domingo, 22 de dezembro de 2024

BOAS FESTAS Frei Bento Domingues, O.P. 22 Dezembro 2024

 

BOAS FESTAS

Frei Bento Domingues, O.P.

22 Dezembro 2024

 

1. Entre as muitas festas do Cristianismo, destacam-se duas que se implicam mutuamente: a Páscoa e o Natal. A Páscoa proclama que o Cristianismo, apesar de todas as crises e de todas as negações, não está morto como muitos pretendem. O Natal é a festa das famílias. Por mais que se diga que a família está em crise, nada a pode substituir. É a festa de todas as idades porque todas as idades se referem ao nascimento. Enquanto houver nascimento, há esperança de futuro. Os cristãos das diferentes igrejas, nos diferentes países, celebram o Natal de Jesus Cristo, pois não se descobriu nenhum ser humano que fosse tão humano como Ele. O Menino que nos foi dado é a Incarnação de Deus, revelando simultaneamente a envergadura infinita a que está chamado qualquer ser humano.

A vida de Jesus – observa Tomás Halík –, se lermos cuidadosamente os Evangelhos, não é nenhum conto de fadas idílico com um final feliz. Começa num curral e termina no cadafalso. Só depois vem a Ressurreição. A Ressurreição não é nenhuma reanimação mágica de um cadáver e um regresso a este mundo na sua forma anterior, mas sim uma completa transformação.

Precisamos de uma fé madura – uma fé para o mundo de Herodes e Pilatos, onde Jesus nasceu, uma fé para um mundo de Putins e de assassinos em massa que assaltam todos os continentes[1].

A celebração do Natal, apesar de todas as semelhanças, é diferente em cada ano. O Papa Francisco mostrou que continua empenhado em fazer renascer a Igreja, em todas as suas dimensões, como uma Igreja de saída, virada para as periferias existenciais.

O Sínodo é o grande Advento da esperança que se estendeu durante 3 anos (2021-2024). O Papa Francisco não fez o Sínodo, mas realizou gestos, fez viagens que não produziram apenas declarações. Não podemos, no entanto, esquecer a sua voz durante o período de preparação do Sínodo. Não quis substituir-se à Igreja, mas tornou-se a voz mais ouvida da Igreja em processo de reforma. Por outro lado, foi uma pessoa muito activa. Não se tornou neutro nem abstémio do que está a acontecer.

Como diz o Cardeal Timothy Radcliffe, O.P., o título deste Sínodo poderá sugerir introversão, uma Igreja voltada para si mesma. No entanto, trata-se do maior exercício de escuta do mundo, na história do Cristianismo.

O objectivo desta consulta não era “produzir documentos, mas abrir horizontes de esperança para o cumprimento da missão da Igreja”. Esta esperança não diz apenas respeito à Igreja Católica, mas a todos os cristãos, aliás, a toda a Humanidade. Parece que estamos a entrar numa nova época de guerra, violência e pobreza, vivendo sob a sombra da catástrofe iminente das alterações climáticas, num mundo em que os jovens têm de, frequentemente, esforçar-se muitíssimo para sonhar com um futuro[2].

Muitas das ideias, hoje dominantes, são de morte, são incitamentos a matar. Ora, a essência do Cristianismo é a apologia da vida e de vida em abundância. O que se tem andado a fazer são destruições.

Os cristãos, mesmo neste tempo de destruições, temos de garantir o futuro da Natureza, dos seres humanos. Não devemos desistir perante as guerras porque na raiz do Natal há futuro.

Há 2 000 anos, Pedro tentou impedir Jesus de ir a Jerusalém porque esse era um caminho e um destino ameaçados e, para ele, não fazia sentido. Depois, descobriu-se o sentido trágico dessa aventura. Hoje, vivemos a esperança dentro da escuridão do nosso tempo.  Não é optimismo, mas a confiança de que tudo o que vivemos, toda a nossa confusão e dor, se descobrirá de alguma forma que tem sentido[3].

2. Deu-se a passagem do sínodo dos bispos para o sínodo de toda a Igreja. O que é que isto significa? Significa um salto e é importante ver quais são as suas expressões e o que há de novo. Não são só os bispos que têm direito a voz e a voto, mas também um grupo alargado de leigos – mulheres e homens – com direito a voz e a voto. Isto pede à Igreja iniciativas que diziam que os problemas de toda a Igreja são os nossos problemas. Cada “igreja local” foi convocada a entrar na vivência do Sínodo sob o signo da comunhão, participação e missão, segundo a fórmula consagrada.

Desde o momento em que foi promulgado até ao Documento final passaram-se 3 anos, numa diversidade que só a leitura do Documento Final pode exprimir. E isto implica saber que os 355 membros do Sínodo votaram, por voto secreto, cada um dos 155 parágrafos do documento, em que se reflectem as conclusões sobre questões como o papel da mulher, a descentralização da autoridade da Igreja, a denúncia do clericalismo e uma maior participação dos leigos na tomada de decisões.

