...Agora volto feliz à minha missão ao serviço dos últimos...
terça-feira, 26 de fevereiro de 2019
Comboniano retorna para Missão no Congo aos 80 anos - Pe. Lorenzo Farronato
...Tentei dar sentido à minha vida e despertar o anseio por Deus ao tornar o evangelho conhecido. Embora tenha tentado fazer o melhor possível, Jesus me ensina a dizer: “Sou um servo inútil, me coloco nas mãos de seu amor misericordioso. Eu confio em ti!”...
...Agora volto feliz à minha missão ao serviço dos últimos...
...Agora volto feliz à minha missão ao serviço dos últimos...
O que a Igreja «mostra» e o que a Igreja «é» - João Teixeira - DM
1.Numa altura em que a Igreja se sobressalta com o
que «mostra», é imperioso recordar o que – efectivamente
– a Igreja «é».
Importa, pois, dizer bem alto que, embora nem
sempre o «mostre», a Igreja «é» santa.
2. A Igreja «é» santa porque é o inteiro Corpo de Cristo (cf.
1Cor 12, 12-13).
A santidade vem-lhe da sua cabeça. Mas o pecado subsiste
em muitos dos seus (outros) membros.
3. Porque é que os pecadores se mantêm na Igreja? Precisamente
para vencer o pecado.
Conscientes de que por si nada alcançam (cf. Jo 15, 5), alenta-
os saber que em Cristo tudo conseguirão (cf. Fil 4, 13).
4. Acontece que este não é um processo linear: envolve
avanços e recuos, com muitas lutas e quedas, tentações, tentativas
e constantes recomeços.
A Igreja nunca deixará de «ser» santa. Mas «com» pecadores.
5. Angel Antón percebeu que a Igreja «é uma “cópia” do
original Cristo».
Só que é uma «cópia» nem sempre transparente. Muitas
vezes, torna-se uma «cópia» tremida e embaciada, que mal
deixa ver o «original Cristo».
6. Perguntar-se-á. Como é que o Corpo de Cristo pode estar
«forrado» com um «tecido» tão grosseiro?
Sucede que nem o pecado dos seus membros impede que
a cabeça derrame fluxos infindáveis de santidade. Com todas
as fragilidades que a debilitam, a Igreja será sempre a
«sala» em que o Pai celebra os esponsais do Seu Filho com a
humanidade.
7. Todos são convidados já que, à partida, a Igreja não desiste
de ninguém.
Como sinalizou Henri de Lubac, ela «não é uma academia
de sábios, nem um cenáculo de intelectuais sublimes, nem
uma assembleia de super-homens». Há toda uma «legião de
medíocres que se sentem nela como em própria casa».
8. Neste mundo, ela será sempre «trigo misturado com palha
» e «barca repleta de maus passageiros que parecem arrastá-
la para o naufrágio».
Como rezava uma conhecida máxima de Santo Ambrósio,
a Igreja é «imaculada, mas composta por maculados» («immaculata
ex maculatis»).
9. Faz parte da sua natureza estar exposta, não lhe sendo
permitido ocultar as suas fraquezas.
Há comportamentos que ela não aceita e atitudes com as
quais não pode transigir.
10. A Igreja coexistirá sempre com o pecado, mas sem jamais
lhe render vassalagem.
O perigo de cair nunca deixará de espreitar. E, no entanto, ela «é» santa!
que «mostra», é imperioso recordar o que – efectivamente
– a Igreja «é».
Importa, pois, dizer bem alto que, embora nem
sempre o «mostre», a Igreja «é» santa.
2. A Igreja «é» santa porque é o inteiro Corpo de Cristo (cf.
1Cor 12, 12-13).
A santidade vem-lhe da sua cabeça. Mas o pecado subsiste
em muitos dos seus (outros) membros.
3. Porque é que os pecadores se mantêm na Igreja? Precisamente
para vencer o pecado.
Conscientes de que por si nada alcançam (cf. Jo 15, 5), alenta-
os saber que em Cristo tudo conseguirão (cf. Fil 4, 13).
4. Acontece que este não é um processo linear: envolve
avanços e recuos, com muitas lutas e quedas, tentações, tentativas
e constantes recomeços.
A Igreja nunca deixará de «ser» santa. Mas «com» pecadores.
5. Angel Antón percebeu que a Igreja «é uma “cópia” do
original Cristo».
Só que é uma «cópia» nem sempre transparente. Muitas
vezes, torna-se uma «cópia» tremida e embaciada, que mal
deixa ver o «original Cristo».
6. Perguntar-se-á. Como é que o Corpo de Cristo pode estar
«forrado» com um «tecido» tão grosseiro?
Sucede que nem o pecado dos seus membros impede que
a cabeça derrame fluxos infindáveis de santidade. Com todas
as fragilidades que a debilitam, a Igreja será sempre a
«sala» em que o Pai celebra os esponsais do Seu Filho com a
humanidade.
7. Todos são convidados já que, à partida, a Igreja não desiste
de ninguém.
Como sinalizou Henri de Lubac, ela «não é uma academia
de sábios, nem um cenáculo de intelectuais sublimes, nem
uma assembleia de super-homens». Há toda uma «legião de
medíocres que se sentem nela como em própria casa».
8. Neste mundo, ela será sempre «trigo misturado com palha
» e «barca repleta de maus passageiros que parecem arrastá-
la para o naufrágio».
Como rezava uma conhecida máxima de Santo Ambrósio,
a Igreja é «imaculada, mas composta por maculados» («immaculata
ex maculatis»).
9. Faz parte da sua natureza estar exposta, não lhe sendo
permitido ocultar as suas fraquezas.
Há comportamentos que ela não aceita e atitudes com as
quais não pode transigir.
10. A Igreja coexistirá sempre com o pecado, mas sem jamais
lhe render vassalagem.
O perigo de cair nunca deixará de espreitar. E, no entanto, ela «é» santa!
segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019
OS OUTROS ESTÃO A MAIS? (2) Frei Bento Domingues, O.P.
1. A fonte da realidade, una e múltipla, é sempre oculta para quem
olha de fora. É da experiência mais imediata que há outros e outros. Uns são
acolhidos, outros são rejeitados e outros ainda são vistos com indiferença
pelos nossos afectos e comportamentos. Por pouco que se aprofunde, cada ser
humano é um abismo misterioso.
