segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

DESPOLUIR A NATUREZA E A IGREJA Frei Bento Domingues, O.P.

Salvo o tom panfletário, próprio dos jornalistas, parece-me uma reflexão muito interessante…


1. O poema bíblico da criação, ao celebrar a vitória sobre o caos e ao exaltar a harmonia humana e divina do universo, é fundamental para não desesperarmos dos trabalhos que exige a sua urgente recriação[1].

O desequilíbrio ecológico tem muitas causas. Mas as crenças que exaltam o individualismo, o progresso ilimitado, a concorrência irracional, o consumismo, o mercado sem regras movido apenas pela ganância, tendem a ignorar que não vale tudo. Esquecem que não dispomos de outro universo suplente como alguma imaginação delirante supõe.

Sem o sentido do sagrado, do mistério, sem sabedoria e ética, consentimos, dia a dia, em degradar a natureza que nos degrada a todos. Dispomos, no entanto, de recursos científicos e técnicos para poder dizer que, hoje, pode ser mais harmonioso do que ontem.

As televisões encheram-se de imagens do fogo que, em Portugal no longo verão de 2017, dizimou a floresta em grande escala associada à tragédia da morte de dezenas de pessoas. A destruição em curso da Amazónia, pulmão da humanidade, foi ridicularizada pelo próprio presidente do Brasil. A Austrália em chamas tornou-se irreconhecível. Como se tornou hábito repetir, sem grande convicção, a crise climática tornou-se a questão incontornável. O próprio Papa a propôs na Encíclica Laudato Si’ que explicita contributos fundamentais sobre a educação ambiental e a conversão ecológica[2]. Lamentavelmente, ainda não penetrou na pastoral constante das paróquias e dos movimentos da Igreja Católica.

O contributo dos cientistas e a mobilização da opinião pública são indispensáveis para se criar um ambiente social e cultural que leve os decisores políticos a tomar medidas colectivas de âmbito mundial, pois a crise afecta o futuro de todos os povos. A revista Time elegeu, em 2019, a jovem Greta Thunberg Personalidade do Ano pela coragem interpelante da sua intervenção. Goste-se ou não do estilo, mostrou grande eficácia entre os jovens.

A Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, em Madrid (02-15.12.2019) mostrou sobretudo o caminho que falta percorrer para vencer a cegueira dos países com maiores responsabilidades mundiais. A urgência era clara: em 2019 teria de haver um compromisso efectivo que reforçasse os objectivos decididos no Acordo de Paris de 2015, quanto às políticas para limitar o aquecimento global. Foi impossível chegar a esse compromisso.

 A geopolítica de Madrid revelou que, do lado dos que diziam "não" ao compromisso, estavam os EUA, o Brasil, a Índia e a China; do lado oposto, estava uma coligação de pequenos Estados insulares – os mais afectados pelos efeitos das alterações climáticas, como a subida do nível das águas – e a União Europeia.

2. Não é saudável ficar no reino poluído das lamúrias. Importa por isso destacar que, no passado dia 11, Lisboa recebeu o “testemunho” de Oslo, o prémio de Capital Verde Europeia 2020. Não é de admirar que na cerimónia oficial de abertura estivessem presentes: Marcelo Rebelo de Sousa, António Guterres, António Costa e o presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina.

Este galardão parecia um privilégio das cidades do Norte, pois é a primeira vez que é reconhecido a uma cidade do Sul. Mas este reconhecimento dos passos já dados e dos projectos em vias de execução são, para Lisboa, sobretudo um encargo acerca do que falta fazer em espaços verdes, transportes públicos, ciclovias, alterações climáticas, eficiência energética, uso da água, lixo e reciclagem.

É algo explicitamente assumido pela autarquia, mas que será impossível realizar sem o empenhamento voluntário e militante dos cidadãos.

Isto é possível. Por exemplo, se o objectivo da autarquia é ter mais 100 mil árvores na cidade até 2021, em relação às 800 mil existentes actualmente, no passado Domingo, mais de 4500 pessoas plantaram 20 mil árvores em 4 locais de Lisboa, como arranque da cidade Capital Verde Europeia 2020. O Programa, ao longo do ano, para sensibilizar a opinião pública, prevê um conjunto de conferências, iniciativas com escolas e universidades, espectáculos, exposições e festivais sobre o tema da sustentabilidade ambiental. Estes eventos devem ser um incentivo para que não seja apenas um acontecimento local, mas inspirador do que é possível fazer em todo o país.