3. A realização deste Sínodo foi extraordinária como início do que deve continuar. Foi precedida por um acontecimento ecuménico singular, alma de todo o diálogo humano. A 4 de Fevereiro de 2019, o Papa Francisco e o Grande Imame de Al-Azhar, Ahmad Al-Tayyeb, assinaram o documento Fraternidade Humana em prol da paz mundial e da convivência comum, em Abu Dabhi. É este o horizonte do verdadeiro ecumenismo.

Os textos do Sínodo não existem para substituir os textos do Novo Testamento (NT), mas para o situar no mundo contemporâneo, contexto em que devem ser lidos e praticados.

Para S. Lucas, os pobres escutam os anjos e vão ao encontro de Jesus: Não temais, eis que vos anuncio uma grande alegria e esta grande alegria é para todo o povo! Reconhecê-lo-eis assim: um recém-nascido envolto em panos e deitado numa manjedoura[4]. A versão de S. Mateus é diferente: Tendo Jesus nascido em  Belém da Judeia, no tempo do rei Herodes, eis que vieram os magos do Oriente a Jerusalém, perguntando; Onde está o rei dos judeus, recém-nascido? Com efeito, vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo[5].

A leitura das narrativas do NT é fundamental. São elas a referência do insubstituível – Jesus Cristo – para que não seja esquecido em nenhum tempo nem em nenhum lugar. São, de facto, peças de uma beleza inconfundível. Sem essas narrativas, como conhecer a Criança que é semente do futuro da Humanidade?

A festa do nascimento de Jesus de Nazaré é a possibilidade do nosso contínuo renascimento. A grande noite de Natal depende de nós, e só de nós, para que nada continue na mesma e que tudo comece. Se não pertencemos ao povo dos pobres, resta-nos a solução dos magos: partir pela noite, fugir à segurança e, depois de termos visto a Força de Deus desencadeada numa criança que está à mercê de todos, voltar por outro caminho[6].

O outro caminho começou a ficar desenhado no passado mês de Outubro, nos trabalhos do Sínodo.

 

 



[1] Cf. Tomás Halík, O Sonho de uma nova Manhã. Cartas ao Papa, Paulinas 2024, p. 149

[2] Cf. Timothy Radcliffe, Escutai-o! Para uma espiritualidade sinodal, Paulinas 2024, pág. 7

[3] Cf. Ibidem, pág. 17

[4] Cf. Lc 1 – 3: as narrativas do Nascimento de Jesus, suportada pela história da humanidade – genealogia até Adão

[5] Cf. Mt 1 – 2: as narrativas do Nascimento de Jesus, suportada pela história do povo em que nasceu – genealogia até Abraão

[6] Cf. Jean Cardonnel, O,P., O Evangelho e o Mundo Novo, Livraria Figueirinhas, 1966, pp. 61-66

Jesus, figura determinante Anselmo Borges Padre e professor de Filosofia 22 Dezembro 2024

 Jesus, figura determinante

Anselmo Borges
Padre e professor de Filosofia

22 Dezembro 2024

Numa troca célebre de cartas entre o cardeal Carlo Martini, arcebispo de Milão, aquele que
afirmou que a Igreja anda atrasada pelo menos 200 anos, e o agnóstico Umberto Eco,
publicadas com o título “Em que crê quem não crê”, este escreveu: Mesmo que Cristo fosse
apenas o tema de um grande conto, “o facto de esse conto ter podido ser imaginado e
querido por bípedes implumes, que só sabem que não sabem, seria miraculoso
(miraculosamente misterioso)”. O Homem teve, a dada altura, “a força religiosa, moral e
poética, de conceber o modelo de Cristo, do amor universal, do perdão aos inimigos, da vida
oferecida em holocausto pela salvação dos outros. Se fosse um viajante proveniente de
galáxias longínquas e me encontrasse com uma espécie que soube propor-se este modelo,
admiraria, subjugado, tanta energia teogónica, e julgaria esta espécie miserável e infame,
que cometeu tantos horrores, redimida pelo simples facto de ter conseguido desejar e crer
que tudo isto é a Verdade”.

Ouço falar no Natal pelo menos desde Agosto. Parece impossível, porque só se pensa em
compras, esquecendo o essencial, que é o nascimento de Jesus. Não quereria ser tão
pessimista, mas é possível que o famoso teólogo José I. González Faus tenha razão: “O que se
celebra hoje no Ocidente a cada 25 de Dezembro é o nascimento do messias Consumo, filho
único do deus Dinheiro. O que os cristãos celebramos no Natal é o nascimento de um
Messias ‘pobre e humilde’, filho único do Deus Amor. Ambos são absolutamente
incompatíveis.”