Quando falamos dos direitos e
deveres humanos, enunciamos um reconhecimento e uma vontade que mais parecem
uma veleidade do que uma energia de acção. Quando invocamos a fraternidade humana designamos apenas um
horizonte e um desejo. Se desistíssemos desse horizonte, teríamos de responder
a uma pergunta inquietante: quem tem direito a excluir os outros da condição
comum? A pena de morte, por exemplo, significa um poder absoluto sobre o outro,
em nome de quê?
Que fazer para alterar aquilo que
ofende a condição humana? É uma pergunta imensa, mas não nos impede de recordar
coisas muito básicas. Parece evidente que existe, na consciência, a noção de
bem e de mal. O bem deve-se praticar e o mal deve-se evitar. Diz-se que no concreto
das tradições culturais e éticas, muitas vezes, aquilo a que uns chamam bem
outros chamam mal. Mas não exageremos. Não pode ser uma apologia do relativismo:
se vale tudo, nada vale!
As sabedorias antigas da
reciprocidade pediam: não faças aos outros o que não desejas que os outros te
façam a ti; ou de forma positiva, faz aos outros o que desejas que os outros te
façam a ti.
Essas generalidades não servem
para construir uma articulação concreta de direitos e deveres que tornem
possível a vida em sociedade. Pertence às normas fundamentadas do Direito e aos
diferentes órgãos legítimos do poder a busca da sabedoria e da arte de governar
para evitar a tirania e a desordem.
2. Estas abstracções não movem montanhas. As religiões não aparecem
sempre, nos grandes meios de comunicação social, pelos melhores motivos e com a
melhor imagem. Umas vezes com muita razão e outras por má-fé, as religiões são
acusadas de todos os males. Jesus Cristo, o homem da intimidade com o divino e
com o humano, era um crítico de certas formas e instituições religiosas, a
começar por aquelas em que foi iniciado. Parece que nunca lhe passou pela
cabeça que esse mundo tivesse caído do céu com as normas e os interditos prontinhos
a servir. Sabia distinguir o que era digno de Deus e do ser humano, daquilo que
era fruto da construção histórica dos interesses do nacionalismo, dos grupos, das
pessoas e do que, abusivamente, era atribuído à divindade.
O diálogo inter-religioso, para
ser eficaz, exige que os intervenientes consintam em pôr em causa aquilo que
estragou o melhor das suas tradições. Não se pode assemelhar a uma falsa e
ridícula passagem de modelos de virtude.
No dia 4 de Fevereiro deste ano,
no Founder’s Memorial, em Abu Dhabi
(Emirados Árabes Unidos), o Papa Francisco e o Grande Imã da Mesquita de
Al-Azhar (Cairo – Egipto), Ahmed Mohamed El-Tayeb, considerado como a
autoridade máxima no mundo muçulmano sunita, assinaram o Documento sobre a fraternidade humana em prol da paz mundial e
da convivência comum[1].
Importa destacar
que vários líderes muçulmanos europeus já apoiaram a declaração de Abu Dhabi.
A posição conjunta assume
a Declaração como um documento-guia «para as gerações futuras promoverem uma
cultura de respeito mútuo na consciência»[2].
É fundamental que os cristãos e os muçulmanos
compreendam a importância do caminho que foi aberto em Abu Dhabi. É o gesto religioso, cultural e político mais importante, não apenas
do começo do séc. XXI, mas desde há muitos séculos. As personalidades que
assinaram o histórico documento não procuram defender as respectivas instituições
religiosas. Estão a envolver as duas grandes religiões em prol do bem de toda a
humanidade. A declaração é fundamentada na fé das duas configurações, mas é uma
fé carregada com o empenhamento de cuidar da Casa Comum e de todas as
pessoas da humanidade.
«A fé leva o crente a ver no outro um irmão que se deve apoiar e
amar. Da fé em Deus, que criou o universo, as criaturas e todos os seres
humanos – iguais pela Sua Misericórdia –, o crente é chamado a expressar esta
fraternidade humana, salvaguardando a criação e todo o universo, apoiando todas
as pessoas, especialmente as mais necessitadas e pobres.
Partindo deste valor transcendente, em vários encontros dominados por uma
atmosfera de fraternidade e amizade, compartilhámos as alegrias, as tristezas e
os problemas do mundo contemporâneo, a nível do progresso científico e técnico,
das conquistas terapêuticas, da era digital, dos mass-media, das comunicações; a nível da pobreza, das guerras e das
aflições de tantos irmãos e irmãs, em diferentes partes do mundo, por causa da
corrida às armas, das injustiças sociais, da corrupção, das desigualdades, da
degradação moral, do terrorismo, da discriminação, do extremismo e de muitos
outros motivos.
De tais fraternas e sinceras acareações que tivemos e do encontro cheio de
esperança num futuro luminoso para todos os seres humanos, nasceu a ideia deste
“Documento sobre a Fraternidade Humana”. Um documento pensado com sinceridade e
seriedade para ser uma declaração conjunta de boas e leais vontades, capaz de
convidar todas as pessoas, que trazem no coração a fé em Deus e a fé na
fraternidade humana, a unirem-se e trabalharem em conjunto, de modo que tal
documento se torne, para as novas gerações, um guia rumo à cultura do respeito
mútuo, na compreensão da grande graça divina que torna irmãos todos os seres
humanos».
3. Na mesma altura, o Papa
Francisco fez um discurso notável[3], de que destaco um ponto: Se acreditamos
na existência da família humana, esta deve ser salvaguardada. Consegue-se
através dum diálogo diário e efectivo. Pressupõe a própria identidade, da qual
não se deve abdicar para agradar ao outro; mas, ao mesmo tempo, requer a coragem
da alteridade. Supõe o pleno reconhecimento do outro, da sua liberdade
e impõe-me o compromisso de tudo fazer para que os seus direitos fundamentais
sejam sempre respeitados, em toda parte e por quem quer que seja. Sem
liberdade, não se é filho da família humana, mas escravo. Entre as liberdades, o
Papa salienta a liberdade religiosa. Esta não se limita à mera liberdade de
culto, mas vê no outro verdadeiramente um irmão, um filho da mesma humanidade,
que Deus deixa livre e, por conseguinte, nenhuma instituição humana pode
forçar, nem mesmo em nome d’Ele.
Isto não se ouve muitas vezes.
24.02.2019
[2]
7Margens, jornal digital, 2019.02.17
[3]
Deus está com o homem que procura a paz, http://w2.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2019/february/documents/papa-francesco_20190204_emiratiarabi-incontrointerreligioso.html
domingo, 17 de fevereiro de 2019
OS OUTROS ESTÃO A MAIS? (1) Frei Bento Domingues, O.P.
