sábado, 15 de novembro de 2025

Fim ou começo? - P. Manuel João Pereira Correia, mccj

 Fim ou começo?

Ano C – 33º Domingo do Tempo Comum
Lucas 21,5-19: “Com a vossa perseverança salvareis a vossa vida”

Estamos no penúltimo domingo do Tempo Comum e o ano litúrgico aproxima-se do fim. A liturgia aproveita para falar-nos das “realidades últimas” (éschata, em grego). O fim dos tempos, o fim deste mundo, o fim das coisas, o fim da nossa vida... A Palavra quer evangelizar os nossos medos e libertar-nos tanto da angústia quanto de uma despreocupação tola. Convida-nos ao discernimento, a refletir sobre o fim e o sentido da existência, a cultivar a esperança e uma visão positiva da vida.

Jesus está no final dos seus dias. Pouco antes tinha chorado ao ver Jerusalém e previsto o seu fim: “Não ficará em ti pedra sobre pedra, porque não reconheceste o tempo em que foste visitada!”. Jesus ama a sua cidade, como ama a nossa “cidade”, hoje. Mas – ai de nós – quantas vezes Ele também nos diz, com tristeza: “Se ao menos tu compreendesses hoje o que conduz à paz!” (Lc 19,42).

O fim do templo

Encontramo-nos no templo de Jerusalém, reconstruído por Herodes, o Grande, uma maravilha arquitetónica, orgulho de Israel. A esplanada tinha cerca de 500 metros de comprimento e 300 de largura, com uma superfície equivalente a 22 campos de futebol. Os trabalhos começaram por volta de 19/20 a.C., e todo o complexo arquitetónico só foi concluído por volta de 63/64 d.C., poucos anos antes da destruição romana no ano 70. O historiador judeu-romano Flávio Josefo (37/38–100 d.C.) relata que ali trabalharam 10.000 operários e que 1.000 sacerdotes foram especialmente formados como pedreiros e carpinteiros para trabalhar nas partes sagradas, onde apenas sacerdotes podiam entrar. O templo era considerado a oitava maravilha do mundo. A construção magnífica impressionava tanto aqueles que chegavam a Jerusalém que se dizia: “Quem não viu Jerusalém, a resplandecente, não viu a beleza”.

Podemos imaginar a surpresa e o espanto quando Jesus profetiza a destruição do templo. Era realmente o “fim do mundo” para os ouvidos e o coração dos seus ouvintes.

A destruição do templo faz-nos pensar. É verdadeiramente o símbolo das nossas próprias obras humanas. Tantos anos de sonhos e projetos, de trabalho e investimentos, de empenho e sacrifícios... destruídos de repente e irremediavelmente! A magnífica construção do templo, concluída depois de cerca de oitenta anos, seria logo em seguida arrasada! E isso aconteceu porque o povo de Deus tinha colocado naquele templo a sua segurança.

Em vão o profeta Jeremias havia alertado séculos antes, antes do exílio e da destruição do templo de Salomão: “Não confieis em palavras enganosas repetindo: ‘Este é o templo do Senhor, o templo do Senhor, o templo do Senhor!’ [Se não praticardes a justiça...] Eu tratarei este templo sobre o qual é invocado o meu nome e no qual confiais... como tratei Silo”, o templo do Reino do Norte, destruído pela invasão assíria em 721 a.C. (cf. Jr 7,1-15). O templo tinha-se tornado um ídolo, uma falsa segurança!

Também a Igreja muitas vezes colocou a sua segurança nos seus “templos”: nas suas instituições, no poder e influência social, nas tradições e dogmas... em vez de na fé em Jesus Cristo. Também por isso hoje nos sentimos um pouco perdidos com o fim da “cristandade” e os desafios inéditos do futuro.

E eu, onde ponho a minha confiança? Qual é o “templo” no qual confio? Sinto-me seguro porque vou à igreja, ou porque sou religioso, ou me declaro cristão?