Evidentemente, o Natal implica festa e alegria, o Natal é talvez a grande festa da família, mas
não se pode esquecer o essencial, determinante. Seria uma perda incomensurável ignorar ou
esquecer que o Natal está vinculado ao nascimento de Jesus. Ele representa, na História, a
maior revolução, como reconheceram grandes pensadores como Hegel, Ernst Bloch, Jürgen
Habermas... Foi através dele que soubemos da dignidade inviolável de cada pessoa. Jesus
revelou que Deus é bom, Pai/ Mãe de todos os homens e mulheres e quer a alegria, a
felicidade, a realização plena de todos como seus filhos e filhas, a começar pelos mais frágeis
e abandonados. É aqui que assenta, em última análise, a fraternidade humana.

Jesus Cristo é figura “decisiva, determinante” da História da Humanidade. Quem o disse foi
um dos grandes filósofos do século XX, Karl Jaspers. Hegel afirmou que foi pelo cristianismo
que se tomou consciência de que todos são livres. Ernst Bloch, o ateu religioso, escreveu que
é ao cristianismo que se deve que nenhum ser humano pode ser tratado como “gado”.
Jürgen Habermas, o maior filósofo felizmente ainda vivo, da Escola Crítica de Frankfurt,
agnóstico, afirma que a democracia, com “um homem, um voto”, é a transposição para a
política da afirmação cristã de que Deus se relaciona pessoalmente com cada homem e cada
mulher. Frederico Lourenço, o grande especialista em literatura clássica e bíblica, agnóstico,
escreve: “Não tenho nenhum problema em afirmar que, pessoalmente, considero Jesus de
Nazaré a figura mais admirável de toda a História da Humanidade.” Jesus foi “o homem mais
extraordinário que alguma vez viveu.”

Mahatma Gandhi deixou estas palavras: Jesus “foi um dos maiores mestres da Humanidade.
Não sei de ninguém que tenha feito mais pela Humanidade do que Jesus.” Mas acrescentou:
“O problema está em vós, os cristãos, pois não viveis em conformidade com o que ensinais.”
Bom Natal!

Escreve de acordo com a antiga ortografia

sábado, 21 de dezembro de 2024

A Visitação e a cultura do encontro - Pe.Manuel João - MC

 A Visitação e a cultura do encontro


Ano C – Advento – 4.º domingo
Lucas 1,39-45: “Maria levantou-se e partiu apressadamente...”


Chegámos ao último domingo do Advento. O Natal do Senhor está próximo, e a espera do seu advento cresce no coração de cada cristão. A antífona de entrada da Eucaristia proclama: “Destilai, ó céus, do alto, e que as nuvens chovam o Justo; que a terra se abra e faça brotar o Salvador” (cf. Is 45,8). O nosso olhar dirige-se para o Céu, na expectativa do dom de Deus, e simultaneamente para a terra, fecundada pelo Céu, para reconhecer os sinais do “rebento que brota do tronco de Jessé” (Isaías 11,1).

Maria é a figura central do quarto domingo do Advento. O Evangelho narra o episódio da Visitação. Após saber pelo anjo que sua parente Isabel estava grávida de seis meses, Maria “levantou-se e partiu apressadamente para a região montanhosa, a uma cidade de Judá”. A tradição identifica esta cidade como Ain Karim, a cerca de 130 km de Nazaré.

O que levou Maria a “levantar-se e partir apressadamente” para junto de Isabel? Normalmente, dizemos que queria ajudar a sua parente idosa. Ou pode ter desejado partilhar a alegria da gravidez de Isabel, aquela que “era chamada estéril” (Lc 1,36). É provável também que Maria sentisse necessidade de confiar a Isabel o mistério da sua maternidade. Quem, melhor do que Isabel, a poderia compreender?

Contudo, a intenção de São Lucas vai além destas considerações. Ele recorda a transferência da Arca da Aliança para Jerusalém (cf. 2Samuel 6 e 1Crónicas 16). Maria é apresentada como a Arca da Nova Aliança, o Tabernáculo vivo que traz no seu seio o Filho de Deus.

A cena da Visitação faz pensar também numa pequena “pentecostes”. De facto, “logo que Isabel ouviu a saudação de Maria, o menino exultou no seu ventre” (Lc 1,41). Nesse momento cumpre-se a promessa do anjo a Zacarias: João “será cheio do Espírito Santo ainda no ventre da sua mãe” (Lc 1,15).

Além disso, o Espírito Santo, descido sobre Isabel, oferece a Maria uma surpresa inesperada. “Isabel ficou cheia do Espírito Santo e exclamou em voz alta: ‘Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre!’” (Lc 1,41-42). Antes mesmo que Maria diga algo a Isabel, é esta última, movida pelo Espírito Santo, quem confirma o mistério que se cumpre nela. Perante esta revelação, Maria explode de alegria, gratidão e louvor no cântico do Magnificat.

