domingo, 20 de abril de 2025

Conta-nos, Maria: o que viste no caminho?” - P. Manuel João Pereira Correia, MCCJ

 Conta-nos, Maria: o que viste no caminho?”

Ano C – Domingo de Páscoa
João 20,1-9: “Ele devia ressuscitar dos mortos”

A Morte e a Vida enfrentaram-se
num prodigioso duelo.
O Senhor da Vida estava morto;
mas agora, vivo, triunfa”.
(Sequência Pascal)

Chegámos à Páscoa do Senhor, percorrendo o caminho proposto pela Igreja, nossa mãe. Após a Quaresma, entrámos no Tríduo Pascal. O que vivemos nestes três dias ficou impresso no nosso coração. Vimos o Amor ajoelhado aos nossos pés. Assistimos ao Amor escarnecido, cuspido, pregado na cruz. Por fim, acolhemos o Amor, morto, nos nossos braços e, chorando e batendo no peito, sepultámos o Amor. Parecia que tudo tinha acabado. Esquecemo-nos, no entanto, que o amor nunca morre. É uma semente carregada de potência de vida que, caída em terra, dá muito fruto. E hoje, dia de Páscoa, a vida irrompe do sepulcro!

A Páscoa é o triunfo inesperado da Vida que faz renascer a Esperança certa. A Páscoa é a estrela da manhã que ilumina a noite profunda e abre o caminho para o sol do meio-dia. A Páscoa é a explosão da primavera que inaugura o tempo da beleza, a estação das cores, do canto e das flores. A Páscoa é o início da nova criação!

Maria, a mulher da alvorada

Mas deixemos que seja Maria Madalena a contar-nos a Páscoa. Ela, a mulher da alvorada gloriosa, a primeira anunciadora da ressurreição de Cristo. Maria Madalena - como concordam todos os evangelistas - é detentora de um testamento de primeira mão, primícia feminina, “apóstola dos apóstolos”, como a chamam os antigos Padres da Igreja. Ela é a imagem perfeita da Igreja, esposa apaixonada que passa a noite à procura do seu Amado. O seu amor apaixonado pelo Mestre manteve o seu coração acordado durante toda a noite da grande “passagem”; “Eu durmo, mas o meu coração vigia” (Cântico dos Cânticos 5,2). E, porque o amor a fez vigiar, o Amado se mostrou primeiro a ela.

É a ela que queremos perguntar: “Conta-nos, Maria: o que viste no caminho?”. Conta-nos com o ardor da tua paixão. Deixa-nos contemplar nos teus olhos o que o teu coração viu! Porque o testemunho de um apóstolo não tem valor, se não for vivido com a tua mesma paixão!

Conta-nos, Maria: o que viste no caminho?
«O sepulcro do Cristo vivo, a glória do Cristo ressuscitado, e os seus anjos testemunhas, o sudário e as suas vestes. Cristo, minha esperança, ressuscitou: precede os seus em Galileia».
Sim, estamos certos: Cristo ressuscitou de verdade.”
(Sequência do Domingo de Páscoa).

Maria, a “amante”

O que caracteriza Maria Madalena? Um grande amor! Ela é uma mulher apaixonada por Jesus, que não se conforma com a perspectiva de perdê-lo e se agarra a aquele corpo inerte como última oportunidade de poder tocar “aquele que o seu coração ama” (Cântico dos Cânticos 3,1-4). Se o “discípulo amado” (talvez o próprio apóstolo São João, segundo a tradição) é o protótipo do discípulo, Maria Madalena é, de certa forma, o seu correspondente feminino (sem, com isso, ofuscar a figura da Virgem Maria). Maria Madalena é a “discípula preferida” e a “primeira apóstola” de Cristo Ressuscitado. Ela, chamada duas vezes pelo nome genérico de “mulher”, representa a nova humanidade sofredora e redimida, a Eva convertida pelo Amor do Esposo, aquele amor perdido no jardim do Éden e agora recuperado no novo jardim (João 19,41) onde tinha descido o seu Amado (Cântico dos Cânticos 5,1).

