmente, poderíamos falar de cristãos que se
tornaram "anónimos", porque perderam o seu nome de "cristãos" e já não
se lembram do "Nome" em que foram baptizados. Isto deve-se a uma fé
adormecida e não vivida, à indiferença ou mesmo à apostasia. Deus queira
que o Nome do Cordeiro que levamos na nossa testa (ver Apocalipse 14:1)
nunca seja substituído pelo número massificador da "besta"! (ver
Apocalipse 13,12-18).
Na
realidade, a humanidade não está dividida entre crentes e não crentes,
mas entre crentes e idólatras. Tal como Paulo questionou em Éfeso doze
seguidores do Baptista, também nós poderíamos ser questionados: "Que
batismo recebestes?" (Actos dos Apóstolos 19:3). Sim, porque todos nós
somos "baptizados", isto é, "mergulhados" (etimologicamente, baptismo
significa imersão!) na realidade onde acreditamos encontrar a vida, a
felicidade, o sentido da existência. Alguns são baptizados/imersos no
Oceano infinito do Amor de Deus, onde correm os mil rios de amor, nas
suas diferentes expressões de solidariedade, compaixão, justiça,
doação.... Outros, pelo contrário, arriscam-se a viver
baptizados/imersos no mar poluído dos negócios, do dinheiro, da
injustiça do egoísmo... Que batismo recebeste?
4. A que fonte sacias a tua sede?
A água-viva em que fomos regenerados torna-se também a fonte à qual voltamos para saciar a nossa sede: "Ó povo sedento, vinde à água!" (primeira leitura, Isaías 55,1-11). O nosso batismo é uma fonte de frescura, de juventude, de alegria. "Tiraremos com alegria das fontes da salvação!",
proclama o refrão do hino escolhido como salmo responsorial (Isaías
12,1-6). Infelizmente, porém, muitas vezes saciamos a nossa sede em
fontes envenenadas.
Apresento-vos uma história, lida não me lembro onde.
Numa
certa aldeia, aconteceu que a fonte onde as pessoas iam buscar água,
por qualquer razão, ficou contaminada e, sem que as pessoas se
apercebessem, todos começaram a ficar loucos. Então, Deus disse a um
santo eremita que fosse à aldeia avisar toda a gente que a fonte no meio
da praça estava envenenada e os estava a enlouquecer a todos. Mas os
seus companheiros de aldeia não lhe deram qualquer crédito e começaram a
troçar dele: "Então, segundo o senhor, todos nós somos loucos e o
senhor é o único sensato! E quanto mais ele os alertava, mais eles
zombavam dele. A certa altura, as autoridades da aldeia consideraram que
o eremita era um perigo para todos e decidiram condená-lo à morte. Na
iminência de ser morto, o eremita exprime um último desejo: beber água
da fonte! Como um último desejo nunca é recusado, trouxeram-lhe a água. O
eremita bebeu e - oh prodígio! - começou a raciocinar como eles.
Considerando-o "curado", pouparam-lhe a vida!
Quem tem ouvidos para ouvir, que ouça!
Exercício espiritual da semana
1) Começa o teu dia mergulhando, de cada vez, nas águas regeneradoras do teu batismo, através do sinal da cruz.
2) Abrir a Bíblia e meditar o texto da primeira leitura: Isaías 55,1-11.
P. Manuel João Pereira Correia
Castel d'Azzano (Verona)
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