Pontos de reflexão

O relato da Visitação é um tesouro repleto de mensagens a recolher e meditar. Indicamos três.

A Visitação, ícone do encontro
A relação com o outro é uma dimensão essencial da vida humana. O encontro entre estas duas mulheres, uma jovem e uma idosa, revela a beleza de todo o encontro autêntico, aberto à amizade e à partilha. Entre Maria e Isabel dá-se o abraço de comunhão entre a Nova e a Primeira Aliança. É um encontro fecundo, em que ambas as mulheres são enriquecidas.
Hoje, falta-nos uma verdadeira cultura do encontro. Infelizmente, muitas vezes prevalece o confronto, em que o outro é demonizado. O cristão contempla, nestas duas mulheres, a sua vocação de ir ao encontro dos outros com uma atitude de abertura e empatia. Abençoados por Deus, somos portadores de bênção. Se trazemos o Espírito no coração, nem sequer uma simples saudação ou um sorriso são gestos banais.

Maria grávida, ícone da Igreja e do cristão
A mulher “grávida, que gritava com dores de parto” mencionada no Apocalipse (capítulo 12) é uma figuração de Maria, uma imagem da Igreja e, de certo modo, também do cristão. Orígenes de Alexandria, que viveu no século III, utiliza esta imagem de extraordinária intensidade para descrever a vocação do cristão: a de uma mulher grávida.
“O cristão passa pelo mundo grávido de Deus, ferens Verbum (Orígenes), trazendo outra vida dentro da sua vida, aprendendo a respirar com o sopro de Deus, a sentir com os sentimentos de Cristo, como se tivesse dois corações: o seu e um com uma batida mais forte, que nunca mais cessará. Ainda agora Deus procura mães, para se encarnar” (Ermes Ronchi).
Mas estamos nós realmente “grávidos de Cristo” pela escuta da sua Palavra? Poderá acontecer-nos também a experiência descrita por Isaías: “Concebemos, sentimos as dores como se fôssemos dar à luz: era apenas vento; não trouxemos salvação à terra, e não nasceram habitantes no mundo” (Isaías 26,18).

A Visitação, ícone da missão

Por fim, a Visitação pode representar um ícone eloquente da missão. O missionário, ou o cristão, não é o verdadeiro precursor de Cristo nos lugares ou âmbitos para onde é enviado a evangelizar. O verdadeiro precursor é o Espírito, que atua desde sempre no coração de cada pessoa, de cada cultura e de cada povo. A missão não consiste apenas em evangelizar, mas também em deixar-se evangelizar através do encontro com o outro.
Christian De Chergé, prior da Abadia de Tibhirine, assassinado juntamente com outros seis monges trapistas na Argélia em maio de 1996, exprimia esta ideia de forma incisiva. Em 1977 escrevia: “Nos últimos tempos, convenci-me de que o episódio da Visitação é o verdadeiro lugar teológico e escritural da missão, no respeito pelo outro que o Espírito já investiu”. Assim, podemos dizer que Deus nos espera no outro!

Como Maria, levantemo-nos e caminhemos apressadamente ao encontro do Senhor que vem!

P. Manuel João Pereira Correia, mccj

 

 

 