Ficar e chorar

A vocação de Maria Madalena é animada pelo amor e, ao mesmo tempo, pela fé. Fé e amor são ambos necessários: a fé dá força para caminhar, o amor dá-lhe asas para voar. A fé sem amor não arrisca, mas o amor sem fé pode perder-se em muitos cruzamentos. A esperança é filha de ambos.

São o amor e a fé que fazem Maria Madalena ficar perto do sepulcro, chorar e esperar. Mesmo sem saber bem o porquê. Ao contrário dos dois apóstolos Pedro (figura da fé) e João (figura do amor), que se afastam do sepulcro, a mulher, que reúne em si ambas as dimensões, “fica” e “chora”. O seu ficar é fruto da fé, o seu chorar é fruto do amor. “Ficar” porque a sua fé persevera na busca, não se desanima diante do insucesso, interroga (os anjos e o jardineiro), como a Amada do Cântico dos Cânticos. Espera contra toda a esperança! Até que, ao encontrar o Amado, se atira aos seus pés, abraçando-os na tentativa infrutífera de não o deixar partir (Cântico dos Cânticos 3,1-4).

Hoje nós, discípulos e amigos de Jesus, ao contrário, capitulamos facilmente diante do “sepulcro”, afastando-nos. Falta-nos a fé para esperar que da situação de morte, de vazio e de derrota, possa renascer a vida. Já não temos “fé nos milagres”, não há mais espaço em nós para esperar num Deus capaz de ressuscitar os mortos. Apressamo-nos a fechar esses “sepulcros” com a “grande pedra” (Marcos 16,4) da nossa incredulidade. A nossa missão torna-se então uma luta desesperada contra a morte. Tarefa condenada ao insucesso, porque a morte reina desde o início do mundo. Acabamos por nos contentar com a obra de misericórdia de “sepultar os mortos”, esquecendo-nos de que fomos enviados para os ressuscitar (Mateus 10,8).

Enfrentar o sepulcro é a passagem do Rubicão do apóstolo, a sua travessia do Mar Vermelho (Êxodo 14-15). Sem remover a pedra da nossa incredulidade, para enfrentar e vencer esse terrível inimigo, não veremos a glória de Deus: “Não te disse que, se creres, verás a glória de Deus?” (João 11,40).

Nós não gostamos de chorar, sem dúvida porque amamos pouco. “Chorar é próprio do génio feminino”, dizia João Paulo II. Talvez as mulheres sejam mais capazes de amar. “Onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração” (Mateus 6,21). O coração de Maria Madalena está sempre naquele jardim, onde deu o adeus ao Mestre, e é por isso que ela está lá e chora. O nosso coração esquece-se demasiado depressa dos seus mortos; preocupado com as “muitas coisas a fazer”, não tem tempo para ficar e chorar com os que sofrem!

A ousadia de ficar e chorar não é estéril. Às lágrimas de Maria Madalena respondem os anjos, que não lhe devolvem o cadáver que ela pede, mas anunciam-lhe que “Aquele que o seu coração ama” está vivo! Mas os seus olhos precisam ver e as suas mãos de tocar o Amado, e Jesus cede finalmente à insistência do coração de Maria e vai ao seu encontro. Quando a chama pelo nome de “Mariam”, o seu coração estremece de emoção ao reconhecer a voz do Mestre.

Ser chamado pelo próprio nome: eis o desejo mais profundo (não confessado) que levamos dentro de nós. Só então a “pessoa” alcançará a plenitude do seu ser e a consciência da sua identidade; até aquele momento terá andado às apalpadelas! Só então poderá dizer, com o fogo de um coração apaixonado, “vi o Senhor” e, nesse dia, como Maria, também nós nos tornaremos testemunhas do Ressuscitado.

“Sim, estamos certos: Cristo ressuscitou de verdade!”
Votos de uma Santa e Alegre Páscoa!

P. Manuel João Pereira Correia, MCCJ

 

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