sábado, 2 de fevereiro de 2019

À Laia de Testemunho, por Helena Babo- UAASP em Angola


Para mim não chegaram a 10 dias, mas foram de uma intensidade esmagadora.
Um pais onde nasci, mas que nunca conheci e que tive agora a oportunidade de percorrer no que tem de mais perdido e esquecido.

Um pais, uma região onde o Governo aparentemente se demitiu de todas as suas funções e onde homens e mulheres com pouco mais do que a sua vontade tentam de alguma forma substitui-lo, suprimindo algumas necessidades fundamentais de um povo.

Uma missão onde fomos convidados a experimentar as condições em que trabalham os Missionários, partilhando alojamento e alimentação em iguais condições, bem como os pequenos trabalhos em que participámos, ajudando na preparação da população que acorreu para participar em pequenas formações, nas consultas, nos trabalhos diários, nas costuras, nas pequenas reparações e novas construções, etc.

Ainda o contacto com as populações de hábitos tão diferentes, muitos consequência de anos de guerra e esquecimento, mas, quem sabe, talvez felizes nas suas formas de vida.

Com a certeza que muito ficou por fazer e que mais teríamos para dar perante tamanha carência de meios, de estudos, de expectativas.

Este é o meu testemunho:

O acesso à água potável: A água, de qualidade duvidosa tem que ser fervida ou tratada e é maioritariamente transportada pelas mulheres em alguidares à cabeça.

O acesso aos cuidados de saúde: as consultas são realizadas pelas missionárias cuja formação é feita de muita experiência e boa vontade e a maioria dos medicamentos são os básicos paracetamol e ibuprofeno.

A habitação: pequenas casas de pau a pique e de um só compartimento, revestido de adobe e telhados de colme ou chapa de zinco, contemplam espaço para algumas enxergas, normalmente incorporadas na estrutura da casa. As cozinhas feitas no exterior recorrendo à mesma técnica, muitas sem parede de adobe.

A recolha do lixo: inexistente. O lixo acumula-se a céu aberto trazendo às povoações maiores um cheiro nauseabundo.

O acesso à alimentação: alimentam-se essencialmente de Funje. Na beira da estrada encontram-se inúmeras bancas de venda de fruta e legumes, peixe seco e carvão. A fruta é deliciosa. Na cidade há um mercado grande onde se podem encontrar também as famosas capulanas, roupa de mulher.

O acesso à educação: as escolas são edifícios iguais às habitações com troncos no chão que servem de bancos corridos. Os professores são escassos e com pouca formação, mas mesmo assim muitas crianças, que são às centenas, não têm escola por falta de professores.

Os acessos às povoações e lugares mais recônditos: o acesso às zonas mais recônditas é feito por picadas difíceis com dispêndio de muitas horas nas viagens. Nós levámos mais de oito horas a percorrer cerca de 130 km. As paisagens enchem o olho e compensam muita coisa.

Ficou-nos o profundo respeito e admiração pelos missionários que, por mão da sua incansável vontade, vencem os caminhos quase inexistentes para dar alguma esperança e conforto a este povo.

Que procuram soluções para promover condições básicas, mas que representam o desenvolvimento e, acima de tudo, apontam o caminho.

Coisas simples, como uma cisterna de água, uma pequena moagem de milho para uso da população, uma pequena fábrica a construir os primeiros tijolos de terra comprimida.

E os planos futuros de captação e canalização de água para um ponto elevado que possa depois distribuir a mesma em várias direções, os projetos de regadio, os projetos de construção de edifícios com os novos tijolos, como uma igreja, uma escola, casas, etc.

E tem que ser a estes homens e mulheres que dedico este testemunho.

Ao Padre David, “cabecilha” atual e repetente desta obra, tem em mim uma irmã e pode contar sempre comigo, assim eu o consiga ajudar pois a minha divida é grande, foi o ombro amigo num dia difícil

À mana Teresa, pela paciência com que nos recebeu e a tudo tentou atender e resolver, ao trabalho titânico que tem prestado a este povo, o meu total reconhecimento e amizade.

À jovem Sílvia, companheira destes dias tão intensos, pelo espírito de interajuda e abertura para tudo aprender e absorver como uma pequena esponja que vai inchando, os votos de um futuro gordo em experiências e que te preencha e faça feliz e a minha amizade.

O meu profundo reconhecimento também para o Avô Filipe, homem que tanto sofreu, como tantos outros provavelmente, nesta longa vida e que sobreviveu para nos receber com o seu sorriso e a sua cozinha.

Ao Carlos, pai de família, pela sua vontade de ajudar e fazer o máximo possível antes do seu regresso.

Por fim às meninas da missão, votos de que consigam estudar e alcançar os seus sonhos e contribuir para o desenvolvimento do seu país, que é também um pouco meu. Delas e doutros como elas está dependente o caminho deste país.

Helena Cristina Babo

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