Advento, a estação da alegria Ano C – Advento – 3º Domingo Lucas 3,10-18: “E nós, que devemos fazer?” O terceiro domingo do Advento é chamado de “domingo Gaudete”, pela primeira palavra que abre a celebração: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Novamente vos digo: alegrai-vos. Seja de todos conhecida a vossa bondade. O Senhor está próximo” (antífona de entrada, cf. Fl 4,4-5). No ambiente penitencial que caracteriza o tempo do Advento, este domingo traz-nos um convite especial à alegria. O caminho do Advento é um percurso guiado. A liturgia propõe-nos três guias: o profeta Isaías, João Batista e a Virgem Maria. São três “pedagogos” que se alternam à medida que nos aproximamos do Natal. Isaías é o profeta messiânico por excelência, porque anuncia a chegada do Messias. Ele é quem alimenta a esperança. João Batista, por sua vez, chama-nos à conversão para nos prepararmos para a chegada do Messias. Por fim, a Virgem Maria ensina-nos como acolhê-lo: concebendo-o no nosso coração. A liturgia coloca no centro do segundo e terceiro domingo do Advento a figura de João Batista, segundo a narração de São Lucas, o evangelho que nos guiará durante este ano litúrgico "C". João faz ecoar no deserto o grito do profeta Isaías: “Voz de quem clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor!” (Lucas 3,1-6, segundo domingo). O trecho do Evangelho deste terceiro domingo apresenta-nos a reação das multidões à sua pregação: “Que devemos fazer?” Gostaria de desenvolver a minha reflexão em torno de duas palavras que encerram a mensagem deste domingo: Alegria e Conversão. À primeira vista, alegria e conversão podem parecer distantes, mas, refletindo bem, descobrimos que se harmonizam perfeitamente. A alegria brota da conversão (como mostram as parábolas da misericórdia em Lucas 15) e, ao mesmo tempo, a conversão nasce da alegria (como acontece na história de Zaqueu, em Lucas 19,8). A ALEGRIA que dá sabor à vida! Este terceiro domingo – como dissemos – caracteriza-se por um convite forte, convicto e decidido a alegrar-nos, porque o Senhor está próximo. Na primeira leitura, o profeta Sofonias exorta insistentemente o povo de Deus a alegrar-se: “Clama jubilosamente, filha de Sião; solta brados de alegria, Israel. Exulta, rejubila de todo o coração, filha de Jerusalém... Não temas, Sião, não desfaleçam as tuas mãos. O Senhor teu Deus está no meio de ti, como poderoso salvador”. Também nós temos uma extrema necessidade de ser encorajados, sobretudo num contexto marcado por um pessimismo generalizado quanto ao futuro. O Salmo responsorial retoma um texto de Isaías que nos convida a expressar a alegria em canto: “Entoai cânticos de alegria, habitantes de Sião, porque é grande no meio de vós o Santo de Israel.” Na segunda leitura, São Paulo reforça com vigor o convite à alegria: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Novamente vos digo: alegrai-vos. Seja de todos conhecida a vossa bondade. O Senhor está próximo!” Se olharmos à nossa volta, há bem pouco com que nos alegrarmos, presos como estamos numa rede cada vez mais intrincada de problemas e ameaças à vida. Qual é, pois, a alegria do cristão? Certamente não é uma alegria despreocupada ou barulhenta. Este tipo de alegria é superficial e efêmero, muitas vezes esconde um vazio interior e age como um sedativo. A alegria do cristão nasce de uma experiência única: a proximidade de Deus, sentir-se amado, saber que o Senhor está no meio de nós. “Nós conhecemos e acreditamos no amor que Deus tem por nós. Deus é amor” (1 João 4,16). Em conclusão, o Advento é um tempo propício para redescobrir a fonte da água fresca e abundante da alegria que brota do coração de Deus. A CONVERSÃO que faz florescer a alegria Mas o que dizer de João Batista? Podemos considerá-lo uma testemunha da alegria? A austeridade de sua pessoa e a severidade de sua mensagem não parecem associar-se imediatamente à imagem de um mensageiro de alegria. No entanto, a figura de João não é de modo algum estranha à alegria. Pelo contrário! Ele é um evangelizador, ou seja, um portador de boas e alegres notícias. São Lucas resume a sua pregação afirmando: “João anunciava ao povo a Boa Nova” (Lucas 3,18). João foi o primeiro “evangelizado” pela chegada do Messias, ainda no ventre de sua mãe. Isabel, sua mãe, diz durante a visita de Maria: “Logo que a tua saudação chegou aos meus ouvidos, o menino exultou de alegria no meu ventre” (Lucas 1,44). O próprio João declarará ser o amigo do esposo que “exulta de alegria ao ouvir a voz do esposo”, e concluirá: “Esta minha alegria está completa” (João 3,29). A austeridade e a franqueza de João tornam a sua mensagem ainda mais credível. De facto, as multidões, tocadas pelo seu ensinamento, perguntam-lhe: “Que devemos fazer?”. Até mesmo publicanos e soldados aproximam-se dele para serem batizados, perguntando: “E nós, que devemos fazer?”. A resposta do profeta surpreende-nos por duas razões. Em primeiro lugar, João não faz propostas de caráter “religioso”, como ir ao Templo, rezar ou oferecer sacrifícios. Ele convida, ao invés disso, a praticar ações de justiça social, partilha e respeito pelas pessoas. Além disso, surpreende porque não pede aos publicanos e soldados que abandonem o seu ofício, mas que o exerçam com honestidade. Frequentemente interpretamos a conversão à maneira de Paulo, como a famosa “queda do cavalo”. O Senhor, no entanto, ajusta-se ao nosso passo, caminha ao nosso lado e, com paciência, educa-nos para uma mudança nos nossos estilos de vida. Ele não adota (geralmente!) a estratégia do “tudo ou nada”. Ele conhece bem a nossa fragilidade e o nosso medo de medidas drásticas. No fundo, somos como passarinhos enregelados num dia de inverno, desejosos de um pouco de conforto e de um carinho, mas demasiado receosos para acolher a mão estendida de Deus em nossa direção. “Tem cuidado, Senhor, para não nos pedires demasiado, para não exigires demasiado, para não acreditares demasiado em nós!... Tem cuidado comigo, Senhor, sê calmo e doce, sê paciente comigo e com o meu coração ainda demasiado amedrontado” (Alessandro Deho’). P. Manuel João Pereira Correia, mccj

segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

A mulher na Igreja Anselmo Borges Padre e professor de Filosofia 15 Dezembro 2024

 A mulher na Igreja

Anselmo Borges
Padre e professor de Filosofia

15 Dezembro 2024

Se a verdade é mulher, não teremos razões para suspeitar que todos os filósofos, na
medida em que foram dogmáticos, pouco entenderam de mulheres?” É com estas
palavras que Nietzsche inicia a sua obra Para Além do Bem e do Mal, escrita em Sils-
Maria, 1885.