3. O Domingo é a Páscoa semanal, anterior à solenidade anual e, também, à escrita dos textos do Novo Testamento (NT). É um acontecimento originante para que toda a semana permaneça aberta à experiência espiritual da transcendência. O ser humano não deve exercer apenas o seu domínio sobre a natureza. Pertence-lhe estabelecer com ela uma “relação franciscana”, como diz P. Ricoeur, uma atitude de contemplação poética que inspire criação e recriação de beleza. É o grande dia ecológico.

Para os cristãos, sem a celebração da Eucaristia – partilha do pão e do vinho, fruto do trabalho humano – o Domingo perde o seu Espírito. Por azares da história, a disciplina actual dos ministérios ordenados impede o acesso de muitas comunidades à celebração mais central da fé cristã. O mandato de Jesus – tomai e comei, tomai e bebei – é traído por desinteligência do que é o sacerdócio e do que são os ministérios na Igreja.

No NT, o grande sacerdote é Cristo que deu a vida por todos. Sacerdotes são todos os que, pelo Baptismo, renascem para a vida cristã. Os padres e os bispos são serviços do sacerdócio de Cristo e do povo cristão. São funções da comunidade para a comunidade. É para isso que são ordenados. Não é para mandar como julgava a imaturidade dos discípulos que Jesus escolheu e com os quais lutou até ao fim, para a sua conversão: quem quiser ser o primeiro coloque-se ao serviço de todos, porque o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida por todos.

Celibato ou não celibato não estão ligados, ontologicamente, ao exercício dos ministérios ordenados. O carisma do celibato não é, de si, o carisma de um padre ou de um bispo. Na Igreja Católica houve sempre mulheres e homens que optaram por viver o celibato como uma grande graça e é característica de todas as congregações religiosas.

O cardeal Ratzinger foi Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. Enquanto tal, criou o deserto teológico na Igreja Católica. Queria ser o único. Foi eleito Papa e resignou porque já não se sentia com forças para enfrentar a poluição do Vaticano. Não é Papa emérito, não é Papa, pura e simplesmente. Neste momento, não há dois Papas. Não lhe fica bem alinhar com a campanha dos adversários das reformas urgentes propostas pelo único Papa actual.



19. Janeiro. 2020



[1] Génesis 1; 2, 1-4
[2] Laudato Si’, nºs 210-216

segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

QUE MEDIAÇÕES PARA O CONFLITO ENTRE OS EUA E O IRÃO? Frei Bento Domingues, O.P.


1. O sistema eleitoral dos EUA deu o poder a Donald Trump, mas não é esse sistema que lhe dá um poder absoluto. Entretanto, ele já manifestou que a sua vontade de manipulação e de arbitrariedade não tem limites. Vale tudo para atingir os seus perversos objectivos e sem qualquer respeito pela lei internacional. Depois do assassinato de Qasem Soleimani ameaça bombardear o Património da Humanidade no Irão.

Há quem diga que D. Trump, em vez de neutralizar os objectivos e os métodos do terrorismo, tornou-se ele próprio um terrorista, com a agravante de dispor de recursos da maior potência mundial que se tornou responsável pela desordem incontrolável do Médio Oriente.

 Parece que não existem apenas líderes burocratas e carismáticos. Existem também os asnáticos e os satânicos. Da ganância e da vontade de dominação do outro nascem todas as formas de diferenciar e potenciar a violência. As pulsões do desejo de provocar e dominar o outro deveriam ser dominadas pela cultura do reconhecimento mútuo. Fora deste horizonte, não se vê limite à escalada da violência. Dizem todos que não querem a guerra, mas fazem-na.

 Da Grécia herdamos a beleza e a filosofia, de Roma herdamos o direito e do Cristianismo essencial recebemos a convicção de que o ser humano não tem preço. É valor incalculável. Como escreveu Teixeira de Pascoaes, «basta a miséria de um desgraçado, para que todos nós sejamos miseráveis». Não esperemos que o próximo se torne bom para lhe fazer bem, como diz o Papa Francisco.

2. António Marujo refere-se, no 7Margens, à sugestão de John Allen Jr., no Crux do passado Domingo, sobre a possibilidade do Papa Francisco e do Vaticano assumirem o papel de mediadores entre os EUA e Irão. Em que se apoia John Allen para insistir nessa possibilidade?

