quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

Monos e humanos origem e originalidades Anselmo Borges Padre e Professor de Filosofia

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PÁRA E PENSA
Monos e humanos

origem e originalidades

Anselmo Borges

Padre e Professor de Filosofia

O que é o Homem?

Ao longo dos séculos, foram-se sucedendo, numa
lista quase interminável, as tentativas de resposta:
animal que fala, animal político (Aristóteles); animal
racional (os estóicos e a Escolástica); realidade
sagrada (Séneca); um ser que pensa (Descartes); uma
cana pensante (Pascal); um ser que trabalha (Marx);
um animal capaz de prometer (Nietzsche); um ser que
cria (Bergson); um animal que ri, um animal que
chora, um animal que sepulta os mortos... Saído da
gigantesca aventura cósmica com uns 13.700 milhões
de anos, o Homem tem, segundo Edgar Morin, “a
singularidade de ser cerebralmente sapiens-demens
(sapiente-demente), ter, portanto, com ele “ao mesmo
tempo a racionalidade, o delírio, a hybris (a
desmesura), a destrutividade”.
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O filósofo André Comte-Sponville apresentou a
sua “definição”, que julga suficiente: “É um ser
humano qualquer ser nascido de dois seres
humanos.” Sim, é verdade. Mas será mesmo
suficiente? O que dizer em relação aos primeiros
homens, que, na história da evolução, não nasceram
de outros humanos? De qualquer modo a pergunta
continua aí, gigantesca, a pergunta das perguntas...

Os grandes espíritos -- Diderot, por exemplo
deram-se conta de que o que somos não pode ser
encerrado numa definição. O Homem é o ser que leva
consigo a questão do ser e do seu ser e que originária
e constitutivamente pergunta: o que é o Homem? O
que, antes de mais, une a Humanidade inteira é
precisamente esta pergunta: o que é ser Homem?

Se o chimpanzé, por exemplo, também sente,
recorda, procura, espera, joga, comunica, aprende e
inventa, o que é que nos distingue?

Afinal, muito de idêntico em nós e no
chimpanzé, “no mono e no Papa”, disse ironicamente
o filósofo confessadamente ateu Michel Onfray. O
professor de filosofia e o chimpanzé têm necessidades
naturais comuns: comer, beber, dormir. A etologia
mostra que há comportamentos naturais comuns aos
animais e aos humanos. Veja-se, por exemplo, as
relações de violência e de agressão e compare-se
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inclusivamente os rituais de cortejamento sexual. Mas
é interessante constatar que na resposta às
necessidades naturais há uma diferença: os homens
inventaram a cozinha e a gastronomia e também o
erotismo.

No entanto, escreve M. Onfray, “o Homem e o
animal separam-se radicalmente quando se trata de
necessidades espirituais, as únicas que são próprias
dos homens e das quais não se encontra nenhum
vestígio mínimo que seja nos animais.” Há nos
humanos uma série de actividades especificamente
intelectuais, que os distinguem radicalmente dos
monos: nestes, não encontramos filosofia nem religião
nem técnica nem arte.

A tentativa de compreendê-lo no quadro de um
materialismo mecanicista ou do biologismo não dá
conta do Homem. De facto, o animal é conduzido
pelo instinto. Por isso, esfomeado, não se conterá
perante a comida apropriada que lhe apareça. Face à
fêmea no período do cio, não resistirá. O Homem,
pelo contrário, é capaz de transcender a dinâmica
biológica. Por motivos de ascese ou religiosos ou até
pura e simplesmente para mostrar a si próprio que se
não deixa arrastar pelo impulso, é capaz de conter-se,
resistir, dizer não. Foi neste sentido que Max Scheler,
um dos fundadores da Antropologia Filosófica
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escreveu que o Homem é “o asceta da vida”, o único
animal capaz de dizer não aos impulsos instintivos.

Cá está: esta é a base biológica da conduta moral,
uma característica essencialmente específica humana.
Uma vez que o Homem é capaz de ponderar,
renunciar, abster-se, optar, dizer sim, dizer não aos
impulsos, é livre e, por conseguinte, animal moral.

O Homem é corpo, mas um corpo que fala e que
diz “eu”. Porque fala, é capaz de debater questões, de
defender pontos de vista, distinguir o bem e o mal,
tomar posições sobre valores morais, políticos,
religiosos, estéticos, filosóficos...

Então, o enigma é este: provimos da natureza, mas
contrapomo-nos a ela, somos simultaneamente da
natureza, na natureza e fora dela. Monos e humanos
têm a mesma origem, mas os humanos têm
originalidades únicas e irredutíveis.

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