Esta afirmação aplica-se não só aos filósofos, mas também aos teólogos, e, em geral,
infelizmente, aos dirigentes, por princípio homens, da Igreja Católica.

Embora se não excluam traços maternos em Deus, a Bíblia chama a Deus Pai e não
Mãe. Em primeiro lugar, porque se vivia numa sociedade patriarcal, e, depois, porque
era necessário evitar toda uma linguagem que lembrasse as deusas pagãs da
fertilidade...

É claro que Deus não é sexuado; portanto, chamar-lhe Pai é uma metáfora. Assim,
tanto poderíamos dirigir-nos a ele como a ela, isto é, tanto poderemos chamar-lhe Pai
como Mãe. E acrescento mesmo: o Deus que Jesus anunciou é o Deus bom e os
cristãos deveriam dirigir-se-lhe sempre como Pai e Mãe (Pai/Mãe) - veja-se o famoso
quadro de Rembrandt “O Regresso do Filho Pródigo” e repare-se nas mãos do Pai...

No Credo cristão, referimo-nos a Deus como Pai omnipotente criador do céu e da terra.
Não dizemos: Mãe omnipotente. Isso está também vinculado à concepção da biologia
grega, concretamente aristotélica, que, no acto da geração, atribuía toda a actividade
ao sémen masculino. Portanto, a mulher era considerada essencialmente passiva. Não
se esqueça que o óvulo feminino só em 1827 foi descoberto. Por isso, Santo Tomás de
Aquino, na sequência de Aristóteles dirá expressamente que “a mulher é algo de
falhado”: de facto, de si, a força activa do sémen está orientada para gerar uma
realidade plenamente semelhante, portanto, do sexo masculino; a geração do feminino
acontece devido a uma fraqueza. Daqui concluirá que por natureza a mulher é
subordinada ao homem, que os filhos devem amar mais o pai do que a mãe, que o
sacerdócio está vedado às mulheres, que as mulheres não podem pregar, pois a
pregação é um exercício de sabedoria e autoridade, etc...

Estas e outras razões, como, por exemplo, influências gnósticas e o celibato obrigatório
dos padres, contribuíram para que a Igreja Católica se tornasse altamente
hierarquizada e masculinizada, patriarcal. Note-se como a própria língua, que é
sedimentação e forma de um mundo, está, no referente à autoridade, estruturada de
modo machista: basta pensar que, se já não nos causa hoje dificuldade ouvir falar em
ministra, por exemplo, ainda constitui autêntica agressão dizer, por exemplo, uma
bispa... E que nome dar a uma católica feita cardeal?!...
As mulheres têm toda a razão quando criticam a Igreja oficial, pois ela discrimina-as de
modo indigno. Mas têm obrigação de ser amigas de Jesus, pois ele não só não as
discriminou como as defendeu sempre. Pense-se - só exemplos - na samaritana, na
adúltera...; pense-se sobretudo em Maria Madalena, a primeira a fazer a experiência
avassaladora de fé de que Jesus, o crucificado, ressuscitou, está vivo em Deus para
sempre; ela reuniu de novo os discípulos, que tinham fugido, de tal modo que até
Santo Tomás a chamou a “Apóstola dos Apóstolos”...

Constitui, pois, uma amarga desilusão que o Sínodo que terminou em Outubro com a
aprovação do Papa mantenha as portas fechadas à possibilidade da ordenação das
mulheres. Contra o Evangelho e os direitos humanos, continua o “clericalismo” que
Francisco tanto diz ser “a peste” da Igreja.

(Continua

sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

Advento, a estação da alegria - Pe.Manuel João, MC

 Advento, a estação da alegria

Ano C – Advento – 3º Domingo
Lucas 3,10-18: “E nós, que devemos fazer?”

O terceiro domingo do Advento é chamado de “domingo Gaudete”, pela primeira palavra que abre a celebração: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Novamente vos digo: alegrai-vos. Seja de todos conhecida a vossa bondade. O Senhor está próximo” (antífona de entrada, cf. Fl 4,4-5). No ambiente penitencial que caracteriza o tempo do Advento, este domingo traz-nos um convite especial à alegria.