1. Nietzsche (1844-1900), um dos primeiros filósofos que estudei, é
uma figura de contrastes desmedidos. Tem tanto de visionário fascinante como de
classificador irritante. Disse o pior do Sermão
da Montanha, uma das peças mais belas e revolucionárias do Novo Testamento[1], proposto, hoje, como
desafio às comunidades eucarísticas. Classificou-o como um atentado contra a
natureza: a vida acaba quando começa o Reino de Deus e a prática da Igreja aí está
para o confirmar[2].
Deixemos, para já, o sermão de
Nietzsche, sermão da morte de Deus em
nome da exaltação da vida e do Super-
Homem, aproveitado pelos nazis para a
glorificação do crime nacionalista, anti-semita e racista.
No entanto, as religiões estão em maus lençóis
por razões mais óbvias e imediatas. A embriaguez criada pelas revoluções,
agrícola, científica, industrial e cultural ainda não serenou. Tornou-se mais
aguda. Entrou em delírio. O império da tecnociência
em todos os domínios e, agora, as promessas do reino prometido da inteligência
artificial, nas suas infindáveis aplicações, estariam a deixar Deus cada vez
mais desempregado. Por outro lado, diz-se que a extensão da robótica se
encarregará de dispensar aqueles que a criaram. Depois da morte de Deus viria,
não a emancipação, mas a morte do ser humano. Já há muito tempo que desconfio
de tanta promessa e de tanta ameaça.
Yuval Noah Harari escreveu um
livro sedutor[3].
Termina o posfácio de um modo pouco entusiasmante: «Estamos mais poderosos do
que alguma vez estivemos, mas não fazemos a mínima ideia do que fazer com todo
esse poder. Mas pior ainda é que os humanos parecem mais irresponsáveis do que
nunca. Deuses autoproclamados, com apenas as leis da física para nos fazerem
companhia, não somos responsabilizados por ninguém. Estamos, assim, a espalhar
o caos sobre os nossos companheiros animais e o ecossistema envolvente, em
busca de pouco mais do que o nosso próprio conforto e divertimento, sem, no
entanto, nos darmos por satisfeitos».
Estar insatisfeito é a maior graça
humana. Significa que o ser humano ainda não está acabado. Mas pergunta o
citado autor: «Existirá algo mais perigoso do que deuses insatisfeitos e
irresponsáveis que não sabem o que querem?»
2. Há várias formulações para esses entusiasmos e medos. Nesse
primeiro ponto, fica a ideia de uma rivalidade radical entre Deus e o ser
humano. Antigamente, essa rivalidade tinha a formulação de uma espiritualidade
conflitual: se damos muito a Deus, tiramos ao ser humano; se damos muito ao ser
humano, roubamos a Deus. Esta forma de falar de Deus nada tem a ver com a que
S. Paulo descobriu em poetas gentios: na
divindade temos a vida, o movimento e o ser[4]. Nessa perspectiva, os dois entendem-se bem: um recebe o outro como
pura graça existencial. Não há clima para um antagonismo entre as descobertas e
criações humanas e a presença divina vivificante. Estão mutuamente implicados
com regozijo recíproco. Ao pensar num, surge a apreciada diferença do outro.
A persistência da ideia de
rivalidade tem razões históricas bem documentadas, resultado de uma
antropologia e de uma teologia que não podiam conviver. A beleza da própria
ética de que fala o Génesis[5] – não vale tudo – é diabolicamente interpretada como a ordem de um
deus assustado com o alargamento da ciência humana. É o índice de uma
persistente e falsa rivalidade entre o divino e o humano. Não são capazes de
viver na alegria recíproca.
Com a simbólica narrativa da morte
de Abel pela inveja do seu irmão Caim alarga-se o mito da rivalidade. Este mundo,
na diferença humana, é de todos e para todos, de todos os povos e culturas, é a
vocação de irmãos. Não há duas humanidades, a nossa e a dos outros! A ficção narrada
pretende mostrar que uns são de Deus e outros do diabo. O outro, se não nos
ajudar, é o nosso inferno que é preciso destruir.
Nessa concepção não há lugar para
todos. Ao falar de Abel e Caim como irmãos, o conto fratricida do Génesis não
perdeu actualidade. O mundo de hoje é completamente diferente daquela sociedade
de pastores e agricultores, mas a tentação de julgar que este mundo não dá para
todos é a mesma.
Os avanços científicos e técnicos
dos últimos tempos conseguiram resultados espectaculares em todos os âmbitos do
progresso aplicável ao ser humano e ao seu ambiente. Apesar dos conflitos
locais e globais, de guerras declaradas e latentes, seria ridículo não
reconhecer os avanços espectaculares alcançados.
Existe um pequenino senão: as desigualdades entre países e continentes, e
dentro de muitos países, acentuaram-se. Não se pensa na arte de construir
pontes entre os seres humanos, mas no dinheiro que é preciso para levantar
muros físicos ou simbólicos. O destino universal de todos os bens do planeta é
uma afirmação de generosidade.
Entretanto, as vítimas das
guerras, da pobreza imposta, da miséria e das doenças que provoca, não
manifestam grande vontade de filosofar ou de fazer exercícios de
espiritualidade zen.
As obras que se escreveram e
escrevem a anunciar as datas do fim da pobreza imposta, com certo aparato
científico, parecem seguir a lógicas das Testemunhas de Jeová a anunciar o fim
do mundo.
Como apontámos, as estatísticas
vão mostrando avanços e recuos, segundo os países e os continentes, das medidas
para erradicar essa vergonha. As estatísticas não podem contabilizar os pobres
que vão tendo a morte, antes de tempo, como solução.
Para além disto, as desigualdades
entre ricos e pobres acentuam-se. A distância entre o que certas pessoas ganham
e o mínimo que outras conseguem para sobreviver, no seu dia-a-dia, poderia ser
um pecado que bradaria aos céus se neles acreditassem.
Consta que existe uma
espiritualidade para consumidores neoliberais. Diz-se que os seus exercícios
espirituais são engenhosos. Usam receitas de marca individualista/consumista,
corporativa/capitalista.
A homilia que o Papa Francisco fez
em Abu Dhabi diz que há outras formas de ser feliz. São paradoxais como as do
Evangelho, mas nunca tornaram ninguém desgraçado. Assinou com o Grão Imame de
Al-Azhar um notável documento sobre a Fraternidade
Humana.