O fim do mundo

No contexto do fim de Jerusalém e do templo, surge também o tema do “fim do mundo”. Jesus fala dele numa linguagem apocalíptica, um género literário que utiliza imagens simbólicas muito fortes. Basta ver, a esse propósito, o livro do Apocalipse. Porém, o objetivo é incutir esperança nos crentes. De facto, o seu significado em grego é revelação, ou seja, “tirar o véu” da história para entendermos o seu sentido.

“Quando é que tudo isto acontecerá?”, perguntam os apóstolos. Jesus não responde diretamente. Aliás, noutra passagem dirá que não sabe. Hoje poderíamos perguntar ao Google e encontraríamos até datas precisas. Mas isso pouco nos interessa. Preocupam-nos antes a ameaça atómica, cada vez mais discutida, e a crise climática. Na verdade, somos nós que determinamos o fim deste mundo e preparamos o novo mundo que desejamos.

Santo Inácio, num dos momentos mais fortes dos Exercícios Espirituais, convida a meditar sobre “As Duas Bandeiras”. Trata-se de uma meditação de discernimento para compreender que “senhor” queremos servir. Inácio apresenta uma cena simbólica: dois “chefes” que reúnem os seus exércitos. Lúcifer convoca os seus na grande planície da Babilónia. Cristo, por sua vez, reúne os seus na planície de Jerusalém. As estratégias são completamente opostas.

Mesmo sem disso nos darmos conta, muitas vezes seguimos um desses “senhores”: ou pertencemos à equipa que tenta retomar a construção da torre de Babel, que ficou inacabada (Gn 11), para alcançar o “céu”; ou pertencemos à equipa que se empenha em preparar a nova Jerusalém. Esta obra acontece agora, aqui, nas nossas escolhas grandes e pequenas, e continua na eternidade.

Diz o conhecido filósofo católico Jacques Maritain, no seu livro As coisas do Céu, que os danados são “ativos” que trabalham todo o tempo: “Farão cidades no inferno, torres, pontes, travarão batalhas. Empreenderão governar o abismo, ordenar o caos”. Mas tudo está destinado a ruir!

No céu, ao contrário, trabalha-se para preparar a Jerusalém celeste, que São João, o vidente do mundo futuro, contempla enquanto desce do céu: “Vi também a cidade santa, a nova Jerusalém, a descer do céu, de junto de Deus, preparada como uma esposa adornada para o seu esposo” (Ap 21).

Então, por qual equipa torcemos? Ou melhor, em qual equipa jogamos? Tentamos reconstruir o velho mundo, apesar de todas as tentativas falhadas? Ou queremos fazer da nossa vida um tijolo da cidade futura?

O fim da nossa vida

Para cada um de nós, o mundo acaba no dia da nossa morte. Trata-se do dia da grande viagem, se – simbolicamente – nos é permitido dizê-lo. De repente, atravessamos bilhões de anos e encontramos-nos noutra dimensão, a dos ressuscitados. É inútil tentar imaginá-la!

Sábio é aquele ou aquela que dá sentido à sua vida em vista desse fim.

Uma das imagens mais belas e eloquentes que Jesus usa para falar do mundo novo é a das dores de parto: “A mulher, quando está para dar à luz, sente tristeza porque chegou a sua hora; mas, depois de ter dado à luz, já não se lembra da dor, por causa da alegria de ter vindo ao mundo um homem” (Jo 16,21). Estas dores de parto são as da perseguição, do testemunho e da perseverança, diz o evangelho de hoje.

Existe também um sofrimento que não gera vida: “Como a mulher grávida prestes a dar à luz se contorce e grita nas dores, assim fomos nós diante de ti, Senhor. Concebemos, tivemos dores, mas era só vento; não trouxemos salvação à terra e não nasceram habitantes no mundo” (Is 26,17-18).

As nossas dores de parto, são um sofrimento fecundo, ou uma dor estéril, inútil, desperdiçada? Tudo depende daquilo com que alimentamos o seio do nosso coração: se da “palavra e sabedoria” que Jesus promete dar-nos no Evangelho de hoje; ou, ao contrário, de inutilidades e vanglórias! Diz o Eclesiastes: “Vaidade das vaidades, tudo é vaidade!” (Ecl 1,2). Então, estamos grávidos de vida ou de vanglórias?

P. Manuel João Pereira Correia, mccj


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