O caminho do Advento é um percurso guiado. A liturgia propõe-nos três guias: o profeta Isaías, João Batista e a Virgem Maria. São três “pedagogos” que se alternam à medida que nos aproximamos do Natal. Isaías é o profeta messiânico por excelência, porque anuncia a chegada do Messias. Ele é quem alimenta a esperança. João Batista, por sua vez, chama-nos à conversão para nos prepararmos para a chegada do Messias. Por fim, a Virgem Maria ensina-nos como acolhê-lo: concebendo-o no nosso coração.

A liturgia coloca no centro do segundo e terceiro domingo do Advento a figura de João Batista, segundo a narração de São Lucas, o evangelho que nos guiará durante este ano litúrgico "C". João faz ecoar no deserto o grito do profeta Isaías: “Voz de quem clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor!” (Lucas 3,1-6, segundo domingo). O trecho do Evangelho deste terceiro domingo apresenta-nos a reação das multidões à sua pregação: “Que devemos fazer?”

Gostaria de desenvolver a minha reflexão em torno de duas palavras que encerram a mensagem deste domingo: Alegria e Conversão. À primeira vista, alegria e conversão podem parecer distantes, mas, refletindo bem, descobrimos que se harmonizam perfeitamente. A alegria brota da conversão (como mostram as parábolas da misericórdia em Lucas 15) e, ao mesmo tempo, a conversão nasce da alegria (como acontece na história de Zaqueu, em Lucas 19,8).

A ALEGRIA que dá sabor à vida!

Este terceiro domingo – como dissemos – caracteriza-se por um convite forte, convicto e decidido a alegrar-nos, porque o Senhor está próximo. 

Na primeira leitura, o profeta Sofonias exorta insistentemente o povo de Deus a alegrar-se: “Clama jubilosamente, filha de Sião; solta brados de alegria, Israel. Exulta, rejubila de todo o coração, filha de Jerusalém... Não temas, Sião, não desfaleçam as tuas mãos. O Senhor teu Deus está no meio de ti, como poderoso salvador”.
Também nós temos uma extrema necessidade de ser encorajados, sobretudo num contexto marcado por um pessimismo generalizado quanto ao futuro.
O Salmo responsorial retoma um texto de Isaías que nos convida a expressar a alegria em canto: “Entoai cânticos de alegria, habitantes de Sião, porque é grande no meio de vós o Santo de Israel.” 
Na segunda leitura, São Paulo reforça com vigor o convite à alegria: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Novamente vos digo: alegrai-vos. Seja de todos conhecida a vossa bondade. O Senhor está próximo!”

Se olharmos à nossa volta, há bem pouco com que nos alegrarmos, presos como estamos numa rede cada vez mais intrincada de problemas e ameaças à vida. 
Qual é, pois, a alegria do cristão? Certamente não é uma alegria despreocupada ou barulhenta. Este tipo de alegria é superficial e efêmero, muitas vezes esconde um vazio interior e age como um sedativo. A alegria do cristão nasce de uma experiência única: a proximidade de Deus, sentir-se amado, saber que o Senhor está no meio de nós. “Nós conhecemos e acreditamos no amor que Deus tem por nós. Deus é amor” (1 João 4,16).

Em conclusão, o Advento é um tempo propício para redescobrir a fonte da água fresca e abundante da alegria que brota do coração de Deus.

A CONVERSÃO que faz florescer a alegria

Mas o que dizer de João Batista? Podemos considerá-lo uma testemunha da alegria? A austeridade de sua pessoa e a severidade de sua mensagem não parecem associar-se imediatamente à imagem de um mensageiro de alegria. No entanto, a figura de João não é de modo algum estranha à alegria. Pelo contrário! Ele é um evangelizador, ou seja, um portador de boas e alegres notícias. São Lucas resume a sua pregação afirmando: “João anunciava ao povo a Boa Nova” (Lucas 3,18).

João foi o primeiro “evangelizado” pela chegada do Messias, ainda no ventre de sua mãe. Isabel, sua mãe, diz durante a visita de Maria: “Logo que a tua saudação chegou aos meus ouvidos, o menino exultou de alegria no meu ventre” (Lucas 1,44). O próprio João declarará ser o amigo do esposo que “exulta de alegria ao ouvir a voz do esposo”, e concluirá: “Esta minha alegria está completa” (João 3,29).

A austeridade e a franqueza de João tornam a sua mensagem ainda mais credível. De facto, as multidões, tocadas pelo seu ensinamento, perguntam-lhe: “Que devemos fazer?”. Até mesmo publicanos e soldados aproximam-se dele para serem batizados, perguntando: “E nós, que devemos fazer?”.
A resposta do profeta surpreende-nos por duas razões. Em primeiro lugar, João não faz propostas de caráter “religioso”, como ir ao Templo, rezar ou oferecer sacrifícios. Ele convida, ao invés disso, a praticar ações de justiça social, partilha e respeito pelas pessoas. Além disso, surpreende porque não pede aos publicanos e soldados que abandonem o seu ofício, mas que o exerçam com honestidade.