Que fazer para o não deixar nos
arquivos religiosos?
Fica para a próxima crónica.
17.02.2019
[1] Lc 6, 17-26; Mt 5, 1-12
(ver os contrastes entre as duas versões)
[2] A moral como
contra-natureza, in Nietzsche. O
Crepúsculo dos Ídolos, Prisa Innova, 2008, 511-518
[3] Sapiens. De
Animais a Deuses. História
Breve da Humanidade, Elsinore, uma chancela da 20/20 Editora, 2018. Depois
deste já saiu o Homo Deus. História Breve
do Amanhã.
[4] Actos 17, 27-28
[5] Gn 3
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019
NÃO NOS PREOCUPEMOS COM OS ANJOS Frei B D, O.P.
1. Não escolhemos as perguntas que nos fazem. Na semana passada, uma
senhora muito idosa perguntou-me aflita: os anjos existem ou não? Toda a vida
rezei ao meu anjo da guarda, mas a minha neta disse-me que, agora, já nem os
padres acreditam nisso.
Deduzi que não era a sua crença
que estava abalada, mas a dificuldade em transmiti-la à nova geração. Não vem
ao caso a conversa que tivemos. O imaginário da luta entre os anjos bons a
quererem salvar as nossas almas e os demónios a fazerem tudo para nos perderem
era a representação religiosa da nossa infância. Lembrei-lhe que, na Eucaristia,
o louvor divino é sempre associado à música dos anjos e dos santos!
Quando
a ansiedade serenou, lembrei-lhe duas histórias que me divertiram. Em 1961, à
saída de Liège, à espera de uma boleia para Colónia, li, no Assimile de alemão,
que um pároco pediu a um pintor que enchesse de anjos as paredes de uma capela
recém-construída. Quando foi ver as pinturas ficou irritado: quando é que se
viram anjos com tamancos? O pintor observou-lhe: e sem tamancos?
Em 1962, era assistente da Juventude
da Igreja de Cristo Rei (Porto) – a primeira associação católica mista de jovens, em Portugal – quando um
rapaz interessado por teologia veio dizer-me que tinha descoberto as razões do mundo
andar tão desorientado. Os Anjos não se reproduzem e os seres humanos são cada
vez mais. Resultado: há muita gente sem anjo da guarda!
Os meus anjos preferidos são as
criaturas da pura beleza de Fra Angélico, mas há dias, numa celebração da
Eucaristia, deparei com uma passagem da Carta aos Hebreus que desloca todas as
preocupações com a angelolatria. Reza
assim: «Uma vez que os filhos dos homens têm o mesmo sangue e a mesma carne,
também Jesus participou igualmente da mesma natureza para destruir, pela sua
morte, aquele que tinha poder sobre a morte, isto é, o diabo, e libertar
aqueles que estavam a vida inteira sujeitos à servidão, pelo temor da morte.
Porque Ele não veio em auxílio dos anjos,
mas dos descendentes de Abraão. Por isso, devia tornar-se semelhante, em tudo, aos seus irmãos, para ser um sumo
sacerdote misericordioso e fiel no serviço de Deus e assim expiar os pecados do
povo. De facto, porque Ele próprio foi provado pelo sofrimento, pode socorrer
aqueles que sofrem de provação»[1].
S. Paulo, na Missa deste Domingo,
lembra-nos que, pela ressurreição, Jesus venceu a morte. É esse o Evangelho que
ele anuncia, fonte de toda a esperança. Não tem explicação para o facto. Usa
analogias para dizer que essa Fé está em consonância com os ritmos da natureza.
É anti niilista. Por isso, exclama: morte,
onde está tua vitória?[2].
O prefácio da impropriamente dita Missa de defuntos é de uma beleza
extraordinária: a vida não acaba, apenas
se transforma.
2. O medo da morte é absolutamente natural. Há muitos anos que
administro a santa unção e celebro missas ditas de corpo presente e de funeral.
Lamento vários aspectos do ritual e sobretudo as celebrações nas capelas
mortuárias, mas mais ainda os funerais transformados numa competição comercial.
O que me espanta é a recusa de não
se fazer ritual nenhum, sejam de crentes ou descrentes. Se fosse o fim de tudo,
não tinha sentido qualquer celebração. Morreu, acabou. Usamos uma linguagem simbólica
e rituais para evocar o que não podemos descrever. Ninguém sabe nada do que
acontece depois da morte. Esquecemos que sabemos pouco do que é mais importante
antes da morte. A vida! O mais significativo escapa à linguagem factual e à das
ciências. Como disse Nélida Piñon, «tudo o que preside ao humano provém do
mistério. Amor, vida, morte, nada disto se explica. O mistério é puro encanto.
(…). O que me define talvez seja a teologia do mistério, sim. O mistério roça
em Deus, no pecado, em tudo. Não sabemos o que é, sei que somos filhos dele.
Deus está sempre presente na minha vida, mas sem questionamentos. Não
batalhamos. Deus foi um senhor maravilhoso, gentil, que não me incomodou,
porque desde cedo descobri, como Dostoiévski, o peso da consciência. (…).
Estive atenta, enquanto pude, aos mistérios da fé. Sorri e chorei diante das
adversidades. Amei e fui amada. Deixei que Deus pousasse no meu regaço.
Resta-me agora dizer Amém»[3].
3. Precisamos de anjos e de muitos. Acerca das referências do Novo
Testamento (NT) recomendo o exegeta Xavier Léon-Dufour[4]. Não são essas
referências, essenciais, que importa convocar para esta crónica. Os anjos são
mensageiros de boas notícias, mensageiros de esperança.
Foi para mim um anjo! São muitas as pessoas, todos conhecem
algumas, a quem apetece dizer esta bendita oração. Muitas famílias têm doentes
em casa, que só elas conhecem. Mas nos hospitais, nos lares de idosos, nas
cadeias, debaixo das pontes, sem abrigo, sem amigos, imigrantes, mutilados da
guerra existem mundos que precisam de quem lhes acuda. De facto, existe também
um mundo dos que visitam, atendem, sorriem, ajudam, socorrem pela única razão
que essas pessoas precisam. Não fazem propaganda, não aparecem nos meios de
comunicação nem nas redes sociais. Não são condecorados. São os anjos da música
silenciosa da pura gratuidade.