Este jornalista norte-americano, sediado em Roma, recorda que os EUA e o Irão estão de relações diplomáticas cortadas desde 1980, no âmbito da crise dos reféns da embaixada norte-americana. A partir daí, as comunicações diplomáticas são feitas através da embaixada suíça em Teerão. Por outro lado, o Vaticano tem relações diplomáticas com o Irão desde 1954, 30 anos antes dos EUA; os líderes da revolução islâmica iraniana sempre quiseram ter bons contactos com o Vaticano para não ficarem um Estado-pária, como os EUA desejavam; o Irão é o segundo país com mais diplomatas credenciados junto do Vaticano e tem apreciado a orientação da política do Vaticano acerca da guerra na Síria, que não passa pela exigência de destituição do presidente Bashar al-Assad.

Aponta ainda outro elemento que poderia facilitar esta aproximação: em Abril de 2019, o Dicastério para a Promoção do Desenvolvimento Humano Integral enviou, em nome do Papa, 100 mil euros para ajuda das dezenas de milhares de iranianos atingidos por uma vaga de fortes inundações (…).

Reproduzi parte da argumentação de John Allen, para que o leitor possa medir o seu peso e os seus limites. Observa que o Papa Francisco pode ter actualmente mais dificuldade em conseguir o diálogo com o presidente dos EUA. Em diversas ocasiões, o Papa manifestou desagrado com várias das decisões políticas da actual administração dos EUA. Mas acrescenta: de qualquer modo, vários líderes católicos têm influência no governo de Donald Trump[i].

Uma mediação supõe ajudar a evolução das partes em conflito e o êxito nunca está garantido, mas aconteça o que acontecer, o Papa não desiste de encontrar caminhos para a paz: «A guerra traz apenas morte e destruição. Peço que todas as partes mantenham acesa a chama do diálogo e do autocontrolo, esconjurando a sombra da inimizade. Lembro ainda o compromisso que assumimos no início do ano: A paz como caminho de esperança – diálogo, reconciliação e conversão ecológica. Com a graça de Deus, poderemos colocá-lo em prática. Devemos acreditar que o outro tem, como nós, a mesma necessidade de paz».

3. Apesar das dificuldades da mediação desejada, não é algo que esteja fora da melhor tradição vaticana. Não podemos esquecer o papel fundamental de João XXIII na chamada crise dos mísseis em Cuba, em 1962. Nunca como então, ao longo da guerra fria, foi tão próxima a sensação de se estar diante do abismo. Kennedy e Kruchtchev acabaram por reconhecer que não podiam continuar pelo caminho que levaria à guerra termonuclear. O Papa, ao reconhecer que a sua intervenção tinha sido determinante na resolução do conflito, resolveu publicar uma encíclica que apontasse os caminhos para a instauração da paz mundial. Daí surgiu a Pacem in terris (11. 04. 1963) que teve um êxito retumbante.

Foi calorosamente recebida por U Thant, secretário geral das Nações Unidas, pelo porta-voz do Conselho da Europa em Estrasburgo que a considerou «uma das grandes Cartas da História», pelo Prof. Bernal, presidente-delegado do Conselho Mundial da Paz, escrevendo ao Papa: «Os homens hão-de lembrar-se sempre com muita gratidão do vosso apelo que inspirará não só os que trabalham pela paz, mas também os milhões de seres humanos aos quais até ao presente tem faltado a confiança e a esperança para agir nesse sentido».

O governo dos EUA formulou, pela primeira vez, um comentário a uma encíclica. O porta-voz do Departmento de Estado disse, em resumo: «Pacem in terris é uma encíclica histórica, de importância mundial». Kennedy fez dela o seu guia: «Como católico sinto-me ufano e como americano recebi ensinamentos… Estamos em vias de aprender a falar a lingugem do progresso e da paz, por cima das barreiras das seitas e dos credos».

Da Rússia Soviética não faltaram declarações e comentários através da agência oficial Tass, do jornal «Iszvestia», órgão do governo, e do próprio Kruchtchev que, a um diário italiano, disse: «Muitos registam hoje que o Papa João XXIII tem uma atitude realista sobre uma série de questões das mais escaldantes da nossa época e, em primeiro lugar, sobre o problema da paz e do desarmamento. Nós aplaudimos tal posição do Papa João XXIII em favor da paz».

Após dias seguidos de ameaças, ao terminar este texto, veio a notícia de que o Irão retaliou a morte do comandante militar Qasem Soleimani com ataques a duas bases aéreas americanas no Iraque.

Os EUA e o Irão declaram que não querem a guerra, mas estão a promover uma guerra mundial aos bocados como o Papa Francisco tem avisado.