Frequentemente interpretamos a conversão à maneira de Paulo, como a famosa “queda do cavalo”. O Senhor, no entanto, ajusta-se ao nosso passo, caminha ao nosso lado e, com paciência, educa-nos para uma mudança nos nossos estilos de vida. Ele não adota (geralmente!) a estratégia do “tudo ou nada”. Ele conhece bem a nossa fragilidade e o nosso medo de medidas drásticas. No fundo, somos como passarinhos enregelados num dia de inverno, desejosos de um pouco de conforto e de um carinho, mas demasiado receosos para acolher a mão estendida de Deus em nossa direção.

“Tem cuidado, Senhor, para não nos pedires demasiado, para não exigires demasiado, para não acreditares demasiado em nós!... Tem cuidado comigo, Senhor, sê calmo e doce, sê paciente comigo e com o meu coração ainda demasiado amedrontado” (Alessandro Deho’).

P. Manuel João Pereira Correia, mccj


segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

A conceição imaculada de Maria Anselmo Borges Padre e professor de Filosofia 08 Dezembro 2024

A conceição imaculada de Maria
Anselmo Borges

Padre e professor de Filosofia

08 Dezembro 2024

Santo Agostinho é um génio. E a sua influência foi determinante para o homem
europeu e, depois, com a missionação, para a Humanidade, sendo necessário
acrescentar que esta influência foi para o bem e para o mal. Como exemplo da
influência negativa pense-se no seu pessimismo, que o levou à convicção de que o
prazer sexual está sempre ligado ao pecado, pois a finalidade da relação sexual devia
ser unicamente a procriação.

Baseado na tradução latina da Carta de S. Paulo aos Romanos, 5,12, referente a Adão:
“no qual todos pecaram”, Santo Agostinho, contra o texto original grego, que diz:
“porque todos pecaram”, interpretou - ele não sabia grego - que o pecado de Adão não
é apenas o primeiro da série de todos os pecados cometidos pelos homens e mulheres
ao longo da História, mas que esse pecado é um pecado hereditário, de tal modo que é
um pecado de todos, transmitido por geração no acto sexual. Portanto, o recém-
nascido não é inocente, nasce em pecado, do qual, para evitar a condenação eterna, só
o baptismo o pode libertar.

Foi pelo pecado de Adão que veio todo o mal ao mundo, incluindo a morte. Esse
pecado tornou a Humanidade toda “massa condenada” ao Inferno, do qual só alguns
são libertados pela graça imerecida de Deus.

Pelo pecado, Adão destruiu um bem que podia ser eterno, tornando-se merecedor, ele
e todos nele, de um mal eterno: “Daqui - escreve ele -, a condenação de toda a massa
do género humano, pois o primeiro culpado foi castigado com toda a sua posteridade,
que estava nele como na sua raiz. Assim ninguém escapa a esse suplício justo e devido,
a não ser por uma misericórdia e uma graça indevidas. E é tal a disposição dos homens
que nalguns aparece o valor de uma graça misericordiosa e, nos outros, o de uma justa
vingança.”

Assenta aqui a doutrina da dupla predestinação, que continuaria radicalizada
sobretudo em Calvino.

É neste enquadramento que surge a festa que se celebra hoje, 8 de Dezembro, com
feriado nacional: a Imaculada Conceição de Nossa Senhora. Quer dizer, Maria, a mãe
de Jesus, seria uma excepção, pois teria sido concebida sem pecado original.

É claro que, como já aqui expliquei, não há pecado original como o entendeu Santo
Agostinho. Jesus não falou no pecado original, e que mãe acredita que o seu bebé
acabado de nascer foi gerado em pecado?

Assim, o que de facto se celebra é a esperança de que no final se realize o Reino de
Deus na sua plenitude, pondo termo a todo o calvário do mundo, ao horror do
sofrimento sem nome, a esse cortejo infindo de ódio, de malvadez, de vingança, de
loucura, de pecado, que realizou todo o mal e toda a tragédia e todas as lágrimas que
causamos uns aos outros e o número incontável de vítimas inocentes...

Do ponto de vista filosófico, Theodor Adorno, agnóstico, exprimiu assim a ânsia de
redenção, que habita no coração de todos os homens e mulheres: “Face ao desespero,
o único modo que ainda resta à filosofia de responsabilizar-se é a tentativa de
considerar todas as coisas como aparecem desde o ponto de vista da redenção. A única
luz do conhecimento é a que brilha no mundo desde a perspectiva da redenção”; tudo
o mais é apenas técnica.

No fundo, o que se celebra é a “santa esperança”, como dizia Péguy, a esperança de
que a paz, a justiça, a fraternidade, a salvação, a vida eterna, um dia irrompam no
mundo para todos. Para que a história do mundo e da Humanidade não desemboque
pura e simplesmente no sem sentido.