Essas pessoas, com ou sem
referências aos textos NT, seguem a ordem de Jesus: não saiba a tua mão esquerda o que faz a direita[5]. A nossa vocação humana e divina é a de sermos anjos uns dos outros,
mas sem esquecer o aviso do Mestre.
A publicidade, mesmo a do bem, pode não ser um apelo à generosidade de
todos, mas apenas um grande negócio da vaidade e do lucro. Uma coisa é o método de envolver cada vez mais pessoas
na prática gratuita da generosidade criativa, outra é a táctica hipócrita da
autopromoção em nome da virtude.
Não é por acaso que a Bíblia fala
de anjos bons e anjos maus.
10.02.19.
[1] Hb 2, 14-18
[2] Cor 1Cor 15,1-11
[3] Nélida Piñon, A vida e a literatura, in JL, págs. 14-18
[4] Cf. Dictionnaire
du Nouveau Testament, Seuil, 1975, entrada Anje
[5] Mt.6, 3-4
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019
P. Jeremias e P. Alcides visitam comunidades no Quénia
Desde o dia 15 de janeiro que a província do Quénia recebe a visita oficial do P. Jeremias dos Santos Martins, vigário geral dos Combonianos. No dia 1 de fevereiro, o P. Alcides da Costa, assistente geral, juntou-se ao P. Jeremias, para ambos prosseguirem a visita, agora já na área de Nairobi, capital do país.
quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019
1."O acesso à experiência da fé, hoje!”. V FORUM - uaasp
O Acesso à Experiência da Fé, hoje!
Dificuldades e oportunidades que a cultura actual oferece na comunicação da Fé
José Milhazes
Caros amigos, penso que o desafio que me foi feito para falar de tão altas matérias deveria ser dirigido a outras pessoas melhor preparadas do que eu. Por isso, perdoem-me se ficar aquém das expectativas criadas. Gostaria de iniciar a minha intervenção não pelas dificuldades, mas pelas oportunidades que a cultura actual oferece na comunicação da Fé. Será uma banalidade afirmar que as novas tecnologias de informação e a globalização criaram possibilidades nunca vistas. Basta ter um computador em casa ou na escola ligado à Internet para aceder a um mundo a que eu chegava com enorme dificuldade e atraso quando comecei a minha carreira de jornalista em 1989, para já não falar quando estudava no Seminário dos Combonianos. Daí eu me debruçar inicialmente sobre as oportunidades que a Cultura, através de meios tecnológicos e humanos, oferece na comunicação da Fé. Além do mais, as manifestações e variedades de Cultura multiplicam-se com uma rapidez nunca vista, fruto também da veloz evolução tecnológica e humana. O principal problema continua a ser tão antigo como a Cultura: a sua definição e formas de manifestação. Iúri Lotman, um dos pais da Semiótica, definia assim a Cultura: “Conjunto de informação geneticamente não herdada no campo do comportamento humano”, ou seja, aquilo que tem como raiz a espiritualidade do homem, a forma como ele olha para o mundo cujas folhas e frutos são a Cultura. Para mim, pessoalmente, e penso que para muitos de vós, nem tudo o que é apresentado como Cultura o é, por muito popular que possa ser. É minha opinião que a Cultura deve ter por objectivo o aperfeiçoamento da Humanidade e, por isso, é uma via importante para se chegar à Fé. Aliás, quanto mais culta for a base da Fé, mais sólida é esta. Mas outro problema com que nos defrontamos é que, no momento actual, vive-se uma profunda crise tanto na Cultura como na Fé. E isto tem várias explicações. A qualidade da Cultura é cada vez mais relativa e a Fé, pelo menos no mundo ocidental, parece ser cada vez mais um fenómeno exótico, raro. E isto, frequentemente, deve-se ao facto de tentarem fazer da Cultura um instrumento de combate à Fé, considerando esta uma espécie de obscurantismo. Parece impossível, mas é verdade, que em Portugal não exista um “Museu dos Descobrimentos”. Porquê? Porque minorias agressivas, mas fortemente posicionadas, por exemplo, no nosso Ensino Superior, acham que afinal esse passo civilizacional dado pelos portugueses não o merece. Retire-se já o monumento ao Padre António Vieira em Lisboa, devido ao seu “esclavagismo selectivo”, mas já não protestam contra culpados pela morte de dezenas de milhões de pessoas, como Lenine, Trotski, Estaline, Mao ou Fidel Castro. Pelo contrário, baseando-se na sua fé inabalável, pedem ao povo que os deixem fazer, mais uma vez, experiências desse tipo, prometendo utilizar outros métodos e evitar “danos colaterais”.
Vivemos numa época em que velhas utopias malditas pareciam ter passado ao lixo da História – o fascismo e o comunismo –, mas estão de volta e, aqui, mais importante ainda é fazer da Cultura, do Conhecimento uma via para a Fé. A Igreja tem de competir no mundo da informação. Mas quando é que a Igreja Católica Portuguesa terá um canal televisivo próprio, onde faça chegar a sua palavra aos portugueses sobre os mais diferentes aspectos da vida nacional e internacional? Quando poderemos ler um jornal electrónico de tendência claramente católica? Deram conta do chinfrim que os defensores de todas as causas fizeram quando a jornalista Diana Aguiar, grande profissional, pronunciou a frase: “Até amanhã, se Deus quiser!”? Talvez a reacção fosse bem mais pacífica se ele pronunciasse: “até amanhã, camaradas!” Talvez eu esteja a dizer isto por estar mal informado devido ao facto de ter andado por fora tantos anos, mas parece-me que a Igreja Católica demora a reagir aos desafios dos tempos, perdendo terreno para aqueles que prometem tudo e rapidamente. Por exemplo, quantos anos nós tivemos de esperar para que a Igreja Católica começasse a limpar as suas fileiras de padres pedófilos? A iniciativa devia ter sido tomada pelo Vaticano, mas isso não foi feito, facto que é aproveitado pelos adversários para desacreditarem a Igreja Romana. Recentemente, li, com surpresa, que o padre e poeta português Tolentino Mendonça foi nomeado pelo Santo Padre, e passo a citar a imprensa, “responsável pelo Arquivo Secreto do Vaticano”. Numa Igreja que se quer e deve ser transparente, que “documentos secretos” existirão nesse arquivo? Depois não se venham queixar dos milhões de livros que se vendem à custa das teorias da conspiração em torno do secretismo do Vaticano. Como historiador, jornalista e católico, não compreendo.