Hoje, celebramos o Baptismo de Jesus. É um mergulho no Espírito da paz a construir por todas as pessoas de boa vontade.



12. 01. 2020



[i] Cf. E se for o Vaticano a mediar o conflito crescente entre EUA e Irão?, 7Margens (06.01.2020)


quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

O NOSSO FUTURO É AGORA Frei Bento Domingues, O.P.


1. Em alguns ambientes, a espiritualidade está na moda. Quase se poderia dizer: espiritualidade sim, religião não. Quem assim se exprime pode ter muitas queixas das crenças, dos rituais e dos preceitos das instituições religiosas ou, apenas, preconceitos. Raramente é fruto de investigação, de estudo. A investigação e o estudo parecem reservados ao domínio das ciências. A espiritualidade apela à subjectividade de quem não se contenta com o mundo empírico e procura não só um sentido para a vida, mas formas de viver esse sentido. Existem sabedorias e espiritualidades sem qualquer afirmação explícita de Deus como acontece, por exemplo, no budismo, mas não só.

No campo católico, a espiritualidade sempre se conjugou no plural. Por exemplo, espiritualidade beneditina, franciscana, dominicana, carmelita, inaciana e as espiritualidades das congregações religiosas dos séculos XIX e XX. Se elas marcaram a história também a história as marcou a todas. Actualmente, devido à secularização do Ocidente, a grande moda são as importações das chamadas espiritualidades orientais, quase sempre bem destiladas.

O anti-intelectualismo, no campo religioso e espiritual, é, hoje, de regra entre os cristãos em geral e até entre seminaristas, padres e membros de congregações religiosas[1]. Parece que a razão cientifico-técnica esgotou todas as formas de razão. No entanto, a mística de Santa Teresa de Jesus e de S. João da Cruz nunca dispensou a companhia de grandes teólogos. A escola renana casou a mística com a teologia, como se pode observar no mestre Eckhart!

Fala-se facilmente de espiritualidade bíblica ou patrística, dispensando as exigências do conhecimento árduo dos mundos bíblicos ou patrísticos.

Dizer isto não significa desprezo pela dimensão mística da vida e dos seus caminhos. Mesmo os místicos são pouco estudados. As observações feitas referem-se, sobretudo, às espiritualidades género chá de tília e comércio de auto-ajuda, onde há de tudo.

2. Pelo Natal e pela Páscoa, são frequentes as publicações sobre as fontes cristãs da cultura ocidental. Este ano, em parceria com a Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de Jerusalém, Le Figaro/Hors-Serie reuniu biblistas, arqueólogos, historiadores e teólogos para examinar o Caso Jesus no crivo da História. Narra as principais etapas da sua missão, decifrando os sete erros mais comuns sobre Jesus: analisa o seu julgamento, a revolução religiosa da qual ele foi o instigador, os retractos de Maria, João-Baptista, Maria Madalena, Pôncio Pilatos, etc..

Está sumptuosamente ilustrado por Giotto, Bosch, os mestres vidreiros de Chartres, escultores românicos e góticos, Ghirlandaio, Titoiano, Tintoretto, Tiepolo, Fra Angélico e muitos mais, para dar às narrativas do Novo Testamento as expressões mais célebres da vida de Jesus Cristo no esplendor da arte ocidental.

O conjunto é coroado por uma longa entrevista ao P. Olivier-Thomas Venard, O.P., sobre o colossal programa BEST (Bíblia E Suas Tradições), da Escola Bíblica de Jerusalém, que coordena dezenas de investigadores para uma edição comentada das diferentes versões da Bíblia. Renova totalmente a sua leitura, dando livre acesso às suas diferentes versões, comentadas versículo a versículo, do ponto de vista teológico, histórico, arqueológico, artístico, literário… A abordagem da Bíblia, nas suas tradições, é um programa lançado para ter em conta as grandes metamorfoses das ciências bíblicas nos últimos cinquenta ou sessenta anos. BEST propõe-se recolocar a Bíblia no coração das culturas e das civilizações de que se alimentou e que ela, por sua vez, influenciou.

Não se esqueça, porém, que, no dizer de Teixeira de Pascoaes, «A Bíblia é um Epitáfio, um livro escrito. Mas o Livro da Vida, citado por S. Paulo, existe na inspiração dos Poetas, eternamente irredutível a papel e tinta ou a qualquer substância morta»[2]. De facto, na 2ª Carta aos Coríntios, está dito: é Deus «que nos torna aptos para sermos ministros de uma nova aliança, não da letra, mas do Espírito; porque a letra mata, enquanto o Espírito vivifica»[3]. Tomás de Aquino sublinha que a própria letra dos textos do Novo Testamento mata se não for acolhida como voz do Espírito que o inspirou.

