domingo, 22 de junho de 2025

O mistério da Presença do Senhor na Eucaristia - P. Manuel João Pereira Correia, mccj

 

O mistério da Presença do Senhor na Eucaristia

Ano C – Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo
Lucas 9,11-17: “Dai-lhes vós mesmos de comer”

Sessenta dias após a Páscoa, na quinta-feira depois da Santíssima Trindade, a Igreja celebra a Solenidade do “Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo” (Missal de Paulo VI), também chamada de festa de “Corpus Christi” (Missal de Pio V). Trata-se de uma das três quintas-feiras mais solenes do ano litúrgico: Quinta-feira Santa, Quinta da Ascensão e Quinta do Corpus Christi. Por razões pastorais, em muitos países a festa de Corpus Christi é transferida para o domingo seguinte à Santíssima Trindade. Embora já tenhamos encerrado o tempo pascal, essa referência cronológica estabelece um vínculo desta festa com a Páscoa, além da solenidade da Santíssima Trindade.

As origens desta festividade remontam ao século XIII. Surgida na Bélgica, foi estendida a toda a Igreja pelo Papa Urbano IV em 1264, impulsionado também pelos milagres eucarísticos de Bolsena e de Lanciano. Com estes sinais prodigiosos o Senhor quis consolidar a fé da Igreja na Sua presença real no sacramento da santa Eucaristia, em tempos nos quais alguns a colocavam em dúvida. Os milagres eucarísticos são numerosos (136 documentados), e vários deles bastante recentes. O beato Carlo Acutis, um adolescente falecido aos 15 anos (1991-2006), que será canonizado em breve, foi um entusiasta divulgador desses milagres. Era um grande amante da Eucaristia, que ele chamava de “a autoestrada para o céu”.

A riqueza do relato da multiplicação dos pães

O trecho evangélico de hoje é um dos mais conhecidos: trata-se do relato da multiplicação dos pães e dos peixes. Encontramo-lo nos quatro Evangelhos. Mateus e Marcos o relatam duas vezes, portanto aparece seis vezes. Isso nos faz compreender a importância que os evangelistas atribuem a este milagre.

Cada evangelista, tendo o milagre como pano de fundo, apresenta particularidades, enriquece-o com alusões bíblicas, sublinha ou acrescenta elementos, muitas vezes simbólicos (veja os números: 5 pães + 2 peixes = 7: a totalidade; 5.000 homens: o número dos crentes, cf. Atos 4,4; grupos de 50: ordem, possível referência a Êxodo 18,21-25; 12 cestos: o número das tribos de Israel, a totalidade). Isso explica as divergências nos detalhes e as aparentes incongruências. Para os evangelistas, não é tanto a fidelidade histórica que importa, mas sim a mensagem catequética para suas respectivas comunidades.

Assim, o milagre torna-se como uma “parábola”, uma referência não só à Eucaristia, mas a uma nova visão do mundo: onde o pão é partilhado em fraternidade, sentados e em grupos, ou seja, com ordem e dignidade; onde todos podem comer à saciedade e nada se perde. Este é um modo de apresentar o Reino de Deus (cf. Is 25,6-9).

A multiplicação dos pães nos convida a passar de uma economia do “comprar”, onde cada um deve se virar sozinho, para a do “dar”: “Dai-lhes vós mesmos de comer!”. Caso contrário, acabamos por devorar-nos mutuamente: “Quando comem o seu pão, devoram o meu povo” (Salmo 14,4).

Celebrar a Eucaristia sem aderir a este projeto divino, considerando-o talvez uma utopia, é infidelidade ao mandamento do Senhor: “Fazei isto em memória de mim”. A separação entre Eucaristia e a partilha do alimento faz pairar sobre nossas missas a severa advertência de São Paulo: “o que vocês fazem não é mais a Ceia do Senhor” (1Cor 11,20).

Ao sair da Eucaristia, o cristão deveria retomar o grito de João Paulo II na sua visita ao Peru, quando diante de um milhão de pobres, reunidos na periferia de Lima, em 5 de fevereiro de 1985, após comentar o Evangelho da multiplicação dos pães, exclamou com veemência ao concluir o encontro: “Fome de Deus: Sim! – Fome de pão: Não!”

Da manjedoura de Belém à mesa da Eucaristia

A Eucaristia, contudo, é sobretudo o mistério de uma singular Presença de Jesus na sua Igreja e no mundo, que traduz a sua vontade de permanecer para sempre conosco. Toda a vida de Jesus revela esse seu desejo de permanecer para sempre entre nós.

Todos os Evangelhos o sublinham. Mateus começa anunciando a vinda de Jesus como o Emanuel (“Deus conosco”) e conclui com a afirmação de Jesus ressuscitado: “Eu estarei sempre convosco”. Marcos o introduz com o batismo no Jordão, solidário com seus irmãos, até a cruz partilhada com os malfeitores. Lucas narra o seu nascimento em Belém (“casa do pão”) e diz que Maria “o colocou numa manjedoura” (Lucas 2,7) e, ressuscitado, faz-se reconhecer no partir do pão (24,35). João diz: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (1,14).

Esta vontade do Senhor o leva a tornar-se um peregrino que bate à porta do coração de cada um de nós: “Eis que estou à porta e bato. Se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa, cearei com ele, e ele comigo” (Apocalipse 3,20). Esta é a mensagem profunda da Eucaristia!

Proposta de oração

Louva e agradece ao Senhor pelo dom da Eucaristia com este hino conclusivo da Páscoa judaica:

Mesmo que nossa boca estivesse cheia de hinos como o mar está cheio de água, nossa língua de cânticos como numerosas são as ondas, nossos lábios de louvores como amplo é o firmamento, nossos olhos luminosos como o sol e a lua, nossos braços estendidos como as asas das águias do céu, e nossos pés velozes como os dos cervos, não poderíamos agradecer-Te, ó Senhor nosso Deus, e bendizer Teu Nome, ó nosso Rei, por um só dos mil milhares e miríades de benefícios, prodígios e maravilhas que realizaste por nós e por nossos pais ao longo da história…
Por isso, os membros que distribuíste em nós, o sopro e a respiração que insuflaste em nós, a língua que colocaste em nossa boca Te agradeçam, bendigam, louvem, exaltem, cantem Teu nome, ó nosso Rei, para sempre...”

P. Manuel João Pereira Correia, mccj


P. Manuel João Pereira Correia mccj
p.mjoao@gmail.com
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