A Cultura oferece oportunidades únicas na comunicação da Fé, mas para isso é indispensável reagir, agir para a solução dos problemas e não esperarmos que alguém o faça por nós.
Fátima 24 Novembro 2018
Dificuldades e oportunidades que a cultura actual oferece na comunicação da Fé
José Milhazes
Caros amigos, penso que o desafio que me foi feito para falar de tão altas matérias deveria ser dirigido a outras pessoas melhor preparadas do que eu. Por isso, perdoem-me se ficar aquém das expectativas criadas. Gostaria de iniciar a minha intervenção não pelas dificuldades, mas pelas oportunidades que a cultura actual oferece na comunicação da Fé. Será uma banalidade afirmar que as novas tecnologias de informação e a globalização criaram possibilidades nunca vistas. Basta ter um computador em casa ou na escola ligado à Internet para aceder a um mundo a que eu chegava com enorme dificuldade e atraso quando comecei a minha carreira de jornalista em 1989, para já não falar quando estudava no Seminário dos Combonianos. Daí eu me debruçar inicialmente sobre as oportunidades que a Cultura, através de meios tecnológicos e humanos, oferece na comunicação da Fé. Além do mais, as manifestações e variedades de Cultura multiplicam-se com uma rapidez nunca vista, fruto também da veloz evolução tecnológica e humana. O principal problema continua a ser tão antigo como a Cultura: a sua definição e formas de manifestação. Iúri Lotman, um dos pais da Semiótica, definia assim a Cultura: “Conjunto de informação geneticamente não herdada no campo do comportamento humano”, ou seja, aquilo que tem como raiz a espiritualidade do homem, a forma como ele olha para o mundo cujas folhas e frutos são a Cultura. Para mim, pessoalmente, e penso que para muitos de vós, nem tudo o que é apresentado como Cultura o é, por muito popular que possa ser. É minha opinião que a Cultura deve ter por objectivo o aperfeiçoamento da Humanidade e, por isso, é uma via importante para se chegar à Fé. Aliás, quanto mais culta for a base da Fé, mais sólida é esta. Mas outro problema com que nos defrontamos é que, no momento actual, vive-se uma profunda crise tanto na Cultura como na Fé. E isto tem várias explicações. A qualidade da Cultura é cada vez mais relativa e a Fé, pelo menos no mundo ocidental, parece ser cada vez mais um fenómeno exótico, raro. E isto, frequentemente, deve-se ao facto de tentarem fazer da Cultura um instrumento de combate à Fé, considerando esta uma espécie de obscurantismo. Parece impossível, mas é verdade, que em Portugal não exista um “Museu dos Descobrimentos”. Porquê? Porque minorias agressivas, mas fortemente posicionadas, por exemplo, no nosso Ensino Superior, acham que afinal esse passo civilizacional dado pelos portugueses não o merece. Retire-se já o monumento ao Padre António Vieira em Lisboa, devido ao seu “esclavagismo selectivo”, mas já não protestam contra culpados pela morte de dezenas de milhões de pessoas, como Lenine, Trotski, Estaline, Mao ou Fidel Castro. Pelo contrário, baseando-se na sua fé inabalável, pedem ao povo que os deixem fazer, mais uma vez, experiências desse tipo, prometendo utilizar outros métodos e evitar “danos colaterais”.
Vivemos numa época em que velhas utopias malditas pareciam ter passado ao lixo da História – o fascismo e o comunismo –, mas estão de volta e, aqui, mais importante ainda é fazer da Cultura, do Conhecimento uma via para a Fé. A Igreja tem de competir no mundo da informação. Mas quando é que a Igreja Católica Portuguesa terá um canal televisivo próprio, onde faça chegar a sua palavra aos portugueses sobre os mais diferentes aspectos da vida nacional e internacional? Quando poderemos ler um jornal electrónico de tendência claramente católica? Deram conta do chinfrim que os defensores de todas as causas fizeram quando a jornalista Diana Aguiar, grande profissional, pronunciou a frase: “Até amanhã, se Deus quiser!”? Talvez a reacção fosse bem mais pacífica se ele pronunciasse: “até amanhã, camaradas!” Talvez eu esteja a dizer isto por estar mal informado devido ao facto de ter andado por fora tantos anos, mas parece-me que a Igreja Católica demora a reagir aos desafios dos tempos, perdendo terreno para aqueles que prometem tudo e rapidamente. Por exemplo, quantos anos nós tivemos de esperar para que a Igreja Católica começasse a limpar as suas fileiras de padres pedófilos? A iniciativa devia ter sido tomada pelo Vaticano, mas isso não foi feito, facto que é aproveitado pelos adversários para desacreditarem a Igreja Romana. Recentemente, li, com surpresa, que o padre e poeta português Tolentino Mendonça foi nomeado pelo Santo Padre, e passo a citar a imprensa, “responsável pelo Arquivo Secreto do Vaticano”. Numa Igreja que se quer e deve ser transparente, que “documentos secretos” existirão nesse arquivo? Depois não se venham queixar dos milhões de livros que se vendem à custa das teorias da conspiração em torno do secretismo do Vaticano. Como historiador, jornalista e católico, não compreendo.
A Cultura oferece oportunidades únicas na comunicação da Fé, mas para isso é indispensável reagir, agir para a solução dos problemas e não esperarmos que alguém o faça por nós.
Fátima 24 Novembro 2018
sábado, 2 de fevereiro de 2019
Vocação divina à santidade-Pe. Rui Silva- DM
Não é raro que, entre os filhos
da Igreja, o problema
da santidade seja olhado
como uma espécie de
mundo longínquo, ao qual
apenas têm acesso as pessoas
que são dotadas por Deus com um
carisma especial. E este carisma parece
apenas ser possível para quem o Senhor
chama a uma vida diferente da habitual.
Ou seja, a santidade é uma chamada reservada
por Deus a uma elite muito escassa,
que tem de responder a um tipo
de vida “sui generis”, que não se enquadra,
de forma alguma, com a existência
normal dum homem ou de uma mulher
que vivem o seu dia a dia no trabalho e
na educação de uma família normal e
corrente que constituíram.
O estado matrimonial é o mais comum
entre as criaturas da nossa natureza.