3. Já estamos no novo ano. O Frei José Nunes, provincial dos dominicanos, na sua mensagem de votos de Bom Ano, recordou a sabedoria da Mafalda Quino: as pessoas esperam que o ano que vem aí seja melhor que o anterior, mas não esqueçamos que o ano que vem aí também espera que as pessoas sejam melhores! É um ano para a nossa conversão que tem muitas dimensões.

Olafur Eliasson, no catálogo da exposição que fez em Serralves, no ano passado, escreveu: «não olhemos para o passado para definir o presente. O nosso agora passou a ser definido pelo futuro. As projecções sobre as consequências das nossas acções de hoje começaram a moldar e a orientar as nossas vidas. E isto é novo. A concepção do mundo da minha geração e das gerações anteriores foi definida por noções do passado, de consumismo, de crescimento, de acumulação de riqueza – e não posso fingir estar isento a essa perspectiva. Vimos o presente através da lente do que o tinha precedido. Esperávamos que o mundo fosse previsível e que o futuro se baseasse no passado. Hoje em dia, na era do Antropoceno, tornou-se claro que temos de mudar de atitude – o presente e o futuro estão a tornar-se cada vez mais imprevisíveis. A natureza já não nos pertence (nunca pertenceu) para a explorar livremente; somos parte dela. Agora é evidente que não podemos continuar a viver como vivemos no passado e que todos os aspectos da sociedade se terão de adaptar à crise climática. Muito do que hoje tomamos por garantido como uma actividade normal, como algo que fazemos diariamente, tornar-se-á obsoleto ou até ilegal daqui a dez anos. A geração mais jovem está ciente disso. Eles começaram a ver o presente à luz do futuro que eles próprios têm de moldar, aqui e agora. Não se trata apenas de viver de forma ecológica; trata-se também do nosso sentido de justiça»[4].

Hoje, Domingo da Epifania, é dia da revelação de um Deus pobre, humanado e irmanado com os pobres. Desse Deus, os sacerdotes das religiões nunca ouviram falar, como conta Sophia de M. B. Andresen[5].

Tornemos bom 2020!



5. 12. 2020



[1] Mariano Ruiz Campos, Por qué cuesta tanto apreciar la labor del teólogo hoy?, Teología Espiritual LXI (2017), 309-350
[2] Teixeira de Pascoaes, Aforismos, Assírio & Alvim, 1998, p. 39
[3] 2 Cor 3, 6
[4] O v/nosso futuro é agora, pp.51-52
[5] Os três Reis do Oriente, in Contos exemplares.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

FERNANDO PAULO - Homenageado em Viseu


O município de Viseu prestou homenagem ao Antigo Aluno Comboniano, Fernando Paulo, atribuindo-lhe o Diploma de Honra do Município. Parabéns Fernando Paulo por mais este reconhecimento da tua brilhante carreira académica.
A este propósito dirigi ao Jornal da Beira e ao Jornal do Centro a seguinte manifestação de desagrado por terem ignorado nas suas páginas este acontecimento regional:

Exmos Senhores

No dia 16 do passado mês de dezembro foi atribuido ao Prof. Doutor Fernando Paulo do Carmo Baptista pelo Exmo Senhor Presidente da Assembleia Municipal de Viseu, Dr Mota Faria, o Diploma de Honra do Município de Viseu. Este ilustre académico, nacional e internacionalmente reconhecido, é um dos elementos da Associação dos Antigos Alunos Combonianos a cuja direcção presido. Trata-se , por conseguinte, de um associado que muito ilustra a nossa Associação e os bancos da Escola Comboniana ( o Seminário das Missões de Viseu, entre outros) onde moldou o seu caracter e desenvolveu o gosto pela investigação académica e actividade docente.

Muito nos decepcionou o facto de não termos encontrado nas páginas do vosso Jornal qualquer referência a este acontecimento. Os vossos leitores, muitos deles entre as várias centenas de Antigos Alunos do Seminário das Missões, ficariam certamente muito satisfeitos por saberem da homenagem que desta forma foi prestada a um dos seus.

Certo de que ainda estão a tempo de corrigir este lapso de todo incompreensível, subscrevo-me com muita estima e consideração.

António Pinheiro

Direcção da Associação dos Antigos Alunos Combonianos