Deus, desde o primeiro casal – Adão
e Eva, de acordo com o relato bíblico –,
atribuiu-lhe o encargo de crescer e multiplicar-
se para encher e dominar a terra
(Cfr. Gén.1, 28), pelo que o casamento não
é uma situação de inferioridade, mas somente
a via mais habitual que Deus escolheu
para o ser humano, a fim de se realizar
e fazer a sua vontade com a energia
exigida pelo primeiro Mandamento da
Lei de Deus, que nos manda adorá-Lo e
amá-Lo sobre todas as coisas.
Seria estranho que o Senhor tivesse instituído
um sacramento – o do matrimónio
–, que confere a quem o recebe uma graça
especial para dele retirar todo o fruto
que essa mesma graça sacramental pode
conferir, e que esta não fosse a de conduzir
os contraentes à santidade. Nesse caso,
quem se casasse já sabia, de antemão,
que Deus não o chamava a ser santo, mas
a uma vida alheia a essa finalidade, pois só
quem seguisse outros caminhos ascéticos
na obediência à vontade divina é que poderia
aspirar a graus ou teores de existência
mais elevados.
Mais ainda: com o sacramento do Baptismo,
pelo qual nos é concedida a condição
de filhos de Deus (por adopção e não
por natureza, como é evidente), seria muito
estranho que, à partida, o Senhor excluísse
da santidade a esmagadora maioria
dos seus filhos. Dir-se-ia que olhava
com mais simpatia para uns do que para
outros, independentemente da forma e
do grau como O amassem. Ou então, que
só poderiam amá-Lo como verdadeiros
santos, quem seguisse um percurso menos
costumeiro.
Pois bem: Deus chama todos os homens
à santidade. Para ser santo, a todos
exige, com uma paciência e uma compreensão
verdadeiramente paternal e familiar
para com as suas debilidades, que
O procuremos amar como ordena o primeiro
mandamento, independentemente
das circunstâncias e das características
da existência de cada um, desde que, obviamente,
sejam honradas e rectas. Como
alguém observava, Deus não abençoa ou
aprova, apesar da perfeição com que é executada,
a arte de um carteirista exímio...
Na vida da esmagadora maioria dos
cristãos, as suas tarefas e ocupações interligam
o trabalho profissional e o cuidado
do lar da sua família. É essa a panorâmica
das suas obrigações prementes, às quais
não só não deve fugir, como dar-lhes o
seu melhor esforço. É Deus que lho pede:
que nelas seja o mais exemplar possível.
Trabalhar com competência e honestidade
e, se constituiu uma família, procurar
viver no seu seio as exigências próprias
da caridade, com denodo e entrega
generosa, são as notas essenciais do chamamento
divino, que devem espelhar-se
em todos os momentos da sua conduta.
É aí que se realiza a sua vocação, é aí que
Deus o chama com o seu Amor e carinho.
Como sabemos, nem sempre se torna fácil
corresponder a tanto desvelo do nosso
criador. Sonhar com outros horizontes e
pensar numa vocação diferente, onde tudo
se realizasse da melhor maneira, sem luta
e numa espécie de planeta cor-de-rosa,
eis o que Santa Teresa de Ávila designaria
como um fruto da “louca da casa”, isto é,
da nossa imaginação febril, sem freio, de
que o diabo é um hábil condutor e uma
pertinaz fonte de inspiração.
Tudo o que se disse não ignora que o
Senhor, na sua infinita sabedoria e misericórdia,
chama também seus filhos e filhas
para outros tipos de existência, como
a vida religiosa ou sacerdotal. Mas não reduzamos
a estes apelos divinos, diferentes
e menos numerosos, o termo “vocação”.
P. Rui Rosas da Silva antónio maria martins melo
antmelo@braga.ucp.
da Igreja, o problema
da santidade seja olhado
como uma espécie de
mundo longínquo, ao qual
apenas têm acesso as pessoas
que são dotadas por Deus com um
carisma especial. E este carisma parece
apenas ser possível para quem o Senhor
chama a uma vida diferente da habitual.
Ou seja, a santidade é uma chamada reservada
por Deus a uma elite muito escassa,
que tem de responder a um tipo
de vida “sui generis”, que não se enquadra,
de forma alguma, com a existência
normal dum homem ou de uma mulher
que vivem o seu dia a dia no trabalho e
na educação de uma família normal e
corrente que constituíram.
O estado matrimonial é o mais comum
entre as criaturas da nossa natureza.
Deus, desde o primeiro casal – Adão
e Eva, de acordo com o relato bíblico –,
atribuiu-lhe o encargo de crescer e multiplicar-
se para encher e dominar a terra
(Cfr. Gén.1, 28), pelo que o casamento não
é uma situação de inferioridade, mas somente
a via mais habitual que Deus escolheu
para o ser humano, a fim de se realizar
e fazer a sua vontade com a energia
exigida pelo primeiro Mandamento da
Lei de Deus, que nos manda adorá-Lo e
amá-Lo sobre todas as coisas.
Seria estranho que o Senhor tivesse instituído
um sacramento – o do matrimónio
–, que confere a quem o recebe uma graça
especial para dele retirar todo o fruto
que essa mesma graça sacramental pode
conferir, e que esta não fosse a de conduzir
os contraentes à santidade. Nesse caso,
quem se casasse já sabia, de antemão,
que Deus não o chamava a ser santo, mas
a uma vida alheia a essa finalidade, pois só
quem seguisse outros caminhos ascéticos
na obediência à vontade divina é que poderia
aspirar a graus ou teores de existência
mais elevados.
Mais ainda: com o sacramento do Baptismo,
pelo qual nos é concedida a condição
de filhos de Deus (por adopção e não
por natureza, como é evidente), seria muito
estranho que, à partida, o Senhor excluísse
da santidade a esmagadora maioria
dos seus filhos. Dir-se-ia que olhava
com mais simpatia para uns do que para
outros, independentemente da forma e
do grau como O amassem. Ou então, que
só poderiam amá-Lo como verdadeiros
santos, quem seguisse um percurso menos
costumeiro.
Pois bem: Deus chama todos os homens
à santidade. Para ser santo, a todos
exige, com uma paciência e uma compreensão
verdadeiramente paternal e familiar
para com as suas debilidades, que
O procuremos amar como ordena o primeiro
mandamento, independentemente
das circunstâncias e das características
da existência de cada um, desde que, obviamente,
sejam honradas e rectas. Como
alguém observava, Deus não abençoa ou
aprova, apesar da perfeição com que é executada,
a arte de um carteirista exímio...
Na vida da esmagadora maioria dos
cristãos, as suas tarefas e ocupações interligam
o trabalho profissional e o cuidado
do lar da sua família. É essa a panorâmica
das suas obrigações prementes, às quais
não só não deve fugir, como dar-lhes o
seu melhor esforço. É Deus que lho pede:
que nelas seja o mais exemplar possível.
Trabalhar com competência e honestidade
e, se constituiu uma família, procurar
viver no seu seio as exigências próprias
da caridade, com denodo e entrega
generosa, são as notas essenciais do chamamento
divino, que devem espelhar-se
em todos os momentos da sua conduta.
É aí que se realiza a sua vocação, é aí que
Deus o chama com o seu Amor e carinho.
Como sabemos, nem sempre se torna fácil
corresponder a tanto desvelo do nosso
criador. Sonhar com outros horizontes e
pensar numa vocação diferente, onde tudo
se realizasse da melhor maneira, sem luta
e numa espécie de planeta cor-de-rosa,
eis o que Santa Teresa de Ávila designaria
como um fruto da “louca da casa”, isto é,
da nossa imaginação febril, sem freio, de
que o diabo é um hábil condutor e uma
pertinaz fonte de inspiração.
Tudo o que se disse não ignora que o
Senhor, na sua infinita sabedoria e misericórdia,
chama também seus filhos e filhas
para outros tipos de existência, como
a vida religiosa ou sacerdotal. Mas não reduzamos
a estes apelos divinos, diferentes
e menos numerosos, o termo “vocação”.
P. Rui Rosas da Silva antónio maria martins melo
antmelo@braga.ucp.
À Laia de Testemunho, por Helena Babo- UAASP em Angola
Para mim não chegaram a 10 dias, mas foram de uma intensidade esmagadora.
Um pais onde nasci, mas que nunca conheci e que tive agora a oportunidade de percorrer no que tem de mais perdido e esquecido.
Um pais, uma região onde o Governo aparentemente se demitiu de todas as suas funções e onde homens e mulheres com pouco mais do que a sua vontade tentam de alguma forma substitui-lo, suprimindo algumas necessidades fundamentais de um povo.
Uma missão onde fomos convidados a experimentar as condições em que trabalham os Missionários, partilhando alojamento e alimentação em iguais condições, bem como os pequenos trabalhos em que participámos, ajudando na preparação da população que acorreu para participar em pequenas formações, nas consultas, nos trabalhos diários, nas costuras, nas pequenas reparações e novas construções, etc.
Ainda o contacto com as populações de hábitos tão diferentes, muitos consequência de anos de guerra e esquecimento, mas, quem sabe, talvez felizes nas suas formas de vida.
Com a certeza que muito ficou por fazer e que mais teríamos para dar perante tamanha carência de meios, de estudos, de expectativas.
Este é o meu testemunho:
O acesso à água potável: A água, de qualidade duvidosa tem que ser fervida ou tratada e é maioritariamente transportada pelas mulheres em alguidares à cabeça.
O acesso aos cuidados de saúde: as consultas são realizadas pelas missionárias cuja formação é feita de muita experiência e boa vontade e a maioria dos medicamentos são os básicos paracetamol e ibuprofeno.
A habitação: pequenas casas de pau a pique e de um só compartimento, revestido de adobe e telhados de colme ou chapa de zinco, contemplam espaço para algumas enxergas, normalmente incorporadas na estrutura da casa. As cozinhas feitas no exterior recorrendo à mesma técnica, muitas sem parede de adobe.
A recolha do lixo: inexistente. O lixo acumula-se a céu aberto trazendo às povoações maiores um cheiro nauseabundo.
O acesso à alimentação: alimentam-se essencialmente de Funje. Na beira da estrada encontram-se inúmeras bancas de venda de fruta e legumes, peixe seco e carvão. A fruta é deliciosa. Na cidade há um mercado grande onde se podem encontrar também as famosas capulanas, roupa de mulher.
O acesso à educação: as escolas são edifícios iguais às habitações com troncos no chão que servem de bancos corridos. Os professores são escassos e com pouca formação, mas mesmo assim muitas crianças, que são às centenas, não têm escola por falta de professores.
Os acessos às povoações e lugares mais recônditos: o acesso às zonas mais recônditas é feito por picadas difíceis com dispêndio de muitas horas nas viagens. Nós levámos mais de oito horas a percorrer cerca de 130 km. As paisagens enchem o olho e compensam muita coisa.
Ficou-nos o profundo respeito e
admiração pelos missionários que, por mão da sua incansável vontade, vencem os
caminhos quase inexistentes para dar alguma esperança e conforto a este povo.
Que procuram soluções para
promover condições básicas, mas que representam o desenvolvimento e, acima de
tudo, apontam o caminho.
Coisas simples, como uma cisterna
de água, uma pequena moagem de milho para uso da população, uma pequena fábrica
a construir os primeiros tijolos de terra comprimida.
E os planos futuros de captação e
canalização de água para um ponto elevado que possa depois distribuir a mesma
em várias direções, os projetos de regadio, os projetos de construção de
edifícios com os novos tijolos, como uma igreja, uma escola, casas, etc.
E tem que ser a estes homens e
mulheres que dedico este testemunho.
Ao Padre David, “cabecilha” atual
e repetente desta obra, tem em mim uma irmã e pode contar sempre comigo, assim
eu o consiga ajudar pois a minha divida é grande, foi o ombro amigo num dia
difícil
À mana Teresa, pela paciência com
que nos recebeu e a tudo tentou atender e resolver, ao trabalho titânico que
tem prestado a este povo, o meu total reconhecimento e amizade.
À jovem Sílvia, companheira
destes dias tão intensos, pelo espírito de interajuda e abertura para tudo aprender
e absorver como uma pequena esponja que vai inchando, os votos de um futuro
gordo em experiências e que te preencha e faça feliz e a
minha amizade.
O meu profundo reconhecimento
também para o Avô Filipe, homem que tanto sofreu, como tantos outros provavelmente,
nesta longa vida e que sobreviveu para nos receber com o seu sorriso e a sua
cozinha.
Ao Carlos, pai de família, pela
sua vontade de ajudar e fazer o máximo possível antes do seu regresso.
Por fim às meninas da missão,
votos de que consigam estudar e alcançar os seus sonhos e contribuir para o
desenvolvimento do seu país, que é também um pouco meu. Delas e doutros como
elas está dependente o caminho deste país.
Helena Cristina Babo
Subscrever:
Mensagens (Atom)